sexta-feira, 24 de novembro de 2023

Formulação desadequada

Por despacho, o PGR assume a iniciativa da acção penal relativamente ao documento BAO vazado.

Não fundamenta, como expectável, sua decisão, incorre em imprecisão quando diz que "desembolsou", no passado, seis bilhões (também aqui, Senhor Procurador, foi falta de atenção em relação ao original, onde está correcto, seis mil milhões, em português não existe bilhão), quando, de facto (senhor Procurador, facto é diferente de 👔 escreve-se com C, segundo as regras do AO90), o Ministro se propõe desembolsar, no futuro, ao longo de cinco anos, a partir de Janeiro do ano que vem. É que essa forma errónea de apresentação tem obviamente custos para a credibilidade do processo que pretende encetar, abrindo caminho a esclarecimentos contrários passíveis de prejudicar o seu bom andamento. 

Há muitas questões para esclarecer, decerto uma leitura atenta do documento pode ajudar: começa por se referir ao reconhecimento de dívidas. Mas a que propósito, os elementos listados em anexo, para além das "instituições do Estado" com quinhentos milhões, são considerados credores do Estado? Na altura do primeiro episódio desta novela, dizia-se que os bancos tinham garantias, hipotecas, que 90% seriam pagos pelos próprios devedores. Quando surge na lista, por exemplo, Hotel Império e sabemos que continua a operar, torna-se complicado exigir ao contribuinte que pague essa "dívida" sem diligências eficazes de cobrança. Seria interessante confrontar a percentagem prevista de recuperação de crédito? Zero %?

Ficar mal no retrato

O Acordo Ortográfico tem "paradoxos": uma importante fonte é comerem os cês a granel; quando um pacto de facto vira um pato de fato, temos um problema; até o inocente espectador de uma tourada pode virar espetador. 

Ora uma coisa é irretractável "que não pode ser revogado ou anulado", outra é irretratável "que não pode ser retratado ou voltar a ser tratado". A palavra mais importante, em termos de confiança bancária, no documento (em abono da verdade, este deveria esclarecer, logo de início, ser feito "a pedido do interessado") que supostamente obriga o Ministério das Finanças, a favor de um banco cujo presidente está preso em Portugal (há 7 anos este blog dedicou-lhe alguns mimos), tem gralha e trunca todo o efeito pretendido, ou seja, salvar o BAO da falência. Ó Diogo, tens de carregar no C quando diktares irretraccckkktável. Ou prefere irrevogável. Mas olha que quando não basta a garantia do Estado e é preciso acrescentar-lhe esse género de adjectivos, é óbvio que é para desconfiar, como todo guineense sabe, na sua gireza.

PS Acrescente-se que o acto de "acrescer acessórios" traduz igualmente uma radical e curiosa desadaptação terminológica, para o ramo financeiro e bancário. 

sexta-feira, 17 de novembro de 2023

Somos todos filhos de Deus

Moisés, depois de alguns encontros com Alá no Monte Sinai, disse ao Criador: 

_“Senhor, oiço Tua voz, mas não Te vejo, e arde em mim a curiosidade de conhecer Teu rosto, Tua forma, Teu aspeto, de conhecer, enfim, qualquer coisa de Ti. Deixa que Teu servo Te veja, Senhor!”

Deus respondeu-lhe que aquele pedido era impossível de satisfazer. Moisés insistia, queria saber se era branco ou preto, homem ou mulher. A resposta veio breve: não era homem nem mulher nem branco nem preto e não tinha filhos. Moisés estava confuso, mesmo decepcionado. Então Alá deu a Moisés três ovos e mandou a Moisés que regressasse para junto do seu povo e que mais tarde lhe daria a explicação daquilo que tanto o surpreendera. Moisés regressou à sua gente, um dos filhos quis brincar com um dos ovos, este partiu-se, tanto chorou que acabou por receber o segundo, e depois o terceiro, ambos se partiram. Quando Moisés voltou ao Monte Sinai, questionado sobre o destino que dera aos ovos, lamentou-se, todos tinham sido partidos pelo mais novo dos seus filhos. 

_“Ora aí tens, Moisés, admiraste-te por não ter filhos e agora já te posso explicar a razão de os não ter. Se tu consentiste aos teus filhos que partissem os ovos que te dei, bem poderia acontecer que deixasse aos meus, se os tivesse, que partissem a abóboda do Céu. Não, Moisés, não tenho filhos à maneira dos homens, mas são meus filhos todos os seres que criei”.

Lindíssimo conto mandinga intitulado “Por que razão Deus não tem filhos?”, extraído do blog do Luís Graça, o qual me parece deixar Jesus numa posição teológica delicada. Note-se que a ambiguidade se mantem, apesar do aparente dilema.

quinta-feira, 26 de outubro de 2023

Honte et infamie au Tchad

Basta ver as caras dos Generais da Junta na tomada de posse do novo Ministro da Defesa, para se perceber que a coisa não vai ficar por aqui. Num país altamente militarizado como o Chade, o ministério dos militares ocupado por um civil? O qual "por acaso" estava em Paris. Mais difícil de atribuir ao acaso é o facto de ser tio da envolvida no vídeo vazado nas redes sociais que conduziu à demissão do seu antecessor, filmado pela própria filha. As insinuações de rapto das raparigas, que surgiram nas horas seguintes à divulgação, eram obviamente falsas. Os chadianos já perceberam que a nomeação é o prémio da infâmia. As redes sociais, com destaque para o tiktok, enchem-se de declarações repudiando a farsa, entre as quais a de um deputado. Os chadianos estão de alma e coração com os seus irmãos nigerinos, malianos e burkinabés, no sentimento anti-francês. Decerto não agrada aos generais ter de disparar contra o seu povo, pelos bonitos olhos de Macron. O próprio conselho de ministros que Déby promoveu esta manhã na presidência não parece ter corrido muito bem, dando origem a mais uma demissão no Governo...

sexta-feira, 20 de outubro de 2023

French Army is outsourcing risks

Enquanto o discurso do General Ozanne se foca na data limite de 31 de Dezembro, o seu homólogo nigerino na Comissão Conjunta de Estados-Maior, frisa que só hoje, saíram 282 dos 1400 soldados franceses em retirada, do Níger para o Chade, e que brevemente metade do objectivo estará cumprido. Apesar de tudo ter corrido bem com a primeira coluna, havendo muito volume para fazer circular pelo mesmo caminho, o exército francês, "subcontratou" empresa civil de transporte, tratando o material como mobiliário numa simples mudança de casa. Chega-se ao cúmulo de invocar "transparência" para a passagem dos 2500 contentores. Estão muito preocupados com as aparências.

Patriotismo


A demissão do General Daoud Yaya Brahim é simples pro-forma, com pouco significado informal, para além do regime ter ficado coxo. As responsabilidades assumidas perante a Nação, bem patentes na forma determinada como falava (por exemplo negando o envolvimento do Chade na operação militar da CEDEAO contra o Níger), não se extinguem. 

Apenas retira o tapete usurpatório que a Junta tinha estendido ao filho do papá, cujas circunstâncias mortais estão longe de clarificadas. É óbvio que a demissão, mesmo tendo sido aceite pelo Primeiro-Ministro fantoche, de nada vale, pois para tal carecia ser submetida à Junta Militar, à qual pertencem os supostamente publicamente humilhados. 

O povo já decifrou o oportunismo subjacente à divulgação das encenações, estendendo-o à própria produção, entendendo tratar-se de armadilha para chantagem política. Em suma, a máquina está à espera de ordens de Vossa Excelência: não será um pseudo-escândalo, inventado de todas as peças, que vai travar o curso da História.

quarta-feira, 18 de outubro de 2023

Golpe e contra-golpe

O Ministro da Defesa do Chade, pertencente à Junta Militar que "legitimou" Déby filho, consciente do peso da opinião pública e da pressão para a desfrançafricanização, manifestou-se contra a entrada da coluna francesa que está a caminho, declarando que não tinham sido convidados. Ao mesmo tempo procedia ao lançamento do há muito esperado plano de reconciliação nacional, que visa o retorno ao país dos rebeldes acantonados no estrangeiro, anunciando dispor de cinco milhões de dólares da ONU e precisar de mais 27 milhões para o completar, estimando tratar-se de "processo caro e moroso que o Níger não pode suportar sozinho" (tentativa de extorsão a Macron?). Declarações que constituiriam mais uma terrível humilhação, mas que a máquina do Eliseu, tirando proveito do foco mediático em Gaza, conseguiu incrivelmente abafar, nomeadamente instruindo o Le Monde para dar esta notícia enrolando sem nexo factos antigos com recentes.


