segunda-feira, 24 de fevereiro de 2025

Comunicado do MFDC



Comunicado do MFDC de Salif Sadio, intitulado


Acordo da vergonha assinado em papel higiénico


Este domingo, 23 de fevereiro de 2025, o primeiro-ministro senegalês, Ousmane Sonko, anunciou a assinatura de um ilusório acordo de paz entre o Senegal e o Movimento das Forças Democráticas de Casamança (MFDC). Este acordo, apresentado como um grande passo no sentido da resolução do conflito em Casamança, teria sido finalizado em Bissau, sob a égide do presidente guineense Umaro Sissoco Embaló. No entanto, por detrás das declarações triunfantes e dos apertos de mão formais, existe uma realidade muito mais sombria: um acordo sem legitimidade, assinado por interlocutores sem representatividade, e que corre o risco de perpetuar um ciclo de violência e de desconfiança.

Um acordo assinado com quem e para que fim?

O primeiro-ministro Ousmane Sonko saudou o acordo como um "grande passo em direção à paz duradoura em Casamança". Mas a questão mantém-se: com quem assinou o governo senegalês este acordo? Em 2022, sob o comando do ex-Presidente Macky Sall, foi assinado em Bissau um primeiro acordo com um grupo que afirma ser do MFDC, composto por Cesar Atoute Badiate, Rambo Bassène e Lansana Fabouré. Este grupo, alegadamente designado por "Comité Provisório das Alas Políticas e Combatentes do MFDC", não tinha nem tem qualquer legitimidade no terreno. Hoje, o governo de Bassirou Diomaye Faye parece estar a repetir os mesmos erros, ao assinar um novo acordo com interlocutores cuja representatividade é mais do que duvidosa.

Um líder independentista em Ziguinchor, declarou: "Vamos ser sérios! Todos aqueles que acompanham os acontecimentos em Casamança percebem a inutilidade de uma abordagem política à paz baseada em rios de dinheiro e em acordos de paz com pessoas insignificantes. A situação é tão grave e o descuido das novas autoridades tão flagrante que a paz não está no horizonte." 

Uma paz a duas velocidades

O governo senegalês parece acreditar que a paz pode ser comprada. Mas a paz não se resume a assinar documentos. Este acordo não parece cumprir nenhum dos requisitos de verdadeiras negociações de paz, após 43 anos de conflito armado imposto a Casamança. Esta passada em Bissau é o resultado de negociações opacas, conduzidas na sombra, sem a participação dos verdadeiros actores do conflito.

O MFDC, que luta pela independência de Casamança desde 1982, condenou esta abordagem. Para os separatistas, este acordo não é mais do que uma manobra política que visa legitimar um governo senegalês em busca de credibilidade internacional. "A paz não se constrói sobre mentiras e pretensões", disse um porta-voz do MFDC. "Não reconhecemos este acordo e continuaremos a nossa luta até que os nossos direitos à autodeterminação sejam respeitados."

O papel obscuro da Guiné-Bissau

A Guiné-Bissau, sob a presidência de Umaro Sissoco Embaló, desempenha um papel ambíguo neste processo. Apresentada como mediação neutra, a Guiné-Bissau parece, na verdade, servir os interesses do governo senegalês. Em 2022, já tinha facilitado a assinatura de um acordo falso com este mesmo grupo fantoche do MFDC. Hoje, está a repetir a mesma comédia, ao insistir uma plataforma para negociações que não têm qualquer hipótese de conduzir a uma paz sustentável e duradoura.

"Esta é a segunda vez que as partes em conflito assinam um acordo em Bissau, desde 2022", disse Umaro Sissoco Embaló. Mas esta repetição não é sinal de progresso. Pelo contrário, é a prova de que os mesmos erros são repetidamente cometidos. Como diz o ditado: "Só os tolos fazem a mesma coisa e esperam um resultado diferente."

