O que está realmente em jogo, perguntam-se os portugueses, face ao
discurso arrogante e belicista de Paulo Portas? Estranham todas estas
movimentações diplomáticas em torno da Guiné, de Angola, a CPLP, a ONU, a OUA, a CEDEAO… Porquê este esforço todo para «repor a democracia»? Será mesmo isso que está em jogo? Não. De certeza que também não é para salvar os portugueses que nunca foram incomodados. Mas então o discurso de Paulo Portas será pura hipocrisia? Que irresponsabilidade! De facto, ofereceu-se para ir «salvar» 200 angolanos das «garras» dos guineenses. e agora está aflito e manietado, exposto ao público opróbrio e terá de engolir a seco as secas palavras que endereçou aos guineenses.
Na realidade houve apenas uma movimentação militar sem qualquer efusão de sangue (nem sequer novidade,
apenas um remake de um facto inteiramente decalcado, há dois anos atrás), a ordem e segurança públicas estão agora asseguradas, bem como uma transição política e pacífica.
Gostaria apenas de lembrar que as autoridades de facto na Guiné já fizeram claramente constar que não aceitam a presença, neste contexto, de qualquer força estrangeira em território nacional, advertindo que qualquer intrusão terá resposta militar. Qualquer agressão inconsiderada sentida em território guineense, decerto agravará
substancial, senão mesmo irremediavelmente, a já de si pouco famosa situação do
contingente expedicionário angolano in loco.
Um eventual desembarque, a tentativa de criação de uma testa de ponte, para além dos riscos implícitos
e dos imponderáveis maiores que se lhe adivinham, transformaria o contingente no
terreno num perigo militar à retaguarda, que se tornaria absolutamente necessário
eliminar, dando origem ao seu rápido desarmamento compulsivo, que esperemos, se tiver mesmo de vir a acontecer, possa vir a ser realizado sem derramamento de sangue.
Claro que não há arroz que chegue no Hospital, nem condições de garantir
essa logística para tanta gente, obrigando a que a sua alimentação tenha de
ficar a cargo de Angola, pelo que, por considerações humanitárias, decerto se
toleraria a criação de uma ponte aérea para esse fim, se forem solicitadas as
devidas autorizações às entidades competentes, evitando assim uma tragédia
humana de maiores proporções.
Talvez esteja na hora de o Ministro português adequar as suas expectativas
neste caso, à sua capacidade militar (e poder para a empenhar), num cenário
confuso e sem nada em jogo (pela positiva) para o seu país. Ou então assuma,
ponha-se à frente dos marinheiros, leve-os atrás e vá conquistar África de
volta; se a nação já não estava muito convencida quanto à oportunidade de Alcácer
Quibir, duvido que o siga nessa duvidosa aventura, tal como o exército, aliás,
a quem agora pede (a troco de um reles ordenado e de falta de respeito) para
serem mártires de uma causa alheia (e perdida). Esperemos que prevaleça o bom
senso e que a cegueira e autismo de que tem vindo a dar provas não empurrem Portugal
para um impensável desastre.
E mais: aconselha-se-lhe a leitura dos velhinhos manuais de estratégia. Admitindo,
pelo absurdo, que os guineenses eram apenas meia dúzia de oficiais sem controlo
efectivo sobre a tropa, sem meios militares eficazes, estaria a fazer um
primeiro erro de subestimar o adversário: mesmo que o adversário seja uma
pulga, deve ser sempre considerado como um elefante; mas pior, estaria a fazer uma coisa
altamente desaconselhada: nunca se encosta ninguém à parede, senão desperta-se-lhe
a propensão para lutar até à morte… Já Sun Tzu recomendava prudentemente que
nunca se fechasse completamente um cerco; há que deixar sem vigilância um
carreirinho por onde, pela calada da noite, os sitiados se possam escapar sem
glória.
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