A reacção não se fez esperar. Macron chamou o seu homólogo de urgência. Sem qualquer aviso ou notícia, o obediente Déby despachou-se e a esta hora já está em Paris para negociações. Contudo, como ponto prévio, Macron exigiu a cabeça do atrevido Ministro da Defesa. Este acaba de apresentar a demissão, tal como outro colega, hoje na sequência da publicação de vídeos, armadilhados com jovens raparigas, que entretanto os serviços fizeram convenientemente desaparecer. Ou seja, o senhor presidente terá assumido ter-se tratado de um pronunciamento se não mesmo tentativa de golpe e decidiu queimar o alicerce securitário do seu regime. Ao general Daoud Yaya Brahim e futuro presidente do Chade, manifesta-se solidariedade, face a esta insidiosa tentativa de contra-golpe. Estando prevista a estadia em Paris para vários dias, isso dá tempo suficiente para a organização do contra-contra-golpe, a executar à chegada ao aeroporto do avião presidencial.

quarta-feira, 11 de outubro de 2023

Calvário

A retirada francesa a caminho do Chade prolonga-se pelo caminho mais longo, decerto passando por Maradi e Zinder, num percurso rodoviário encostado à fronteira da Nigéria, o qual expõe a coluna a manifestações espontâneas de hostilidade, por parte da população. 


Outra questão importante é saber se alguma parte do material voador não deveria ser legitimamente apreendida, dada a decisão de retenção por Paris de dois helicópteros Gazelle de ataque ao solo, pertença do exército do Níger, em França para reparação. 

Nove fósforos

sábado, 7 de outubro de 2023

Escoltados até à saída


Estados-Maior reunidos em Zinder para organizar a retirada das tropas francesas do Níger, que a Junta fez questão de filmar, para depois não se esquecerem. As caras e as mãos dizem tudo... 

PS 7ze reconhece que errou no post citado, ao referir-se ao General Bruno Baratz. O actual comandante das forças francesas no Sahel é, desde início de Julho, o General Eric Ozanne, que já deve estar mais que arrependido de ter pedido o cargo: mal teve tempo de engraxar as botas, chega ao "teatro operacional" cai-lhe o Carmo e a Trindade em cima. A porta da rua é a serventia da casa. À Saint Cyr on n'enseigne pas Pétain? Putain!

sexta-feira, 6 de outubro de 2023

Declaração extemporânea

Os Estados Unidos fazem aparente marcha-atrás e classificam oficialmente a situação no Níger como "Golpe de Estado". A administração parece querer alimentar a ambiguidade, abrindo espaço para uma eventual intervenção franco-CEDEAO, mas colocando a sua base de Agadez em maus lençóis perante os nigerinos, os quais até aqui tinham poupado os americanos às manifestações de hostilidade. 

quinta-feira, 5 de outubro de 2023

Canto do cisne na ordem da semana

Aquando do reconhecimento implícito das novas autoridades do Níger pelo Quay d'Orsay, durante a evacuação civil no imediato pós-golpe, o Estado-Maior apressou-se a declarar que a evacuação militar "não estava na ordem do dia". Associava-se assim à imbecil "emprise" política que a arrogância de Macron se dispunha a encetar. Na mais absoluta e absurda negação, relativo à perversa herança de uma FrançAfrique sem caminho, arrastou o exército francês para um injustificado stress e para a lama de uma desonrosa retirada. Usando a metáfora de Tinubu para a CEDEAO, o terrível bulldog lá ladrou, ladrou, sem reparar que todos viram como estava desdentado. Agora trata-se de engolir o sapo, dando o dito por não dito. O papel do Estado Maior não é envolver-se em política, ao custo da sua própria credibilidade: assim, terão de partilhar com o Eliseu os custos da vergonha. A retirada das forças militares não estava na ordem do dia, mas agora já está na ordem da semana. É um princípio. Também o reconhecimento das autoridades não é já simplesmente implícito, mas sim perfeitamente explícito, quando se referem à necessária "coordenação com os nigerinos". Só que estes não obedecem ao Palácio.


PS Obviamente que a Junta está pouco inclinada a "deixar manobrar livremente" as tropas, como se queixa o Estado-Maior, sem garantias de evacuação como um todo, no âmbito de um quadro concertado e não como decisão unilateral. Face às declarações insistentes de manutenção da ameaça militar de alguns países da CEDEAO, não é crível que a Junta tolere um reagrupamento em Niamey, sem a partida prévia daqueles militares que já lá estão, para lhes dar lugar. D'abord, Niamey, d'accord? 

segunda-feira, 2 de outubro de 2023

Pão de 200F ou 150F de pão?

Questão estéril, uma vez que o padrão de pão kuduro não está oficialmente definido.

quinta-feira, 28 de setembro de 2023

Recandidatura

Oportuna e inteligentemente, o presidente residente anuncia data de eleições e recandidatura, associando o acto a uma tomada de posição de bom senso


Perante o mais que previsível falhanço em tabelar o preço do pão, o governo não reconhece que errou, insistindo em manter medidas intervencionistas no mercado, atentatórias da liberdade de comércio e por isso retrógradas e obsoletas, do tempo do partido único e do comunismo como inspiração política. Alguém tinha de colocar o dedo na ferida e acabar com a brincadeira de mau gosto, que entretanto já fizeram perigosa e irresponsavelmente escalar para um discurso de ódio xenófobo contra os comerciantes. 

A leitura que estão a querer impor, de que os pontos nos iii do presidente é uma medida impopular, tem as pernas curtas. A escassez arrisca-se a ficar indelevelmente associada ao PAI. Toda a gente sabe onde conduz a política de intervenção estatal nas regras do mercado: à total ineficiência. O próprio PAIGC é, aliás, um caso de estudo nessa matéria, tendo conduzido o país à mais absoluta escassez e mesmo à hiperinflação. Repondo a liberdade de mercado, o presidente cumpriu apenas o seu papel de fiel da balança.

O Primeiro-Ministro fez definitivamente uma péssima escolha para foco do conflito institucional com a Presidência. Quanto mais depressa recuar, melhor.

segunda-feira, 25 de setembro de 2023

Reacções às declarações de Macron

As declarações televisivas de Macron provocaram a euforia no Níger, sendo vividas como uma vitória nacional, mas sem ilusões: "vamos continuar a manifestar até à saída do último soldado francês". 


Já em Paris, foram vividas como nova humilhação, imputável à irresponsabilidade e paternalismo retrógrado do presidente; uma terrível confissão de impotência, depois de toda a fanfarronice; ou mesmo derrota e humilhação em toda a linha, após semanas de arrogante obstinação, que só serviram para amplificar o efeito da retirada.

domingo, 24 de setembro de 2023

Macron engole o sapo?

Em entrevista televisiva, o presidente francês assume a evacuação em horas do ex-embaixador indesejado no Niger, mas ainda ousa tentar retardar a saída dos stressados soldados para semanas e meses? Pelo contrário, senhor presidente. No lamentável estado a que chegou, não tem liberdade para quebrar as regras. Tem de enfiar o 🐸 pela goela abaixo: mas não é pelas coxas, é pela cabeça. O ilegal é que fica para último. Vossa insignificância não tem qualquer noção das prioridades!

Nomeação oficiosa

É com muita honra que 7ze, informalmente designado consultor da Junta Militar, aceita a medalha de Niamey. 

Não há pão para malucos


A escassez "instantânea" voltou a atacar, tal como já tinha acontecido com o arroz. O mercado não se rege por decreto. Cinquenta anos depois, queriam cinquenta francos de troco? A duzentos há muito pão. Mas hoje não.

sábado, 23 de setembro de 2023

Pérfido Guterres

Recusar passivamente o pedido para substituir o anterior representante enquanto a situação interna de um país alvo de golpe de estado ainda não foi clarificada, é uma inércia admissível por defeito, a qual pode naturalmente fazer-se prolongar por algum tempo, ao sabor das influências. 


Contudo, o infiel secretário-geral das Nações Unidas, tudo fez para activamente despachar o pedido intempestivo do presidente deposto para demissão do representante permanente do Níger (que o próprio havia nomeado), impedindo assim o país de participar na Assembleia Geral. 

Ora, segundo o protocolo para o efeito, a figura de pedido de demissão nem sequer existe, apenas a de substituição por novo representante. Parece portanto forçoso concluir que se trata de uma infame inovação à revelia dos procedimentos normais e em claro excesso de zelo

Portanto, o tosco alienado aos interesses franceses e à opção bélica não se coíbe de desrespeitar as regras da organização, abusando dos poderes que o cargo lhe atribui. Onde já se viu um presidente que já não o é há dois meses nomear novo representante... "permanente"?

quinta-feira, 21 de setembro de 2023

Macky rende-se

O presidente senegalês, desculpa-se perante Paris quanto à "traição", imputando-a a Tinubu e suas diligências "subterrâneas" junto da Junta Militar (cujo representante também está em Nova Iorque, recebido na ONU - mais um sinal de reconhecimento internacional). Rendendo-se às evidências, defende que sem a Nigéria, nada feito. 