Paz impossível sem justiça

Casamança merece mais do que acordos baratos: merece uma verdadeira paz, baseada na justiça e no respeito pelos direitos humanos. O governo senegalês deve parar de brincar com as esperanças do povo de Casamança e iniciar um diálogo sério com os verdadeiros representantes do MFDC. Sem esta, este acordo não passará de mais um capítulo numa já longa história de violência e desilusão.

Este acordo de paz assinado em Bissau não passa de uma farsa política: não resolverá nada e só piorará a situação, já de si explosiva. A paz em Casamança não pode assentar sobre mentiras e falsas premissas: deve ser o resultado de um diálogo inclusivo, transparente e que respeite as legítimas aspirações das populações. À falta disso, Casamança não deixará de sofrer e a paz continuará a ser uma miragem.


PS Comentário anota que não se assiste à assinatura de qualquer documento no vídeo divulgado sobre o evento.

sábado, 22 de fevereiro de 2025

A verdade nua e crua

Àcerca da absoluta necessidade da recomposição acelerada das elites nacionais, transcrevemos o texto do Coronel Matos Gomes, ribatejano, que fez o Liceu em Tomar, várias vezes condecorado, ferido em combate, participou em várias operações especiais, como Ametista Real, na Guiné, onde se encontrava à data do 25 de Abril, pertencia à estrutura do MFA, amigo pessoal de Salgueiro Maia e Capitão de Abril.


O esplendor da oligarquia

(in Medium.com, 15/02/2025, Revisão da Estátua de Sal)


O discurso do vice presidente dos Estados Unidos, J..D Vance, na Conferência de Segurança realizada em Munique, na semana de 10 a 15 de Fevereiro é uma extraordinária lição de política. Independentemente do que cada um possa pensar de J.D. Vance, ou de Trump, ou dos EUA, ou da Rússia, o discurso do vice-presidente dos EUA apresenta os fundamentos da prática política dos Estados Unidos desde a sua fundação: o poder assenta na força dos fortes e é essa força que permite apresentar os poderosos como virtuosos. Maquiavel afirmou o mesmo. Os europeus praticaram estes princípios até à Segunda Guerra Mundial, que colocou um fim no colonialismo e na falácia da missão civilizadora do Ocidente.

J. D. Vance foi a Munique afirmar o princípio da força como fundamento do poder, o princípio da unidade do poder e negar as bem-intencionadas teses da divisão tripartida dos poderes, executivo, legislativo e judicial de Montesquieu. O vice presidente dos EUA foi a Munique expor a realidade em que assenta o poder nos Estados Unidos: a lei dos xerifes do Oeste: a lei sou eu e o meu revólver. Os poderes tradicionais e os não tradicionais devem estar submetidos ao detentor do poder executivo. J. D. Vance explicou que o êxito dos Estados Unidos e a vitória de Trump resultam do facto de o poder ser exercido por uma conjugação de tirania e oligarquia, na classificação de modos de governo estabelecido por Platão em República.

Perante uma assembleia de funcionários políticos europeus (raros políticos eleitos), o vice-presidente dos EUA afirmou que o governo de Trump respeita a hierarquia de Platão, de que a oligarquia é preferível à democracia, que durante milénios foi eficaz para os poderosos exercerem o seu poder e gozarem os seus privilégios, que a oligarquia constitui o único sistema de governo, e que aquilo que atualmente (desde o final da Segunda Guerra Mundial) é designado por “democracias” são versões de oligarquias adaptadas aos meios para as legitimar.

A versão de poder de Trump apresentada por J.D Vance em Munique pode ser traduzida com uma adaptação da conhecida frase de Eça de Queiroz: “a nudez crua da verdade do poder da oligarquia sem o manto diáfano da fantasia das instituições reguladoras“.

J. D. Vance afirmou na cara dos atónitos funcionários políticos europeus reunidos em Munique que o perigo para a Europa se encontra no seu interior, na falsidade em que os políticos assentam os seus princípios, na distância entre as afirmações e a prática dos políticos europeus, na fraqueza do poder político quer na União Europeia quer nos seus Estados nacionais, e daí, a perceção da fraqueza dos seus dirigentes e a busca de novas formas de participação dos povos no seu governo, que os funcionários (sempre muito moderados) se apressam a classificar de extremistas e radicais.

