domingo, 3 de setembro de 2023

Despertar doloroso

O desinteresse do protocolo presidencial, com convites em cima da hora (marcado para as 15h, ao meio-dia muitos ainda não tinham recebido o telefonema) permite suspeitar que a estranha e inesperada iniciativa de Macron, ao convidar os líderes da oposição para um jantar franco e recatado, logo após a conferência de embaixadores, era obviamente para tentar um consenso "nacional" sobre o Níger, caso a situação rebentasse. Aparentemente, a opinião pública francesa dá mostras de se manter relativamente alheia à situação, inconsciente dos perigos que espreitam. A imensa maioria daquilo que foi publicado pela imprensa, sobre a referida "sessão de trabalho", focou aquilo que se passou depois do jantar, debruçando-se sobre os últimos dois pontos, concernentes à situação interna, os quais não passavam obviamente de areia atirada para os olhos, transformando-se em pura manobra de diversão política. "A montanha pariu um rato", como se escreveu num artigo em inglês, traduz bem a impressão que sobrou de tal encontro.


O mais interessante, acaba por ser o episódio que transpirou: a irritada e gratuita reacção de Macron face à proposta de redução dos actuais dois mandatos de sete anos presidenciais para um único. Terá exclamado que a limitação a dois mandatos foi uma "funeste connerie" - aprovada por Sarkozy em 2008, a qual o impede de se poder candidatar às próximas presidenciais - acrescentando que, "quem não se pode recandidatar perde o poder desde o primeiro dia". O que terá levado Jean-Luc Mélechon a concluir que "Macron a craqué", que o seu "reinado" acabou, e que já estamos na era pós-Macron, sugerindo mesmo um referendo para antecipar o termo do seu mandato. Só depois da enorme manifestação popular de ontem, com dezenas de milhar de pessoas e reconhecidamente a maior desde o golpe, à porta da base aérea onde estão cercados os militares franceses, o líder da France Insoumise parece ter acordado para o beco sem saída no qual Macron colocou o seu país. A partir de agora, tudo pode dar para o torto...

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