Na base que deveria acolher o grosso da força invasora, os sinais são igualmente de desmobilização. Até Talon já percebeu que assim fica isolado e não seria de estranhar que apareça em Niamey para desfazer qualquer dúvida remanescente. Macron já só pode contar com Ouattara para manter as aparências; a CEDEAO morreu.

E agora, senhor presidente Macron? 

Incompetência

Seydou Diagne não deveria ser citado, pois não é digno sequer de nota: a sua absoluta incompetência profissional leva-o a aceitar um processo político sem pés nem cabeça. Se fosse um bom profissional, declinava e avisava o seu cliente quanto aos custos políticos mais que garantidos, claramente muito superiores aos parcos proveitos que poderia auferir com uma mais que improvável vitória. O culpado não é o coitado do advogado enganado para alinhavar estas incongruências, é obviamente o pretenso estadista ex-presidente Bazoum, acometido de absoluto delírio, tal como seu parceiro Macron, na farsa de mau gosto encenada em Niamey. 

Se o deposto percebesse alguma coisa de Excel, seria possível explicar-lhe por que razão este assinala alerta de erro às referências circulares. Se percebesse de política, perceberia que se está formalmente a contradizer. Se percebesse de diplomacia, perceberia que está a reconhecer as autoridades de facto. Se percebesse de senso comum, talvez lá fosse com a metáfora da pescadinha de rabo na boca. Nem sequer é preciso saber muito de Direito para perceber que, estando o Níger suspenso, será complicado vincular o país, sendo areia a mais para a rudimentar jurisprudência e legislação comunitária, pela imensidão de questões que levanta. 

Não é preciso ir muito longe para compreender que qualquer bom juiz burocrata do dito tribunal declinará rapidamente a batata quente, declarando-se incompetente, nem que seja a pretexto territorial, isto se o processo não for travado antes por inadmissibilidade patente. Enquanto se mantém uma ameaça de utilização de força militar, tal sobrepõe-se obviamente a qualquer outra diligência paralela. Atendendo a que essa meia franco-"CEDEAO" (da Costa do Marfim, Senegal e Bénim), só lhe reconhece autoridade a ele mesmo (contra a outra meia, do Burkina Faso, Mali e Níger), alguém explique ao imbecil que não se pode processar a si próprio. 

Por mais diligentes e voluntariosas que sejam as instâncias da obsoleta "comunidade", primeiro fracturada e depois estilhaçada, a iniciativa está obviamente condenada a ser ultrapassada pelos acontecimentos e remetida ao esquecimento, de onde nunca deveria ter saído. Condenar o Estado do Níger por violação dos Direitos Humanos, uma retenção domiciliária podendo conservar os meios de comunicação e receber visitas? Mais um motivo de chacota. Se o ridículo matasse, este caso já estaria resolvido. "En cas de décision favorable, l’État du Niger aura l’obligation juridique d’exécuter la décision". Mais l'État c'est pas vous, monsieur le "président"?

La grogne gagne les troupes

Ouest France, conotado com o centro-direita, é o diário mais vendido em França desde 1975. Contribuiu bastante para promover Macron, quando o infiltrado ainda se dava ao trabalho de fingir que era de esquerda (apesar de já afectar traição) ajudando-o a captar o voto de direita. É este jornal, a quem este tudo deve, que se decidiu a violar o "acordo de cavalheiros" (ou a lei da rolha do presidente com conversa fiada de "interesse nacional" e de confidencialidade militar, para abafar aquilo que se passa no Níger) levantando o véu sobre o contingente sitiado, traduzindo um nível de stress muito diferente daquele que pretende fazer constar o macarrónico discurso oficial. 

As autoridades nacionais fiscalizam a passagem entre componentes do perímetro? Ahahahah. Se calhar até espreitam, se forem mictar ao fosso anti-carro que andaram a cavar... Deveriam estar preocupados em escavar bunkers, ou acham que o ar condicionado que insuflam nas lonas vai fazer efeito de airbag, com umas tantas morteiradas? É com tropas desmoralizadas, acagaçadas e subnutridas, que vão salvar o ilegal que se refugiou na embaixada, do outro lado da cidade? E as guarnições de Ouallam e Ayorou, entregues à sua sorte? Ouallam está a cem quilómetros de Niamey em voo de andorinha, já Ayorou está a mais de duzentos, mas a apenas vinte da fronteira do Mali e sessenta da do Burkina.

Apesar de "estar por um fio", ainda não se encetaram sequer as hostilidades no terreno, mas o Níger já se tornou um inferno para os teimosos invasores.


PS A revista Jeune Afrique, que mais não tem feito que papaguear a voz do dono, agora replica títulos para os esvaziar. Será deontologicamente aceitável, no curto espaço de menos de 24h, que utilizem um título da concorrência, mantendo o substantivo significante apenas trocando verbo e sujeito por sinónimos, na mesma ordem e tempo? La grogne gagne les troupes (OF) > La grogne monte dans les casernes (JA). Trata-se obviamente de uma fake em jeito de retaliação mediática taco a taco de Macron, imputando-a ao inimigo burkinabé, ao mesmo tempo que encomenda bombardeamento do aeroporto de Timbuktu, para desmoralizar o inimigo maliano. Estamos em plena guerra da (des)informação.

quarta-feira, 20 de setembro de 2023

Cabeça no cepo, bunda ao léu

Sob o falso pretexto do relançamento do projecto de carro de combate franco-alemão, o cornudo enrolou o seu homólogo alemão, para uma "rara conferência de imprensa conjunta", segundo reporta o Le Monde. Pelo meio, emprestam-se ao ministro da defesa Pistorius as declarações "Nos militaires sur place ne sont pas actuellement en danger", referindo-se aos cem militares germânicos que permanecem ao lado dos franceses no Níger. O exemplo de "reposicionamento" americano parece que não foi suficiente para o elucidar acerca dos riscos que espreitam esta tropa. Uma declaração política destas a seco, só pode, como é óbvio, significar o contrário. O godo com nome em latim está todo borrado e os referidos militares enfrentam perigo iminente por uma causa perdida, ainda para mais alheia. Valem o que valem, as garantias de segurança de Macron, cujo objectivo é óbvio: fingir que não está assim tão isolado na Europa quanto efectivamente está, relativamente a uma intervenção armada, fanfarronando com mais uma centena de voluntariosos reféns, para além dos já constituídos.

terça-feira, 19 de setembro de 2023

Remember Mogadiscio

"Estamos ali perto" referia o General Rica Couve. Será que olhou para o mapa? A proximidade é sempre uma noção relativa. Neste caso, a embaixada situa-se do lado precisamente oposto da cidade, em relação à base aérea 101, onde se encontram cercados um milhar de militares franceses. Ou seja, caso a Polícia nigerina se decida a cumprir as ordens recebidas para proceder à detenção do imigrante ilegal, terão de atravessar a cidade a toda a velocidade para proporcionar ao desgraçado a "segurança" que lhe garantiram. Não parece muito avisado utilizar os helis no perímetro apertado, atendendo à fartura de fogo em alerta nas redondezas. 

Em caso de início intempestivo das hostilidades por parte dos agressores, Paris pode esperar um assalto ao mais fraco dos seus enclaves, o que obrigará a que façam sair da sua base principal um número significativo de homens, cuja coluna terá de se estirar ao longo de um percurso de quilómetros, criando oportunidades para múltiplas emboscadas. Tentar usar a base aérea representa obviamente um risco demasiado grande para que algum aluno de Saint Cyr, mesmo sofrível, ouse assumi-lo. Os paras ganharam conhecimento do terreno, mas os aviões não podem voar baixo o suficiente para a largada, seria como uma sessão de tiro aos patos.

Descrédito absoluto

Ao mesmo tempo que Macron primava pela ausência na Assembleia Geral da ONU, a França mobilizava declarações formais de apoio da UE e dos EUA ao governo Bazoum, argumento que pretende invocar como pretexto para a intervenção militar unilateral em Niamey, desautorizando por completo a organização. 


Note-se, através da última informação, que Tinubu, também em NY para a AG, declarou ser "the one stopping the ECOWAS from deploying soldiers in Niger". De primeiro promotor a último detractor da agressão prevista, o presidente da Nigéria percorreu já um longo caminho, nestes cem dias iniciais do seu mandato.

segunda-feira, 18 de setembro de 2023

7ze, na ponta da informação francófoba

Emplastro, o meio de comunicação social mais bem informado a nível mundial, em plena época de caça ao pato Macron armado em falcão. 

Violenta revolta arrisca-se a tomar conta da capital francesa (a Bastilha tendo sido demolida, sugiro o Champ de Mars ou o quilómetro zero, vulgo a rotunda Estrela, a pretexto do rebaptismo do mamarracho que por lá campeia, como Arco da Derrota, assinalando o maior desastre do exército francês desde Junho de 1940) quando estourarem as fatídicas notícias de dezenas ou centenas de jovens militares mortos e a humilhação dos sobreviventes. O mês de Junho deste ano vai parecer uma brincadeira de férias, comparado com aquilo que o espera nas ruas de Paris, depois do massacre no Níger.