Quanto à política global, J.D. Vance deixou claro que quem define as relações de poder no mundo atual são as oligarquias dos Estados Unidos, da Rússia e da China porque são estas que dominam os circuitos do dinheiro, das matérias-primas, das tecnologias e da força armada, são elas que decidem a guerra e a paz, quem paga as contas e quem recolhe os lucros.

Do ponto de vista do amor-próprio é compreensível que as várias correntes do pensamento político europeu tenham silenciado que a decadência, ou a irrelevância da Europa, no atual cenário mundial tem como causa a incapacidade de esta ter gerado, ou mantido, ou reconstituído as suas oligarquias após a derrota da Segunda Guerra Mundial.

Não é popular defender a oligarquia e os oligarcas (daí que a comunicação de massas ocidental reserve o termo para os adversários — oligarca é sempre russo, enquanto os oligarcas norte-americanos são bilionários), mas a verdade é que, até à Primeira Grande Guerra, a Europa foi governada por oligarquias aristocráticas, monarquias mais ou menos autoritárias e que no período entre guerras a Europa conseguiu manter os seus governos oligárquicos, extraídos, ou gerados pelas industrias das novas tecnologias, em particular pela motorização, automóveis e aviões, pela química, pela energia (petróleo), transportes e eletrónica, tendo no topo a oligarquia financeira. Mas, um dos resultados da Segunda Guerra, foi a extinção dos oligarcas europeus.

As oligarquias europeias foram aniquiladas e a reconstrução europeia foi efetuada a partir dos Estados Unidos, com o plano Marshall, que colocou o poder da Europa nas mãos de burocratas de confiança. São os descendentes desses burocratas ao serviço dos EUA que se encontram hoje na direção política dos estados europeus, personagens que recebem um salário para administrar os Estados nacionais e a União Europeia, empresas que funcionam por rotina.

São esses descendentes que ainda vivem na guerra fria que ficaram atordoados com o discurso de J D Vance, Entretanto, quer a União Soviética, quer a China constituíam novas representações políticas e novas classes de empreendedores através dos partidos comunistas e introduziram a noção de competitividade, responsabilidade, prémio, castigo, incentivo que promoveram o aparecimento de oligarcas de grande sucesso.

A aparentemente irreversível irrelevância da Europa resulta em primeiro lugar da incapacidade de reconstituir as suas oligarquias no pós Segunda Guerra, de recriar oligarquias empreendedoras, autónomas, audaciosas. E esta incapacidade inclui também e em boa parte o mundo do trabalho — sindicatos e corporações — que em vez de disputarem o poder reclamam a proteção do Estado burocrático.

Independentemente do que cada um possa pensar de J D Vance, o que ele deixou claro na conferência de Munique foi que os Estados Unidos têm um sistema político que permite que o poder seja exercido por um macho dominante e que a Europa tem um sistema político com uma hierarquia que não se distingue da que existe num aviário.

Olhamos para as fotografias do chanceler Sholz (a quem J.D Vance negou um encontro de circunstância com a rude justificação que ele será chanceler por pouco tempo), de Macron, de Von der Leyen, de Kallas, de Mark Rutte, o atual cabo da guarda da NATO e o que vemos é um grupo de estarolas que não inspira confiança sequer para atravessar uma rua, mesmo durante o dia e com os semáforos a funcionar.

Alguém acredita que este painel de burocratas seja capaz de enfrentar os oligarcas norte americanos, russos ou chineses, que algum deles vá morrer onde for preciso combater os oligarcas russos e defender o “democrata” Zelenski, exceto o almirante Gouveia e Melo, o general Isidro e o burocrata Mark Rutte?

Por muito que nos desagrade, enquanto europeus, ouvir afirmações e interpretações duras atiradas como pedras, após a derrota da Segunda Guerra Mundial, a Europa optou por ser um navio de cruzeiros em vez de um navio de batalha. A pergunta a fazer aos inabaláveis e vocais defensores de apoio à Ucrânia até à derrota final e custe o custar é como transformar um hotel flutuante num couraçado, como substituir piscinas e jacuzzis por rampas de mísseis, empregados de camarote por artilheiros.

