O Nigerian Tribune, diário de grande tiragem do maior país da África Ocidental, publicou uma entrevista realizada a Carmelita Pires, com alguns recados para Portugal. Transcrevo duas das perguntas às quais a candidata a Primeira-Ministra pelo PUSD respondeu:
«A apenas alguns dias das eleições, o Primeiro Ministro Português, Pedro Passos Coelho, falou sobre a implosão do Estado da Guiné-Bissau por causa do tráfico de drogas, foi criticado por muita gente, porquê?
A poucos dias da eleição, falar da "implosão do Estado da Guiné-Bissau por causa do tráfico de drogas" é totalmente desadequado. Como ex-ministra da Justiça, responsável pela luta contra o tráfico de drogas, estou excepcionalmente qualificada para o afirmar. Indo às urnas para escolher um novo governo e um novo presidente, investido de uma nova legitimidade acima de qualquer suspeita, este é um momento de esperança. É hora de levantar a cabeça. Uma palavra de incentivo teria sido mais apropriado. Ainda menos justificada neste contexto, é a manifestação portuguesa de interesse em participar numa missão da ONU. Portugal recusou tropas para a operação dessa organização na República Centroafricana. Esta oferta seletiva é bastante desapropriada. Falar sobre cooperação também parece ser um equívoco. Cooperação envolve duas vontades independentes e baseia-se num diálogo. A decisão de anunciar os detalhes de um programa de cooperação na ausência de autoridades legítimas, pode ser percebida como unilateral e prematura. Alguma prudência seria apreciada por parte da antiga potência colonial. Portugal tem vindo a assediar a Guiné-Bissau nos últimos dois anos. Agora está na altura de respeitar a vontade do povo, expressa pelo voto. Se for eleita, não vou tolerar ofensas contra a soberania, ou que menosprezem o meu país.
Há muitos portugueses no seu país, a Guiné-Bissau é uma ex-colónia de Portugal, esse país (Portugal) ainda demonstra um grande nível de envolvimento com a sua administração central, julga que isso continua a afetar a democracia interna? Como se propõe lidar com isso?
Os portugueses na Guiné-Bissau são nossos amigos, como ficou demonstrado, há dois anos, ao criticarem Portugal pela tentativa de "evacuar" os seus cidadãos, após o golpe (na realidade não passava de pretexto para uma eventual intervenção militar). Dos cerca de cinco mil portugueses no país, nem um único se dirigiu ao Consulado com esse fim. Esses portugueses não estão envolvidos na administração central, sendo, principalmente, comerciantes, agricultores e cooperantes, mas não têm quaisquer responsabilidades ao nível do estado. Infelizmente, o problema ocorreu há 40 anos, quando o país, ainda sem recursos humanos preparados para assumir os destinos da nação, rompeu com os quadros da administração colonial, promovendo pessoas mal preparadas e pessoal que estudara na antiga União Soviética, sem consistência ou criatividade para enfrentar os desafios e limitações no terreno, treinados para obedecer e não para pensar motivados pelas suas próprias cabeças ou para caminhar pelos seus próprios pés. Faço minhas as palavras de Amilcar Cabral, quando disse que "a nossa luta não é contra o povo português, mas contra o regime colonial." Hoje, somos contra a mentalidade neo-colonial nas relações bilaterais com o executivo de Portugal, o qual aliás tem sido bastante contestado internamente.»
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Há 1 hora
1 comentário:
Senhora Dra Carmelita Pires: permita-me manifestar todo o meu apreço pelo conteúdo desta entrevista. O Portugal colonizador foi vencido a 25.04.1974 e graças à luta conjunta das forças progressistas do povo português e dos povos das ex-colónias potuguesas 'em armas'. E fez muito bem em fazer lembrar, e com firmeza, ao primeiro ministro português que paternalismo é uma forma muito subtil de desrespeito. Povos amigos, SIM, MAS de igual para igual. Creia Dra Carmelita Pires na continuidade do meu profundo respeito e não menor admiração! A Guiné-Bissau começa a ter razões para acreditar.... Bem haja!
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