Em França muita gente se começa a aperceber do "beco sem saída" no qual Macron se deixou encurralar, falando em "barril de pólvora".

Motivo de chacota ontem em Niamey depois das suas idiotas declarações classificando o indesejado como refém, Macron fez tudo para censurar a cacha preparada pela cadeia televisiva Russia Today, incluindo entrevistas aos residentes, bloqueando-a em várias redes sociais, a pretexto de ser ofensiva contra "chefe de estado". O bebé mimado não suporta que digam a verdade, mas não hesita em obrigar a sua Agência de Notícias a inventar fakes, para criar diversões prestando efémera cobertura às humilhações resultantes das suas estapafúrdias decisões. Afinal, quem desinforma em África?

O Rei em Rabat, Macron

Por incrível que pareça, a atitude de Macron relativamente ao Níger, está a provocar uma aproximação anti-francesa entre o presidente argelino e o rei marroquino, países tradicionalmente adversários: para tentar furar o isolamento em que o seu chefe a colocou, a neoColonnalista esticou a corda, Sua Magestade não apreciou a descortesia, tratou-a como libertinagem da feiosa e colocou-os rapidamente aos dois no respectivo lugar. 

Ah, e o presidente também, Macron. 


PS Ainda propósito do título e em bónus, um genial jogo de palavras brasileiro : SOCORRAM-ME, SUBI NO ÔNIBUS EM MARROCOS

Na brasa

Quando há jornalistas reportando que os boatos de golpe de Estado "now" se basearam em rumores persistentes que circulavam ontem de manhã em Brazzaville, estas não devem ser classificadas como simples fakes: eventualmente numa subdivisão lineana do estilo "self-fulfilling prophecies", como obra de desejo colectivo.

O Le Point, que desde o início da crise nigerina se destacou pela sua linha editorial muito céptica relativamente ao papel de Macron, publica hoje uma crónica de Tierno Monénembo, intelectual guineense, lembrando o militar íntegro, cujo resgate da prisão deve ser o objectivo número 1 do futuro e já ineluctável golpe.

neoCOLONNAlisme

A MNE francesa, cúmplice do alienado, foi até à Assembleia Geral das Nações Unidas para martelar a estafada posição de negação, insistindo que o seu ex-representante, sem autorização de residência, vai ficar em Niamey "enquanto assim o desejarem", negando que o mesmo corra qualquer perigo, apesar de estar cercado e à mercê de uma operação policial, para execução da ordem de detenção em curso. 


Enquanto isso, o Kremlin convoca o embaixador francês em Moscovo sob pretexto fútil, para transmitir a Macron a extensão do protectorado ao Níger. A nova Federação dos 3 países golpistas está disposta a enfrentar a ameaça implícita que as palavras de Colonna comportam, contando com o apadrinhamento russo... significando que deveriam abandonar a displicência e começar a levar as coisas um pouco mais a sério.

Ao mesmo tempo, espicaçado pela opinião interna beninense, acusando o governo de ainda não ter tomado posição sobre denúncia da invasão prevista a partir do seu território e a rescisão unilateral dos acordos militares recentemente assinados, este calcanhar de Aquiles da francofonia apressa-se a protestar obediência canina ao dono, no mesmo registo de irredutibilidade, de retórica belicista e incendiária.

Não há fumo sem fogo

Para efeitos arqueológicos: ao princípio da tarde, propagava-se via redes sociais um suposto golpe de Estado no Congo "francês". Ainda antes de transpirar para notícias, por volta das 18h de Bissau, Thierry Moungalla, ministro de N'Guesso, publica na Plataforma X, o antigo twitter, um desmentido tranquilizante, classificando tais "notícias" como fakes. Pouco depois, tanto a CNN como a BBC reportam que as tentativas para confirmar o boato se revelaram infrutíferas. Contudo, a própria pressa em desmentir a simples fake, revela o mal estar de Sassou, que pouco tem dormido com medo de se tornar no próximo (até já partilhou a insónia com o presidente angolano). 


Mas há mais elementos a considerar: será pura coincidência ter sido anunciada, um dia antes, uma frente comum da oposição para contestar a legitimidade do Presidente, propondo uma transição de dois anos no fim da qual este seria excluído das eleições? É no mínimo curiosa, todavia, a ameaça quase explícita no discurso do porta-voz, quando defende que com essa bondosa proposta estão a estender a mão da paz ao presidente e que o melhor seria este aceitar, para evitar "soluções extremas". Num artigo que reporta tais declarações, o jornalista interrogava-se mesmo se não estariam a avisar N'Guesso quanto um eventual golpe... a nova fobia ameaça tornar-se auto-realizável.

PS Muita gente embarcou. Não há dúvida que a fruta está madura e pronta a ser colhida. A francofobia em brasa em Brazzaville! e ali mesmo à vista, em Kinshasa, no outro Congo, o mesmo se passa com a onufobia.

sábado, 16 de setembro de 2023

Rica couve

A título de comentador televisivo, o General Richoux (ver minuto 13) dá parte da arrogância militar do exército francês relativamente às suas "emprises" em solo nigerino. Então o senhor General assume confiança absoluta nas suas forças especiais, garantindo facilidades em território inimigo? Segundo as suas palavras, estão ali perto, abrem caminho à Rambo, são invulneráveis e é impossível que algo corra mal. O mais chocante nem sequer é este absoluto desprezo pelo adversário, o qual só de si já é facilmente passível de se converter em derrota. Transmite informação importante: confessa que contam com a operacionalidade do aeroporto para fins tácticos, evidenciando o perigo, aqui cedo enunciado, que representa a base aérea como eventual testa de ponte para um desembarque aero-transportado. O que o senhor General não atentou foi nos avisos de Putin, desaconselhando vivamente a agressão ao Níger depois da passagem dos emissários de Goïta, os quais após reportarem seguiram para Niamey, hoje confirmados pelo reaparecimento de Surovikin do purgatório Prigozhin, com escala em Alger a caminho do mesmo destino. O que só pode querer dizer que a Junta conseguiu finalmente que o paizinho enviasse o necessário para dissuadir qualquer tentativa no sentido de descolar ou aterrar na "sua" base aérea, senhor General. Nas cercanias, não será difícil aos sitiantes escolher o(s) local(is) adequado(s) para instalar o(s) equipamento(s), fechando o eixo pelas duas pontas. O senhor General deveria mas é dedicar-se à agricultura e ir plantar legumes, que estas coisas da guerra são complicadas demais para a sua desmesurada cagança. A tragédia anunciada parece avizinhar-se a passos largos.

Auto-refém

Macron faz-se refém a si próprio e ainda vem publicamente reclamar. Onde já se viu um refém recusar um convite para sair do cativeiro? Síndrome de Estocolmo? O "refém" ainda reclama da comida? Alguém poderia explicar ao bebé mimado e adolescente psicopatausurpador do Eliseu, que opções têm custos?


Macron continua a alimentar a grande fogueira de ridículo em que arde: é obrigado a explicar-se, depois de ofício tentando ostracizar os artistas dos 3 (Burkina, Mali e Níger), medida que caiu muito mal no meio cultural e lhe valeu o desprezo de Jean-Luc Mélenchon apodando-o muito justamente de grande inquisidor.

Enquanto a Air France mantém a sua suspensão de voos para os 3, esperava ansiosamente a reabertura do espaço aéreo nigerino, para evitar grandes desvios para outros destinos, aproveitando de imediato para o atravessar. Já Air Algérie e Royal Air Maroc apressaram-se também para suprir o vazio como oportunidade de negócio...