O choque das conclusões do encontro de Munique não resulta da explicação dos fundamentos do poder nos EUA feita por JD Vance e transmitida em estilo de sargento dos marines aos recrutas, mas da insanidade dos líderes europeus em responder que vão gastar 5% dos seus orçamentos a comprar equipamento militar aos EUA para se defenderem da Rússia, que passou a ser considerada por aqueles como um dos vértices do novo poder mundial! No momento em que os Estados Unidos reconhecem a Rússia e a China como competidores e vértices do triângulo do poder mundial, e não como inimigos com quem seja estrategicamente vantajoso desencadear um confronto armado, os burocratas europeus propõem comprar armas e tecnologias aos Estados Unidos para se defenderem de uma superpotência que considera a Europa um saco de gatos que se anularão em guerras entre si. É a análise que a Rússia faz da Europa, daí a irracionalidade, para não lhe dar o qualificativo adequado de estupidez dos analistas cujo pensamento foi magistralmente resumido pela doutora Ana Gomes: temos de nos defender dos russos porque se não o fizermos eles “vêm por aí abaixo”!

O discurso de António Costa a repetir o apoio “inabalável” da Europa à Ucrânia é um texto na linha dos argumentos de Ana Gomes, dos tempos da guerra fria, fora de tempo, é um triste exemplo de um padre que entra numa missa pós concílio Vaticano II a proferir um sermão em latim e a fazer esconjuros, perante a estupefação dos fiéis. Bastava-lhe representar o papel do croupier e anunciar: les jeux sont faits!

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2025

Cego no observatório

O doutor Có anda por aí, armado em esperto, a alarmar recorrentemente a população com inexoráveis profecias totalitárias sobre a decadência e desgraça da juventude guineense (até lhe fixa o prazo em cinco anos para se dar ares de agenda 2030). Num país com dois terços de muçulmanos, para quem o álcool é a pior das drogas, pretende fazer do quadro legal pedagogia, apesar da manifesta contradição com os usos e costumes. Se tivesse um olho, faria um pequeno inquérito junto dos jovens, tiraria umas conclusões apressadas e forçadas, mas pelo menos teria um pretexto para a exposição pública, para além da sua própria estupidez natural de pseudo-assimilado e hipocrisia sem limites de complexado, ao serviço da alienação internacional. Se tivesse dois olhos, escolheria uma ou duas bancadas de fumo (os antros de perdição que se limita a imaginar) e acabaria por perceber que “ganza”, ao contrário do que pensa, não é uma droga diferente de haxixe ou liamba, mas sim um sinónimo para as duas, enroladas com tabaco para serem fumadas; perceberia também que “blota” (importado do calão tóxico tuga "bolota" para variante mais oleosa) não passa de haxixe também (e portanto de origem natural), e não algo parecido com MD; aprenderia também a não misturar alhos com bugalhos, colocando tudo no mesmo saco. O pior é que, se o fizesse, acabaria por perceber que nessas bancadas, cujos jovens diaboliza, os há muito mais djiros (e giros) do que ele… Não tardaria a fumar para esquecer, só que teria de trocar o nome à “instituição” para “laboratório experimental” ou, talvez, fumatório. Mantendo-se assim, sobrará apenas o eco de si mantenhas.

Musketeiro do Rei do Mundo

Agora que foi nomeado Vice-Presidente executivo para todo o serviço (foi o próprio presidente dos Estados Unidos que sugeriu para lhe chamarmos o que quiséssemos), poderia muito bem aproveitar o élan e cumprir com os seus manifestos, em especial o de liberalizar a cocaína. Muito melhor ideia do que redireccionar os drones para os quartéis dos cartéis. São dois coelhos de uma cajadada… acaba-se com o grande crime organizado na América do Norte, liberta-se a do Sul da tragédia desse estigma. O exemplo da Lei Seca é mais do que concludente. 

