Como os «intransigentes» defensores da tolerância ZERO reconhecem, cada
vez mais pessoas na sociedade guineense começaram a perceber de que lado está o
interesse pátrio, passando a apoiar a Junta Militar. A atitude de Pascoal Correia
Alves, economista, cuja opinião o Aly acabou de publicar, insere-se nesse jogo
de apaziguamento e de redução das clivagens que o PAIGC e os seus esbirros têm
vindo a tentar agudizar. Engraçado é que todas as críticas se parecem centrar
no 7 de Junho, diabolizado como origem remota da actual situação, recorrendo ao
argumento que o sonho e a épica aventura que encarnou desiludiram depois toda a
gente na prática. Ora porque não colocar a questão ao contrário e pensar que a
Guiné, forte da sua experiência, saberá corrigir os erros do passado, arranjando
meios mais equilibrados, bem como étnica e religiosamente representativos, do que
uma democracia importada, sem correspondência com a realidade, e sobretudo propensa
a ser apropriada por qualquer um? Pascoal pergunta-se (e com razão) que sentido
faz este esticar da corda por parte do ex-PAIGC, esta sucessão de manifestos, esta
tentativa de irritação do povo contra as forças armadas republicanas? Essa
atitude, denuncia Pascoal, só poderá virar-se contra o povo, que é quem paga o
preço; haja bom senso, pede… Uma coisa boa nisto tudo é decerto a reflexão
política que este «golpe» já promoveu, claramente mais intensa que durante a
última e inacabada campanha eleitoral; reflexão política cuja necessidade
Pascoal também traduz bem no seu título: Vamos
pensar a Guiné-Bissau.
A confiança ganha-se. É o que está cada vez mais a acontecer: cada vez
mais gente confia na consistência deste Comando Militar, desprezando as
tentativas de intoxicação promovidas pela velha nomenclatura caduca. Mas
pensando a Guiné-Bissau, para fazer jus ao título de Pascoal, comece-se por
louvar a atitude discreta e proactiva de Serifo, Presidente da ANP, que aí tem precisamente
mantido acesa a chama da esperança no diálogo: primeiro nome apontado para
Presidente pelo CNT, preferiu declinar e manter uma certa distância, o que
manifestou a sua independência e lhe aumentou os créditos na bolsa de uma
futura solução (e irritando o ex-PAIGC: um partido extinto não pode tomar deliberações e o acto de retirada da confiança política é ineficaz em democracia, pois os visados não são obrigados a abandonar os cargos para os quais foram indigitados; quem retirou a confiança política foi o povo, ao PAIGC). No entanto, no momento actual, a
legitimidade passa pela situação de facto, ou seja pelo poder dos militares: há
que chamar os bois pelo nome, para quê disfarçar e vir a ser acusado de
hipocrisia? A transição pode perfeitamente ser assegurada por um Chefe de
Estado militar, que ouviria para as questões de governação tanto o Comando
Militar como o Conselho Nacional de Transição. No CNT, onde o Comando Militar
também poderia estar representado, poder-se-ia ensaiar uma diversificação da
sua representatividade, no sentido de incluir chefias religiosas, os mais
velhos e respeitados, representantes de ONG a actuar no terreno, etc, para além
dos já apontados partidos e organizações sindicais, sendo as suas sessões
abertas à Imprensa, de forma a permitir que todos os guineenses acompanhassem
os debates, num clima de saudável liberdade de expressão e de verdadeiro fórum de discussão dos problemas da Guiné-Bissau e não uma «bolsa» de emprego para desocupados e incompetentes. Faz lembrar Kikia Machu, o romance histórico de Filinto de Barros publicado pouco antes do 7 de Junho, pela boca de Joana, que mesmo emigrada respeita tradições: cumprindo o Choro de 'N Dingui, seu tio, recorda: «A ilusão da Independência durou muito pouco, esfumou-se nos discursos repetitivos dos novos senhores que tudo prometiam, mas nada de concreto acontecia. (...) no serviço reina a incompetência, os chefes percebem de tudo menos do assunto».
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