PS Uma vez mais, os mimos não são meus, mas sim de um reputado líder da oposição, François Asselineau. Uma pequena amostra de comentários em media e vídeos do YouTube permite rapidamente chegar à sólida conclusão de que a opinião pública francesa já se apercebeu da perigosa realidade e da doença mental em fase terminal do seu ainda presidente, havendo cada vez mais gente a propor, para resolução do "impasse" africano, a respectiva demissão. Nem os artistas, nem os nigerinos, deveriam pagar pelas decisões dos seus governos: mesmo que sejam todos ou quase todos favoráveis à Junta. Como retaliação a estas medidas persecutórias, num contexto de reciprocidade negativa, a Air France poderia ser visada por uma exclusão particular do espaço aéreo comercial. 

quinta-feira, 14 de setembro de 2023

666

No fim de semana fui até à Baiana para trocar uns tantos euros que tinha. O desafio era provar que conseguiria uma taxa de câmbio acima da média oficial de 656 francos CFA por cada euro. Entre as funções do BCEAO, que possui imponentes agências em cada um dos 8 países da UMOA, figura a de garante dessa paridade fixa. São admissíveis e compreensíveis pequenas variações centradas nessa média e a banda de variação cambial na rua, de cerca de 30F, é tradicionalmente desfavorável ao franco CFA. Contudo, até há cerca de um mês, nunca essa banda havia furado os limites oficiais. Ora consegui trocar os meus euros a 666 francos cada um! Explicando por miúdos: se o BCEAO é suposto disponibilizar os euros a 656, pelo menos ao sistema bancário, como é possível que eu consiga 10F a mais, se o cambista também tem a sua margem? Para que haveria de mos comprar a mim, se os pudesse comprar mais baratos muito oficialmente? Outro elemento a considerar é que o "deslize" ocorreu no curso de uma única semana, tendo decorrido há já mais de um mês, mantendo-se essa "paridade" de rua inalterada até agora. No mínimo estranho. Uma explicação que parece plausível consiste no arranque de um movimento especulativo que o Banco de França terá sido obrigado a travar, suportando a nova paridade informal recorrendo às suas reservas. Por razões políticas, parece óbvio que não haverá desvalorização declarada até à resolução do "impasse" Níger. Mas e depois? Quo vadis, CFA?

quarta-feira, 13 de setembro de 2023

Traquée au piège, vaincue et evincée

Le Niger est le cercueil de la France en Afrique, ainsi que celui de la CEDEAO. L'acharnement belliqueux auquel on assiste de la part de l'incendiaire qui préside à Paris est une folie, comme l'annonçait déjà il y a un mois Renaud Girard, le plus célèbre journaliste de guerre au Figaro. Mais Macron n'est soucieux ni de l'opinion consacrée ni des conséquences, a perdu tout sens d'État et est tombé en plein délire, contaminant les quelques chefs d'État africains qui restent - encore mais pas pour longtemps - à la francophilie, lesquels l'on peut désormais compter par les doigts d'une seule main. C'est le tout pour rien.

terça-feira, 12 de setembro de 2023

Bater à porta errada

O quay d'Orsay reclama a libertação do cidadão francês Stéphane Jullien, preso há uns dias pela polícia. É normal. Contudo, como não reconhecem as autoridades de facto, presume-se que o destinatário seja o presidente Bazoum. A França está a cobrir-se de ridículo, no Níger. 


Quem o diz é o carismático líder da oposição Hama Amadou, até aqui no exílio precisamente em Paris, que decidiu voltar ao seu país ameaçado, como bom patriota, manifestando o seu apoio à Junta Militar e identificando claramente o problema: o macro-ego de Macron.

A linha editorial do Le Monde, a qual deu inicialmente alguma cobertura a Macron, inflectiu finalmente, perante as evidências, intitulando artigo, na sua edição em inglês: France must get out of Niger trap. O ainda presidente está cada vez mais isolado, tanto externa, como internamente.

PS Num caso normal, um cidadão estrangeiro como este, acusado do gravíssimo crime de alta traição, por tentar entregar uma pizza ao sem papéis, em violação flagrante das novas leis do país, as quais proíbem qualquer apoio ao sitiado, seria visitado na prisão pelo seu embaixador.

segunda-feira, 11 de setembro de 2023

Chá de qualquer erva

Para os nervos, é do melhor. Talvez devam servir uma taça (claro que de cicuta seria mais eficaz, do ponto de vista dos interesses que este jurou defender) ao senhor presidente, no palácio do Eliseu, quando lhe anunciarem que a sociedade civil chadiana está a exigir a partida das forças francesas e a denunciar os acordos bilaterais, alinhando-se com os seus irmãos nigerinos, a pretexto do assassinato de um soldado nacional por um estrangeiro, mas para o qual existem versões desencontradas: numa versão defendem ter-se tratado de legítima defesa de um enfermeiro quando atacado pelo paciente, noutra há um segundo interveniente que age em defesa do primeiro. Parece óbvio que a pressa de Paris em exfiltrar do país o(s) envolvido(s) só veio contribuir para o agravamento da situação, como ofensa soberana por evasão, antes do esclarecimento dos factos, à jurisdição local. Lembre-se que o jovem herdeiro apadrinhado em Njamena, inicialmente dado por garantido por Paris contra o Níger, antecipou-se ao próprio Tinubu a roer a corda rota estendida, apercebendo-se imediatamente do perigo para o seu frágil poder, que pretende consolidar.

Terrorista suicida

O louco masoquista Macron, já demitido por Jean Luc Mélenchon (depois de assumir as suas fraquezas e frustrações) perdeu as estribeiras, em plena cimeira do G20, onde a sua agenda pessoal se limitava precisamente a um encontro com o presidente nigeriano Tinubu (para o convencer a, pelo menos, avalizar a agressão francesa ao Níger), ao ser confrontado com o comunicado oficial da Junta Militar, acusando-o de "manobras sub-reptícias e dilatórias" relativamente à expedita retirada que estava em cima da mesa (generosa oferta, diga-se de passagem, para limitar a desonra da França). 


O discurso cansado de Macron, é pior que K7 ou disco riscado: não reconhece as autoridades de facto. Mas que falta de originalidade e de memória: vamos lá reavivá-la e debelar a PP (puta do Parkinson). Já reconheceu, não uma, mas duas vezes: quando quis retirar os seus cidadãos; quando o general BB (Bruno Baratz) comandante "no Sahel" se encontrou com o CEMFA  General Moussa Barmou, com a intenção de evacuar guarnições francesas no interior, mais expostas a acção de envergadura. Voltamos à estaca zero, quer guerra por desaforo? Eliseu virou manicómio!

Após o mea culpa de BB em Maio, admitindo que antes tudo estava mal, chegando a falar em "desbarkanização" das forças francesas (terá acusado recepção do gozo do exército português?), pretendiam dar a impressão de terem aprendido a lição do Mali (onde, depois de terem feito m... também alimentaram um discurso "irredutível"). Mas afinal era tudo treta, agora viram o bico ao prego, deixando cair a máscara do discurso manso para vestir a pele do lobo. Só que este está desdentado (apenas para retomar Tinubu quando tentou renegar a sina de "toothless bulldog").

Internamente, o bronco va t'en guerre, até já foi acusado pelos meios eruditos de trair as regras de ouro da diplomacia de origem francesa, quando cometeu o impensável, recusando-se a evacuar o seu embaixador declarado persona non grata. Transpirou mesmo que tudo se trata de decisões unilaterais de Macron, sem consultar sequer os seus mais chegados, de quem se fez acompanhar na sua deslocação à Guiné-Bissau. Portanto, vejamos se percebemos bem: um desvairado impotente está a conduzir sozinho a França para um ineluctável matadouro sem que ninguém trave o maluco e o algeme?

Completamente isolado em termos europeus, contra sérios avisos aos quais deveria prestar a sua atenção, como aquele, bem precoce, de Itália ou um outro de uma jornalista francesa (aliás já anteriormente elogiada por este blog como profunda conhecedora da matéria em causa), está mais que visto que a França está refém de um alienado reincidente. La France fait pitié. Son arrogance mal déguisée, crystalisée à l'Elysée, va mal tourner très rapidement, suite à cet entêtement au négationnisme, typique d'une certaine masculinité toxique, abondante chez les ex-maris.

Imagine-se que o Império do Mali, tomando conhecimento da tomada da Bastilha e da revolução francesa, tinha tomado a decisão de enviar tropas para devolver o poder ao antigo monarca. Aliás, ao contrário do Níger, onde ninguém apoia Macron, estes sempre teriam os chouans e os vendéens a quem se juntar, para garantir uma aparência de legitimidade. Se Bazoum vier pois a ser degolado graças aos bons ofícios de Macron, depois não venham reclamar que se tratou de uma barbaridade, só porque o método empregue não pagou direitos de autor ao filantropo Monsieur de Guillotin.

O resultado mais que provável, para além do falhanço total, será a interrupção do efeito dominó em curso, suplantado por um efeito terramoto, ou melhor, bomba atómica, para retomar a expressão cataclísmica de "explosão primária" cunhada por Leslie Varennes, com a queda instantânea e simultânea dos ainda ditadores da CEDEAO fantoches da França, na Costa do Marfim, Senegal e Bénin. Dans l'ordre ou dans le désordre, comme au tiercé. C'est possible que Faure arrive à s'en tirer au Togo, tenant compte qu'il n'est pas aussi con que les autres pour se faire trapper à ce piège.

PS Não foi por acaso que escolhi o título para este artigo: foi por hoje ser dia 11 de Setembro. À excepção deste, os outros mimos com que brindo o abominável visado, no corpo do texto, são extraídos dos artigos de opinião franceses citados. 

terça-feira, 5 de setembro de 2023

Entradas de leão, saídas de carneiro

Apesar de todos os silogimos que possam encontrar, Macron sai do Níger com o rabo entre as pernas. E o primeiro prémio vai para "as autoridades francesas procuram adaptar a sua presença na região em consequência do golpe de Estado. Na sequência do ocorrido, os responsáveis franceses encetaram discussões com os seus homólogos nigerinos para avaliar as possibilidades de um alívio dos movimentos dos recursos militares franceses". Homólogos? Em que ficamos? Reconhecimento?