Disseminação orgânica

Na segunda deliberação deste ano da Comissão Permanente, nota-se (logo no primeiro parágrafo), em relação à primeira, um meritório esforço de articulação do Regimento (omisso quanto à convocatória e funcionamento da Comissão Permanente) com a Constituição, por referência à Mesa. 

Contudo, ainda na primeira página, podemos ler, no fim do penúltimo parágrafo: "não se conhece qualquer intenção de auscultação aos órgãos constitucionais legítimos, tais como a Assembleia Nacional Popular e o seu Presidente".

Órgãos?? ANP "e" DSP??? DSP é o órgão do órgão? Mas então esqueceram-se do órgão de DSP. Já são três. Se contratarem alguém para tocar a concertina, perdão, o órgão, serão quatro. Se continuam a multiplicar-se assim, dão origem a uma pandemia… ou será orgia?

Actos preparatórios

Regime aborta golpe de Estado, graças à interrupção tempestiva de cerimónia mágica propiciatória. Pretensamente em proveniência da Guiné-Conacri, onde supostamente não toleraram a instalação, o promotor da proto-conspiração, deputado europeu à ANP, apanhado em flagrante, já foi, entretanto, e possivelmente por sábio conselho do Eliseu, libertado. 

Fumo branco

Aquele que ousou usurpar o nome, sem razão que lhe ASSIStisse, traiu o Espírito Santo. Na Igreja de São Pedro, sempre matámos muito higiénica e eugenicamente os nossos Papas, quando se tornavam demasiado senis ou caquéticos para o ofício, ou simplesmente incómodos, uns carinhosamente abafados sob a almofada de veludo escalarte, outros subtil ou contundentemente envenenados consoante os pecados que lhes eram apontados, outros vítimas de acidentes convenientes, estilo o ruir de paredes (de tectos, talvez pudéssemos acreditar...). Agora, pelo contrário, estão preocupados em prolongar artificialmente a vida ao anti-papa. Bento XVI (que tarde demais se apercebeu da verdadeira face do impostor) invocou o grande Celestino V (não confundir com o tristemente célebre Clemente V, criminoso que morreu por maldição) como precedente para desnecessária abdicação, escamoteando a substancial diferença de nesse caso ter acontecido sob coacção e não por livre arbítrio, acabando por influenciar o Colégio, prevalecendo sobre o Espírito. A sua grandeza foi pretender humilhar-se, quase um mea culpa pela sua louvável resiliência reaccionária, que muitos consideraram obsoleta, mas que, pelo contrário, era antes anunciadora de nova era. Virar o bico ao prego, nessas condições, parece tão ingrato por extemporâneo quanto o pretenso suicídio do Almirante Reis. A intenção era boa e o Inferno não é para aqui chamado. Mas há males que vêm por bem. O Espírito Santo já decidiu e em Roma já há consenso: o usurpador assistiu à missa do Papa. Após um curto interregno de fumo preto, que se seguiu à morte do Cardeal José, sucede o Cardeal José. O patrónimo é garante da continuidade da família de Jesus. Nunca existiu nenhum Papa chamado Francisco.

sábado, 8 de fevereiro de 2025

Escurecimento

Esclarecimento, não é. O anexo à resolução da ANP é um atabalhoado enlatado PAIGC de má qualidade. Pelos vistos, o presidente do órgão continua a julgar que este é uma simples extensão dos seus desejos. Não esclarece, pelo contrário, amplifica a contradição. A solução, de considerar o ano "móvel", para combater a expressão "do ano correspondente", é simplesmente patética. A imposição de tal contra-entendimento, irrelevante para o status quo, é um atestado de incompetência à própria ANP, instrumentalizada sem discussão, para cumprimento da agenda política de DSP, demitindo-se das suas funções de representação. É ridículo que a Comissão Permanente, erradamente convocada na forma regimental de Mesa, tente afirmar o seu poder legislativo através de instrumento desadequado, a resolução, quando só uma Lei votada pelo Plenário teria essa força. Mas para coisas mais importantes, claro. O líder do PAIGC esvaziou por inteiro a ANP das funções soberanas que lhe são cometidas pelo artigo 2º da Constituição, reduzindo-a a caixa de ressonância da propaganda ressabiada dos novos combatentes da liberdade da Pátria. É caso para dizer "Pior a emenda que o soneto".

