sábado, 22 de março de 2014

As várias leituras do caso Fambé

O espancamento de Mário Fambé é, sem dúvidas, um péssimo acontecimento, neste momento de arranque da campanha eleitoral. Sendo condenável a violência empregue contra o militante do PRS, o estranho é como alguns se apressaram a fazer um aproveitamento político, sem cuidarem (ou pior, omitindo) de saber outros elementos importantes para a análise do caso, como a circunstância de o visado ser militar (sendo-o no activo, estaria supostamente inibido pela Constituição de se envolver em política).

Foi o que se passou com a Liga (aliás, tem sido recorrente), cujo excesso de retórica reles parece visar, ao contrário do que afirma, a desestabilização do processo eleitoral em curso, chegando a comparar a situação em Bissau com o que acontece no Mali e pedindo a intervenção estrangeira, abordagem hiperbólica que indicia uma agenda preexistente, destinada a descredibilizar todo o processo de transição; o clima estava criado, o caso veio apenas «assentar que nem uma luva» no cenário já previamente traçado. 

Parece pura demagogia dizer que os sinais «indiciam fortemente a repetição dos cenários ocorridos em 2012, que culminaram com o golpe de estado de 12 de Abril»: esquecerá a Liga que quem organiza estas eleições são precisamente aqueles a quem chama «golpistas»? Que o «caso» Cadogo já vinha bem mais de trás do que o 12 de Abril? Não serão os mesmos que, ainda há pouco tempo, abusavam do mesmo discurso para afirmar que os militares obedeciam cegamente ao PRS? Afinal quem manda em quem?

Circulam, de qualquer forma, as versões mais desencontradas: ouviu-se de tudo. A alguns, que o General Injai mandara chamar o homem de mão do candidato presidencial do PRS para o convencer a desistir a favor de outro candidato (mas isso é apenas a recuperação de uma história mais antiga, que já tínhamos ouvido). Outra versão refere que Mário Fambé se terá «queimado», em conversa com outro militar, sugerindo que viria a ser Chefe de Estado Maior, se o candidato do PRS vencesse as eleições.

O Doka, decerto depois de utilizar os seus contactos, telefonando para Bissau, avançou com outra versão, da qual tanto se pode inferir que foi um acto de coragem do agredido, recusando intimidações; ou lido como uma provocação aos militares, por ter as «costas quentes» graças a uma suposta imunidade proto-parlamentar. Mas não deixa de ser preocupante que as Forças Armadas não façam imediatamente ouvir o seu Porta-Voz, para evitar especulações, sendo necessário recorrer a canais oficiosos.

Quanto ao agredido, desejo-lhe um rápido restabelecimento, para que o caso não venha manchar a «festa da democracia» (como alguém lhe chamou), possamos ouvir todas as versões do sucedido e apurar, calmamente e sem prejudicar o andamento do processo eleitoral, aquilo que realmente sucedeu. Mas sobretudo, evitar a repetição de mais acontecimentos do mesmo género, pretexto para tristes notícias e aproveitamentos baixos, desacreditando as Forças Armadas, o país, e a esperança no actual momento.

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