É só a nível local, informa a AFP, citando o Ministério do Exército, não com a Junta, apressando-se a acrescentar. Até aqui, era o Porta-Voz do Estado-Maior que fazia esse papel, empurrando agora tal ónus para o governo, pois obviamente não gostam da palavra "retirada", a qual a AFP frisou não constar do discurso oficial. Se consultassem a cartilha descobririam que a metáfora certa é "reposicionamento estratégico". Fontes bem informadas do Le Monde garantem que vai começar por Ouallam e Ayorou.

domingo, 3 de setembro de 2023

Despertar doloroso

O desinteresse do protocolo presidencial, com convites em cima da hora (marcado para as 15h, ao meio-dia muitos ainda não tinham recebido o telefonema) permite suspeitar que a estranha e inesperada iniciativa de Macron, ao convidar os líderes da oposição para um jantar franco e recatado, logo após a conferência de embaixadores, era obviamente para tentar um consenso "nacional" sobre o Níger, caso a situação rebentasse. Aparentemente, a opinião pública francesa dá mostras de se manter relativamente alheia à situação, inconsciente dos perigos que espreitam. A imensa maioria daquilo que foi publicado pela imprensa, sobre a referida "sessão de trabalho", focou aquilo que se passou depois do jantar, debruçando-se sobre os últimos dois pontos, concernentes à situação interna, os quais não passavam obviamente de areia atirada para os olhos, transformando-se em pura manobra de diversão política. "A montanha pariu um rato", como se escreveu num artigo em inglês, traduz bem a impressão que sobrou de tal encontro.


O mais interessante, acaba por ser o episódio que transpirou: a irritada e gratuita reacção de Macron face à proposta de redução dos actuais dois mandatos de sete anos presidenciais para um único. Terá exclamado que a limitação a dois mandatos foi uma "funeste connerie" - aprovada por Sarkozy em 2008, a qual o impede de se poder candidatar às próximas presidenciais - acrescentando que, "quem não se pode recandidatar perde o poder desde o primeiro dia". O que terá levado Jean-Luc Mélechon a concluir que "Macron a craqué", que o seu "reinado" acabou, e que já estamos na era pós-Macron, sugerindo mesmo um referendo para antecipar o termo do seu mandato. Só depois da enorme manifestação popular de ontem, com dezenas de milhar de pessoas e reconhecidamente a maior desde o golpe, à porta da base aérea onde estão cercados os militares franceses, o líder da France Insoumise parece ter acordado para o beco sem saída no qual Macron colocou o seu país. A partir de agora, tudo pode dar para o torto...

sábado, 2 de setembro de 2023

Fugiu-lhe a boca para a verdade

O Porta-Voz do Estado-Maior francês decerto não mediu bem as suas palavras. Nas suas ameaças, utiliza a palavra "emprise" para definir os "enclaves" franceses em território nigerino. O dicionário Larousse faz autoridade sobre o assunto:



Todos os sentidos da palavra apresentados, incluindo os sinónimos, são altamente comprometedores, implicando: 

1. Ascendente intelectual ou moral de alguém; influência de alguma coisa sobre uma pessoa.
sinónimos: ascendente - império - influência 
2. Tomada de posse pela administração de propriedade privada imobiliária.
3. Incorporação no domínio público de superfície ocupada por uma estrada, via férrea - ou aeroporto - e suas dependências 
Psicanálise
4. Relação de domínio, de manipulação e de maus tratos, utilizando a violência psicológica 

Os militares limitam-se a traduzir o espírito das instruções recebidas, contudo revela uma terrível falta de tacto, é anti-diplomático e muito susceptível de irritar os pan-africanistas, acirrando ainda mais os ânimos contra a França de Macron.

quinta-feira, 31 de agosto de 2023

Camarões na grelha


Ontem ainda, no mesmo dia do golpe no Gabão, o nonagenário presidente camaronês decretou importantes mudanças nas Forças Armadas, enfiando claramente o barrete da desfrançafricanização, como um dos próximos na lista. 
Estão todos muito preocupados, individualmente e aos pares, 
mas pouco ou nada se ouve falar das equivalentes subregionais da CEDEAO. Já as metáforas sugestivas multiplicam-se: ONDA AVASSALADORA, algumas até se podem conjugar: VENTO DE PÂNICO espalha FOGO NO CAPIM.

Um artigo de opinião publicado num media camaronês equipara os golpes militares a cirurgias estéticas para estados neocoloniais.

Finalmente, o Senhor Embaixador pronuncia-se

Eu, que sou um assíduo leitor de longa data do agora mediaticamente famoso comentador e líder de opinião Francisco Seixas da Costa, de cuja hospitalidade no Seu blog - que pertence à minha lista à direita - tenho de confessar que já por várias abusei, andava nos últimos dias a remoer o prolongado tabu em relação à expulsão de França do Sahel, oposto a uma prolixa guerra na Ucrânia. Cheguei mesmo a pensar em reincidir em eventual indelicadeza, enviando mensagem instrumental e explicitamente não aceitável - conhecendo o protocolo compreensivelmente rigoroso dos comentários, o qual se pode traduzir por eventual mas sempre justa censura - apenas para tentar despertar a questão. Os recentes acontecimentos, mais equatoriais, foram a gota que, pelos vistos, fizeram transbordar o copo da visão geo-estratégica ao nível continental. Valeu a pena esperar, sem precipitações, pela autoridade da maturada sentença de Sua Eminência, conhecida por extremamente comedida e diplomática: esta é definitiva e lapidarmente sem apelo nem agravo.

França ondossa poder?

Os receios de que falava no post anterior, podem, afinal, revelar-se justificados, mesmo se não foi possível confirmar os rumores de os militares terem declarado que respeitariam todos os acordos internacionais.  O povo gabonês deve manter-se vigilante, prevenindo a possibilidade deste golpe se tratar de uma encenação de Paris destinada a descalçar a bota Bongo, que Macron já havia renegado, e endossar o poder a seu favor, confiscando-o a Ondo Ossa, cujas posições anti-francesas são bem conhecidas e que venceu as eleições por larga margem. Nesse caso, há a possibilidade de o próprio Nguema, caso tenha aceite desempenhar o papel, ouvir a voz e realinhar-se com o povo - o qual comemora alegremente na rua - e virar o bico ao prego, assumindo um papel histórico e a genuidade do discurso, descartando a total hipocrisia que representaria uma tal traição, a qual Deus e seus cidadãos, mais tarde ou mais cedo, lhe cobrariam. Quanto a França, nesse triste cenário, arriscaria fortemente a que o tiro lhe saísse pela culatra, deitando gasolina gabonesa para a grande fogueira em que está a arder. 7ze desculpa-se pela precipitação, declaradamente ocorrida sob pressão, bem como estar a oferecer duas versões contraditórias, mas admite que tudo é possível, e não apaga mensagens, como a AFP. Como defende um gabonês, para já comemora-se a queda de Bongo, depois logo se vê, o futuro revelará os seus personagens... Cada coisa a seu tempo.

quarta-feira, 30 de agosto de 2023

Gã Bongo compulsivamente reformado: Gabon Go

Apesar de algumas reservas iniciais, justificadas pelo receio de uma encenação de mainmise francesa, tendo sido postos a circular rumores de uma suposta declaração de que os golpistas respeitariam todos os compromissos internacionais, associados a uma tentativa de desacreditar o porta-voz da Junta (que seria pouco depois promovido on-line pelos seus homens a novo homem forte), a esta hora já não restam grandes dúvidas de que se trata de um golpe anti-francês. O modus operandi é cópia fiel dos golpes na Guiné e no Níger: o chefe da guarda pretoriana assume as responsabilidades em nome do povo. Este golpe afigura-se mesmo como especialmente legítimo, por se constituir em denúncia de todos os vícios da FrançAfrique, desde a tradicional fraude até à mais recente moda: os terceiros mandatos. A própria reacção da chefe do governo francês, emanada no curso da muito especial conferência de embaixadores em curso sobre este género de assuntos, evidencia que não houve o até aqui "obrigatório" beneplácito da França. A condenação do golpe é risível, após a hipócrita diplomacia francesa se ter convenientemente mantido muda perante o golpe palaciano na "democracia", com a publicação dos resultados, já de si muito arrastada, a meio da noite, e do ataque à liberdade de expressão que configura o corte de ligação à internet. Concretizam-se os receios manifestados por Macron de contágio pelo vírus que classifica como "anti-democrático". Talvez esteja na hora de declarar a pandemia, porque ainda não acabou... a vassoura burkinabé vai continuar a varrer o continente. Libreville est libre! On Paris quel sera le prochain?