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2025

Revelação

José Manuel Correia Pinto, na página 505 dos Anais do CMN, aponta "Constou com grande insistência em Bissau, e isso posso testemunhar pessoalmente, que Alpoim Calvão entrou na Guiné, por Bissau, entre o Natal de 1972 e a passagem do ano, e que se deslocou a Pirada, tendo-se perdido o seu rasto a partir daí, tanto mais que não haveria registos do seu regresso a Lisboa por Bissalanca."


Atendendo ao reconhecimento pelo próprio de ter "inferido" das ordens trocadas o objectivo de “capturar e eventualmente assassinar Amílcar Cabral” na operação Mar Verde, nota-se que confunde propositadamente o objectivo Sekou Touré com o de Amílcar Cabral; a própria forma da expressão e ordem de apresentação, diz tudo àcerca das intenções desde cedo alimentadas pelo autor.

As ordens de Spínola distinguiam Sekou Touré, para matar, de Amílcar, para capturar VIVO. No desaguisado que se seguiu no Estado Maior, com o General a acusar o Comandante de ter concebido o ataque político como um golpe de mão, essa razão pode também ter pesado: Amílcar Cabral para nada servia morto ao General Spínola. A abordagem não fôra a melhor.

Segundo o Director da PIDE, o assassinato teria sido uma "bavure", estando previsto "apenas" capturá-lo. Ora se havia alguém que não alimentava ilusões, era o próprio Alpoim, ao profetizar, antes da passagem do ano, que "Com um pouco de sorte, em finais de Janeiro (Amílcar) estará morto". Na sua biografia autorizada, não é feita referência a essa passagem clandestina por Bissau.

Já agora, Alpoim foi a Pirada visitar Mário Soares, cuja filha estava em Londres em apoio à missão de intoxicar Sekou Touré com as negociações Amílcar / Senghor / Spínola. Em Setembro de 1974, quando deveria ser o homem mais odiado (promotor da operação Mar Verde), entra no Palácio Presidencial para resgatar do fuzilamento esse agente duplo, debaixo das barbas de Luís Cabral.

Quando o General Spínola apertou com Fragoso Allas, depois da morte de Cabral (com quem estaria quando recebeu a notícia, tendo exclamado "Agora é que estamos tramados"), para lhe arranjar um contacto com a nova direcção do PAIGC, este fez-se rogado e acabou por declinar Nino, a quem todos os caminhos íam dar. Alpoim viria a tornar-se grande amigo de Nino e da Guiné-Bissau.

Estaria Spínola ao corrente das movimentações de Alpoim e dos desenvolvimentos da operação Dragão Marinho? Se foi reprimido pelo General no Estado-Maior, Alpoim ganhou o respeito de Monsieur Françafrique, Jacques Foccart, para quem a recusa de Sekou Touré a de Gaulle ainda doía. Daí a cooperação internacional da DGS, com Barbieri Cardoso a seguir para Paris.

Curiosamente, esta pista viria, por associação de ideias e de procedimentos ao assassinato do General Humberto Delgado, a intoxicar Bruno Crimi, no seu segundo artigo sobre a morte de Cabral, dois anos depois do primeiro, saído pouco mais de uma semana após o assassinato, dando origem a uma tese especulativa que prejudica claramente o trabalho jornalístico.

Alpoim movimentava-se com extremo à vontade, tinha cobertura no seio da Marinha, viajando sob disfarce de Capelão da Armada. Todo o sistema de informações militares tinha a sua marca. Por essa altura, era um Quase-Deus para os Serviços Secretos franceses, por isso não teria qualquer dificuldade em atravessar a fronteira e apanhar o avião do lado de lá, para França.

