Paulo Portas anda pelo mundo a implorar que o deixem meter o bedelho na
Guiné. A política internacional faz-se de realismo, de pragmatismo, e não de
ameaças que não podem ser cumpridas. Parece-me legítimo e actual manifestar
curiosidade quanto à forma como pensa «conquistar» a Guiné-Bissau (já agora,
também, como pensa mantê-la…). Está-se a ver o cenário idílico que vai na sua bucólica mente: os barcos
portugueses desembarcam os angolanos, estes matam toda a gente que encontrarem
pelo caminho, fazem a junção com a MISSANG, instalam-se em Bissau e vivem todos
felizes para sempre.
A independência da Guiné-Bissau custou muito suor e lágrimas, se os
angolanos são hoje independentes, devem-no essencialmente à luta do povo da
Guiné-Bissau contra o colonizador. Ninguém vai deitar fora essa independência
apenas porque, um dia, Paulo Portas o novo campeão da democracia no mundo,
acordou mal disposto.
José Eduardo dos Santos continua a fazer charme, desta vez convidou Durão
Barroso para o Planalto. Na Guiné, o único Planalto são as colinas de Boé, onde
nasceu a única Independência uni-lateral africana, exactamente sete meses antes
do 25 de Abril. E os angolanos vão dar-se boé da mal, se insistirem na
desaforada afronta: estão dispostos a sacrificar a MISSANG? E o exército português
estará mesmo disposto a cumprir ordens imbecis? Lamentável…
É que, da parte do Comando Militar, para além da humildade, dignidade e
bom senso que tem caracterizado a sua actuação, não duvidem da sua determinação
e capacidade para impedir a «internacionalização» da Guiné-Bissau: hoje poderia
ser muito bonito, mas amanhã? Quem deseja ver o seu (pequeno) país invadido por
uma mole dessas? Aliás, conforme já esclareceu o Comando Militar, através do
seu porta-voz, foi precisamente esse o único objectivo do «Golpe»; estas
movimentações vêm apenas confirmar a posteriori a veracidade das apreensões que
o motivaram, ou seja que o ex-Primeiro-Ministro, depois das várias intrigas que
promoveu, dos vários complots que dirigiu e assassinatos que comanditou, estava
a orquestrar uma invasão estrangeira do seu próprio país contra a sua
hierarquia castrense.
O PAIGC, pelos vistos, vai ter de mudar de nome, por contracção das siglas
para PAGA (Partido Africano da Guiné e Angola). Tirem Independência do nome do
Partido e depois então façam declarações irresponsáveis, pois ofenderam a
memória independentista da Amílcar Cabral, quando, num claro gesto de desafio
interno, ousaram apelar à invasão e agressão externas: é a dissolução de uma
grandiosa ideia; no entanto, antes a dissolução do Partido, que a do País. O
novo Presidente e ex-militante decerto poderá ajudar a esclarecer todas estas
questões, calmamente, claro, no quadro de um retorno à normalidade civil e no
contexto de inequívoca liberdade de imprensa, com a reabertura das rádios
(gostaria de acrescentar: «e com a devolução ao Aly do material apreendido»).
Paulo Portas, perdeu todo o contacto com a realidade e encontra-se em
plena espiral esquizofrénica: ameaça, tentando engrossar a voz de menina, a
torto e a direito, tudo e todos; julga que as palmadinhas nas costas que pelo
mundo fora lhe têm dado, «incentivando-o» a avançar, são outra coisa para além
de hipocrisia… Dom Filipe II de Espanha fartou-se de dar dessas palmadinhas ao
seu sobrinho D. Sebastião: «Queres levar a guerra para África? Vai, vai…».
Ninguém, pura e simplesmente, o leva a sério (mas também ninguém lhe vai dizer
isso). O facto indisfarçável é que não tem meios: os guineenses se for preciso,
aguentam mais de um ano a comer apenas um pouco de arroz, mancarra e banana; já
Portugal não tem orçamento que suporte um simples «bloqueio» do Porto de Bissau
por mais de um mês.
Engraçado é o resultado de uma hipotética comparação da Guiné com Angola:
se o que actualmente se passa na Guiné se passasse em Angola, já os portugueses
que lá moram estavam todos em campos de concentração… Isto apenas para que se dê mais valor
à presença lusa na Guiné e não seja um Ministro claramente doente que a desprestigie gratuitamente, pois tem pelo
menos cinquenta anos a mais que a amizade com todos os outros PALOP, já dura desde
Afonso o Africano, em meados do século XV! Os guineenses não são tão susceptíveis
quanto os angolanos, mostrando que ultrapassaram (melhor, que nunca foram
sujeitos) melhor os traumas do colonialismo; mas não lhes pisem os calos!
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