Mosca na durmi?

7ze na djungu? Já são várias mensagens, respondo pois pela origem... A catadupa de acontecimentos está a provocar um pico de trabalho de documentação, porque o Emplastro não publica nada que não seja devidamente confirmado e credível (ao contrário por exemplo da Agência do Vaticano, a qual 36 horas depois de este blog, na mensagem anterior e com base na Reuters, ter publicado que a expulsão de outros embaixadores era faketory Macron, ainda andavam a contaminar o mundo com mentiras mal enjorcadas). Há ainda o esforço de analisar a conjugação de acontecimentos naquilo que se configura desde já como o efeito dominó, já aqui antecipado, propagando as ondas de choque da escalada no Níger.


Nas próximas horas, actualização sucessiva, e por esta ordem, dos dossiers:

Gabão
Camarões
Níger 

sábado, 26 de agosto de 2023

Reuters goza France Presse

É com um misto de humor britânico e cinismo que a agência noticiosa inglesa dá conta da incrível operação de intoxicação à qual se prestou a sua congénere francesa, ao propagar as fakes encomendadas pelo Eliseu. 

Na tentativa de diluir a vergonha da expulsão do seu embaixador, inventaram primeiro que o alemão teria recebido a mesma carta, depois o americano. Claro que meio mundo acreditou, atendendo à origem. 

A AFP terá obviamente de suportar delirantes custos em termos de credibilidade. Muitas outras agências caíram. Basta atentar no caso português, com o Público a sair para as bancas envenenado pela marosca.

A Reuters sublinha a inconsistência da AFP no título e na escolha da citação entre aspas, ao justificarem o apagão do post relativo ao embaixador alemão por as "autoridades" terem declarado a sua inautenticidade.

Note-se que essas "autoridades" não são aquelas que o seu governo considera legítimas. A mesma coisa para o embaixador americano, reconhecendo desmentido do MNE nigerino (novo governo e não governo Bazoum).

Em resumo, papam não uma, mas várias fakes, de um presidente stressado que pretendia tapar o sol com a peneira, para depois apagarem notícias, com emendas piores que o próprio soneto, em dissonância total.

sexta-feira, 25 de agosto de 2023

Impensável

A tensão atinge um pico terminal. Numa "première" mundial, o quay d'Orsay reage à expulsão do seu embaixador negando legitimidade às autoridades para tal, antecipando o anterior ultimato de dia 2 de Setembro para domingo ao anoitecer. Quem não quer sair a bem, terá de sair a mal. Persona non grata e ainda por cima, recalcitrante?

Tinubu denuncia Macron

A uma semana do fim do ultimato dado pela Junta Militar, Paris transpira stress por todos os canais. Ouattara e Macky Sall chantageiam o presidente nigeriano para a intervenção, julgando que as suas inexperientes declarações iniciais eram suficientes para o obrigar. Contudo, o presidente da Nigéria e da CEDEAO está bem amarrado, tanto pelos seus militares, como pelos líderes muçulmanos, tendo optado pelo bom senso de fugir com o rabo à seringa, denunciando as conversas "ultra-secretas" dos seus homólogos, confirmando a intenção francesa de intervir, mesmo sem a cobertura da CEDEAO. Com a França à beira do abismo, espera-se a qualquer momento a ordem de Macron para uma fuga em frente.

quarta-feira, 23 de agosto de 2023

Benefício da dúvida

A eliminação de Prigohzin é um tiro no pé. Será difícil chegar a perceber se foi o Czar, se os seus ineficientes e ineficazes generais. A Rússia criou um abcesso de fixação que vai cobrar um cada vez mais elevado preço em sangue, o qual muito rapidamente ultrapassará os limites de tolerância da sociedade russa.

O assassinato não deixará de ser associado à demissão de Surovikin horas antes, o Kremlin arrisca-se a não poder contar com esse benefício da dúvida, dando origem a uma reacção de raiva, sempre imprevisível. Pode saltar a tampa aos russos, perante a falta de perspectivas para a guerra na Ucrânia.

Pessoalmente e em homenagem ao paladino da iniciativa privada, prefiro pensar que se trata de uma conspiração combinada entre os dois, para que Prigohzin desapareça do cenário durante uns tempos. Aparecerá a rir daqui a uns anos... Este é o meu benefício da dúvida, antes da promoção do herói a mártir.

Escassez induzida

Consequência lógica da imponderada decisão tomada em Conselho de Ministros, de fixação dos preços do arroz, será sem dúvida a escassez instantânea. Alguém de bom senso deveria desafiar o Primeiro-Ministro a tentar comprar hoje arroz, a esse preço "legal". Nenhum comerciante será tão pouco profissional a ponto de vender ao preço tabelado, sem garantias de reposição de stock com margem minimamente compensatória. Teria sido mais inteligente para Geraldo Martins pegar pela outra ponta, acautelando junto dos importadores, através de concessões alfandegárias futuras, como incentivo à importação, o abastecimento. O resultado desta medida populista contra as mais elementares regras de mercado, não tardará a ficar patente, arriscando-se a desacreditar a autoridade e a abortar o estado de graça do novo Governo.

Proposta para Prémio Nobel da Paz


Stanislas Poyet merece sem dúvida a distinção da Academia. A Paz constroi-se com acções concretas, não com palavras vãs, como na ONU. Este corajoso jornalista francês da Radio France, que destila um charme Leonardo DiCaprio, foi miseravelmente agredido e roubado, por uns quantos sobre-excitados. A Junta não tem qualquer interesse neste género de demonstrações altamente prejudiciais para os seus intentos, pelo contrário, tem todo o interesse em propagar a imagem da tolerância. Tal deveria ser rapidamente clarificado através de medidas fortes, protegendo os jornalistas, em especial os franceses, mais expostos. Seria assim dada uma maior relevância a este caso, evitando que se repita e invertendo o ónus.

Se tivessemos estadistas como Stanislas em vez de Macrons, a Paz estaria assegurada. Os cristãos podem rever-se nos ensinamentos do seu Mestre e constatar a eficiência do perdão. Em poucas, mas substanciosas palavras, esgotou o assunto. Começando pelo reconhecimento das novas autoridades, ao qual se nega o seu país, continua por uma declaração de amor ao povo nigerino, afirma que o sentimento já vem de bem antes do golpe de estado, desagrava os seus agressores, não desiste e defende a continuação de um saudável convívio entre os povos. 

Em relação ao M62, movimento que resulta da coligação de organizações da sociedade civil, com o fim específico de expulsar os militares franceses, cujo embrião foi uma manifestação realizada dia 11 à porta da base aérea de Niamey por estes controlada, deveriam esclarecer e formar as suas gentes: os jornalistas não só são úteis, como estão do mesmo lado. Aprender com Stanislas a distinguir as políticas da França, por mais detestáveis que sejam, do povo francês. A 2 de Setembro, expira o ultimato da Junta.

terça-feira, 22 de agosto de 2023

L'Armée en stress

A Rádio Argel, estatal, lançou ontem o isco, um suposto pedido de utilização do espaço aéreo, com o objectivo explícito de alertar para a iminência de um ataque. Como se Paris se humilhasse ao ponto de insistir em algo já publicamente negado. A coisa poderia ter passado despercebida, pois esta manhã a notícia saiu apenas em italiano e romeno. Ridículo, o imediato desmentido do exército francês, jurando a pés juntos não ter efectuado qualquer pedido nos últimos dias. Serve apenas para evidenciar o stress a que está submetido o exército, muito cioso do seu prestígio. Aproveitam contudo a deixa para afiançar que "não têm nenhuma veleidade de atacar o Níger", sabendo nós que mesmo que tivessem, não nos diriam. 

Est-ce que l'on a oublié à l'Armée le communiqué à la veille de l'évacuation civile, faisant état que la militaire n'était pas à l'ordre du jour? Bon, il faudra la remettre, si l'on veut être cru.

Colère noire

Macron a piqué une crise en public contre le directeur des services secrets, à propos du Niger. En plein cul-de-sac, s'en prend à des boucs emissaires. 


No mesmo artigo, Leslie Varenne, reconhecida analista francesa, ex-jornalista de investigação, afirma que a intervenção que Macron prepara (independentemente do sucesso, o qual não considera garantido), mesmo debaixo da sombrinha da CEDEAO, é um verdadeiro tiro no pé, inevitavelmente conducente a uma "explosão primária" contra os interesses franceses em África. Sem poupar nas palavras fala em cataclismo e em cegueira de Macron.

segunda-feira, 21 de agosto de 2023

Pera-doce não temos

_Avie-me dois pastelinhos de camarão

_Pastéis de camarão, não temos
_Então são dois copinhos de vinho branco

Esta cena do Pai Tirano pretende ser um conselho para Macron: não insista em Niamey. O líder da Junta já avisou para não darem a coisa como favas contadas, o desembarque será tudo menos pera-doce, arrisca-se mesmo a ser um osso demasiado duro de roer e rebentar com o prestígio adquirido pelo exército francês em Kowelsi, como se pode inferir de artigo do professor Kabamba.