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2025

Mais África que toda a África

Segundo o Capitão-de-Mar-e-Guerra Mário Alvarenga Rua, na página 288 dos Anais do Clube Militar Naval recentemente publicados (e que são um verdadeiro documento histórico), esta era uma descrição popular da Guiné, no Portugal dos finais dos anos 60. 


Num exclusivo 7ze, com o patrocínio da SensiData, sociedade de estatística de direito guineense, apresenta-se graficamente a glória da epopeia de Cabral, traduzida em números, com dados oficiais das Forças Armadas portuguesas quanto aos seus efectivos (metropolitanos e africanos) comparativamente aos dois outros teatros operacionais de Angola e Moçambique, relacionando-os com a sua área geográfica e população, esta reportada aos Censos de 1960. 


Os Anais do Clube Militar Naval, sob a coordenação do Capitão-de-Mar-e-Guerra Alcindo Ferreira da Silva, Comandante do DFE8 (Guiné, 1971-73), para além da relevância da Marinha para o 25 de Abril e para o PREC, vêm confirmar abundantemente a tese de que os portugueses devem a sua revolução ao impacto de Amílcar.

PS Nenhumas Forças Armadas apreciam perder a guerra. O General Spínola foi de férias e não voltou...

Vaca gorda

Agora que a ANP parece ter acordado, bem tardiamente, para a vida, assumindo publicamente a imaterialização do espaço e a legitimidade da reunião virtual (decerto em Regulamento a aprovar), para além de evitar partes gagas como "os (membros) da Comissão Permanente", o Presidente da Mesa deve ser consistente e respeitar o disposto no Regimento, cujo artigo invocado se encontra articulado em ordem à Mesa e não à Comissão Permanente (a qual está fora do prazo de validade, tanto tempo passado a evitar convocá-la para não reconhecer a dissolução e para além disso faz lembrar o precedente de usurpação Cassamá, que entretanto fez escola junto de titulares de órgãos colegiais), conforme dá a entender a Convocatória apressadamente publicitada. Por uma questão de coerência e legitimidade, assumida a possibilidade de reunião virtual e ser esta extensível ao Plenário, realmente soberano como órgão colegial, deveria igualmente respeitar procedimentos e prazos estabelecidos no mesmo Regimento para a sua convocação. A dissolução não era inexistente? O carácter público e a retransmissão em directo já estão devidamente acautelados na legislação. Contudo, a proposta de ordem do dia, a qual parece pouco ambiciosa ou mesmo irrelevante, atendendo às funções de órgão legislativo e fiscalizador, talvez possa vir a ser alterada pela Comissão Permanente ou mesmo pelo Plenário, que é soberano.

terça-feira, 4 de fevereiro de 2025

Preterição desculpante

Houve preterição de formalidades essenciais na investidura do Presidente da República? Onde está o auto assinado pelos dois? O Supremo descolegializado está a tomar conhecimento? Não deveria deduzir algo? Anular o mandato a posteriori, é pura e simplemente surreal. Se não havia mandato, o que é que o actual titular do mandato andou a fazer, do dia 27 de Fevereiro ao dia 3 de Setembro de 2020? A fundamentação passou a ser uma colectânea de palpites esparsos, com terríveis saltos no escuro. Num excesso de zelo perfeitamente injustificável perante a legitimidade formal da marcação das eleições para fins de Outubro a fins de Novembro, consagrada pelo ponto 2 do artigo 3º da Lei Eleitoral e abençoada a anteriori por constitucionalista português (altamente volátil, mas enfim), estranha-se a iniciativa para tal desnecessário esclarecimento ou aclaração, que expuseram o subscritor, na veste de Tribunal Constitucional, à prática, condenada pelo ordenamento jurídico guineense, de actos inúteis. Mas pior que a inutilidade e a articulação ambígua (nº 2 de que artigo da CRGB? do 2º de certeza que não é) é a cominação "legal" sobre um órgão de soberania, neste caso, ameaça à Presidência da República, colocando-se num plano de superioridade institucional, atitude perfeitamente injustificada e ilegítima (pelo menos na ausência de legítimo Plenário).

"Cargo que deve exercer até à tomada de posse do novo Presidente eleito, nos termos do Nº 2, in fine, a fortiori, da Constituição da República, sob cominação legal (...)"

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2025

Questão de subsistência

Se o deputado remanesce à própria dissolução (seja esta existente ou não), ao abrigo do ponto 2 do artigo 94.º da Constituição (ainda supostamente em pé, apesar da violação colectiva), com respaldo no ponto 1 do artigo 7.º do Regimento da ANP, o qual, em vez de fixar a duração do mandato dos deputados (a Constituição não o fixa explicitamente tal como é feito para presidente em cinco anos, mas fá-lo implicitamente no artigo 79.º pela fixação da duração da legislatura em quatro anos), prefere estendê-la explicitamente à primeira reunião da nova legislatura, princípio extensível à Mesa pelo artigo 35.º; ou seja, trata-se de um princípio implícito, comum a organizações, associações, sindicatos, cuja expressão mais simples é: "os titulares mantêm-se nos cargos até à tomada de posse dos seus sucessores". Contudo, eis que reentra em cena o titular do órgão supremo legislativo e fiscalizador, armado com o seu vaccuumficador, para contra-aterrorizar o verdadeiro detentor da soberania. Alguém me disse que as munições estão chochas e as tropas desmoralizadas, mas se calhar não é verdade.

Sede Vacante

Em caso de vacatura no Vaticano, a sede fica vacante até à reunião do Plenário com capacidade eleitoral. Apesar do mutismo a que a ANP se remeteu, tanto Plenário como Comissão Permanente, o titular remanescente do órgão em vias de extinção, vem pessoal e pouco institucionalmente colocar-se à disposição da nação que já lhe disse que não... ainda para mais quem criou o problema e não o soube resolver? decerto esqueceu que, na boa tradição guineense, lembrada por Serifo Nhamadjo, o "presidente" de transição (sim, pois trata-se de um golpe) não tem capacidade eleitoral passiva para as presidenciais seguintes: terá de ficar pouco activamente a ver passar as caravanas; o que é pouco consistente com todo o seu percurso anterior. O lema parece ter passado a ser "se não os podes vencer, faz pior do que eles"! 


PS O diagnóstico mantém-se: excesso de água benta.

A vaca turra

Os turras tinham uma bela manada de vacas na bolanha. Todas gordas e bem nutridas. Todas? Bem... nem todas. Havia uma pobre, coitada, enfezada e subnutrida, quase esquelética. Certo dia, o chefe dos turras decidiu-se a dedicar uma vaca em sacrifício às suas aspirações políticas. Contudo, oferecer a pior vaca é pior ofensa que roubar uma vaca. Tanta vaca, pouca vaca. Muita parra... 

domingo, 2 de fevereiro de 2025

30 de Fevereiro (+ ou - 10%)

Há uns meses, quando o PAIGC esboçou a intenção de vir a usar o dia 27 de Fevereiro como abcesso de fixação (esquecendo com demasiada facilidade a palhaçada que montaram a 29 desse ano bissexto), este blog dedicou-se à arqueologia legislativa. Ler aqui I e II 


Conscientes da fragilidade e inconsistência da tese, introduzem agora o artigo 186º, que remete para a ANP dúvidas e casos omissos. Está implícito no ordenamento jurídico o princípio "in dubio pro reo": entre duas leis, a mais favorável. Na dúvida, não é prá ANP, é pró réu.

O trunfo na manga rabo na boca articulação residual, como dispositivo golpista com base em lei ordinária, surge associado à auto-proclamação, num déjà vu Cassamá, mas assenta infelizmente numa premissa chocha. Com tanta matéria, vão logo escolher a ponta errada...

O principal responsável pelo deslize que conduziu à actual situação está com um problema de foco: concentra-se no acessório, distraindo-se do essencial. Para os meros observadores, não tomar a nuvem por Juno pode configurar conselho prudente e bem informado.