Petição informada

Na continuação do pronunciamento do fim de Junho, a inteligência recomenda a César que escute a voz da razão. Com o exército atolado na Ucrânia, numa obsoleta guerra de trincheiras, num contexto moral claramente desfavorável, há que reconhecer e assumir os erros, para poder gizar estratégias para lidar com a situação criada, estabilizando uma saída negociada à escala mundial. Atendendo à escalada ocidental e internacionalização do conflito, a eventualidade de uma supremacia aérea ucraniana obriga a repensar a guerra de posições e a uma retoma consistente da iniciativa no chão. Vem aí o inverno, com custos humanos de manutenção no terreno medidos a palmo. A partir da próxima Primavera, o futuro da Rússia joga-se num desfile militar em Kiev, que deverá coroar uma ofensiva bem organizada e sucedida. Em vez de projectar uma imagem de fraqueza, é preciso analisar bem os factos. A Rússia está na mó de cima, como se vê em Niamey, devido ao sucesso registado ao nível da privatização da guerra. Em vez de incorporar aquilo que funciona bem numa coisa que funciona mal, o caminho a escolher é precisamente o contrário! Até os Estados Unidos serão ultrapassados pela direita e classificados como comunistas, com um exército de iniciativa estatal e uma indústria de defesa ineficiente. Para além da sua responsabilidade perante a mãe Rússia, é o próprio prestígio de Putin perante a história que está em jogo. De outra forma, mais valeria abdicar e nomear o sucessor óbvio.

domingo, 20 de agosto de 2023

Voluntários às carradas

Os jovens do Níger estão a aderir em massa à Junta, dando origem a uma real mobilização geral. O povo alçado em armas, às levas de milhares. Afirmação soberana impossível de derrotar. Já há mesmo página para recrutamento de voluntários internacionais. 

sábado, 19 de agosto de 2023

Depois do Senado nigeriano, a Assembleia senegalesa

Dispositivo semelhante à Constituição bissau-guineense.

Macky Sall acossado em toda a linha. 

Crescendo de tensão

O quay d'Orsay e os seus palhaços tentam ingratamente manter a ilusão de que ainda não perderam a face, alimentando uma retórica belicista sem qualquer suporte na realidade militar, cujo resultado só pode redundar num agravamento da própria frustação. 

Um dos guignols de serviço é o Comissário para a Paz? e Segurança da organização moribunda CEDEAO, Fatuh Musah, que fez papel de animador político na reunião dos Chefes de Estado-Maior. Um autêntico Pinóquio, não se coibe de mentir com quantos dentes tem.

Em declarações à Associated Press, afirmou que 11 dos 15 países da CEDEAO estão dispostos a colaborar activamente na intervenção militar. Excluindo apenas os 4 países golpistas suspensos, configura um absoluto desprezo pelo posicionamento explícito de Cabo Verde.

Ora, basta a ausência lusófona, como reconhece o próprio no dito artigo, para os 11 se tornarem apenas 9, ou seja, menos de 2/3, o que ainda permitiria forçar certas decisões, já por si abusivas. Mas enviar o CEMFA à reunião não é o mesmo que enviar tropas para o terreno.

A Libéria e a Serra Leoa, apesar de participarem dos encontros organizacionais, têm levantado sistemáticas reservas quanto à intervenção militar. Mesmo chantageado por Paris, o ditador togolês, ao contrário do senegalês e marfinense, tem a noção da realidade.

Para contradizer esta contagem falaciosa de espingardas, basta ler o ponto da situação já aqui publicado. Mas a pseudo-oficial contra-informação não é nada, comparada com a performance teatral das ameaças belicistas que profere este burocrata "pacifista". Mas quem é?

Em Bissau, muita gente se deve lembrar do senhor, pois esteve à frente do gabinete integrado para a construção da paz na Guiné-Bissau, UNIOGBIS. Trata-se do elo de ligação entre a ONU e a CEDEAO, mafia veementemente despejada pelo primeiro decreto presidencial.

Não é apenas a CEDEAO que está em causa no Níger. É também o carácter vincada e tendenciosamente pro-ocidental que a ONU cada vez mais tem vindo a assumir nos mandatos do verme Guterres, que infectou a organização com um vírus maçónico franco-dependente.

Perante a crise de negação (em linguagem pedagógica fala-se em birra) do chefe, revelam finalmente a sua verdadeira natureza: quando "pacíficos" burocratas se assumem como beligerantes incendiários, teremos forçosamente de questionar o paradigma "peace making".

A marionete propala um bluff de prontidão da força em alerta, configurado numa euro-centrada metáfora belicista de "dia D", a qual só estaria à espera de luz verde, quando se sabe que a luz, para metade dos cidadãos da CEDEAO está amarela, e vermelha para a outra metade.

Mas também não me parece isto o mais importante. São as deixas nas entre-linhas. Este ex-comunista reconvertido em burocrata é um leigo na matéria e não compreende obviamente a linguagem dos profissionais. Só está interessado em comunicação de massas.

Vamos lá juntar as pontas. O dia é 6 de Junho de 1944, o D é de desembarque. Enquanto os receptores gostariam de ouvir coisas práticas, como composição do contingente, calendário de operações, modus operandi, afirma que se tratará de uma operação cirúrgica e de curta duração.

Parece óbvio que nenhum militar responsável pode ser tão inconsciente a ponto de alimentar esse discurso. Faz lembrar de como acabou a caveira do coronel que a 7 de Junho de 1998 prometeu a Diouf resolver a questão da Guiné-Bissau em menos de 24 horas.

Uma leitura plausível antecipa algumas escaramuças na fronteira do Bénim para diversão, com desembarque aero-transportado em Niamey de carne para canhão senegalesa e marfinense, com apoio da legião e tropas especiais francesas, a pretexto de salvar os seus.

Quem te avisa...

 “Je voudrais lancer un appel à mon cadet le président du Sénégal et à notre doyen le président de la Côte d’Ivoire. Il ne faut pas être utilisé par une puissance étrangère pour son agenda personnel.” 

Choguel Maïga, Primeiro-Ministro de transição do Mali

sexta-feira, 18 de agosto de 2023

Não há fumo sem fogo

Na praça de Bissau, o câmbio do Euro - 1/656 - relativamente ao franco CFA - nomenclatura monetária XOF - que se manteve estável no último quarto de século, com pequenas e infinitesimais variações sazonais e por vezes pontuais, mas numa curta banda, está a dar sinais, pela primeira vez, de especulação, a subir 5F por dia, na última semana: hoje, já só se conseguia comprar 1 euro por 685 francos. 

Os especuladores costumam ter razão, descontando instantaneamente possibilidades reais, mesmo que não se venham a concretizar e volte tudo ao normal: é claramente um indicador de que parece estar a crescer o receio - ou o risco, para manter o discurso probabilístico - de o Banco de França deixar de honrar a convertibilidade - ou desvalorizar os termos, como aconteceu em 1994, no caso para metade.

É que 3 dos 8 países que formam a UMOA, estão fora. Por outro lado, pode representar também a antecipação da tentação, para os franceses, de financiarem a guerra imprimindo moeda. Depois do COVID e da guerra na Ucrânia, mais um factor passível de contribuir para a inflação e aumento do custo de vida. Visto pelo lado positivo, o fim do CFA pode finalmente representar boas notícias para o ECO.

Aliança terrorista

Gato escondido com rabo de fora. Por detrás da retórica do quay d'Orsay obstinando-se em tentar demonstrar perante a opinião pública que o golpe degradou a situação securitária do Níger, apontando os recentes ataques, está a aliança terrorista de Macron, aliás já denunciada pelo Mali e pelo Burkina, a qual foi a razão objectiva, nos bastidores do próprio golpe. 

Efectivamente, chamado o chefe da guarda ao Palácio para ser confrontado por Bazoum com um decreto de libertação de um contingente de terroristas, este opôs-se firmemente: face à teimosia do presidente,  percebendo que este estava irremediavelmente reduzido a uma marioneta das manigâncias francesas, Tchiani deu-lhe ordem de prisão. Apesar de o referido decreto não ter chegado a ver a luz do dia, os franceses apressaram-se a libertar os ditos, no que foram imediatamente denunciados pela Junta Militar. 

A contra-partida da dita libertação seriam estes atentados, na zona das três fronteiras, coração dos países considerados como renegados por Paris. A hipocrisia, imagem de marca histórica da FrançAfrique, radicaliza-se perante o avançado estado de degradação do seu estado de saúde. Já não há quimioterapia que lhe possa valer, nada a fazer contra o cancro terminal...