quinta-feira, 18 de julho de 2024

Fake-buster

Na continuação do artigo anterior, voltamos à carga, conforme prometido.

Em primeiro lugar, acrescentando que nem sequer é nova, a polémica em torno da incoerência entre o artigo 3º e 185º da mesma Lei Eleitoral (nº3/1998, alterada 15 anos depois pela nº10/2013), pois em 2019 passou-se exactamente a mesma coisa. Aliás, o dia marcado para as eleições foi exactamente o mesmo, 24 de Novembro! Pelos vistos, DSP não aprende com os erros...

Recuando uma década, o relatório da Missão de Observação Eleitoral da União Europeia às eleições de 2009, já apontava o problema, na página 12:

«O enquadramento legal não é bem sucedido em certos aspectos por falta de detalhe nas suas cláusulas e revela incongruências, tais como no que se refere ao calendário para a realização de eleições legislativas e presidenciais. Órgãos soberanos, como a Presidência da República e a Assembleia Nacional Popular, com cinco e quatro anos de mandato respectivamente, deveriam ser eleitos dentro de um período de tempo razoável antes do fim dos respectivos mandatos. A Lei Eleitoral (Artigo 185) determina que o Presidente da República deverá tomar posse no último dia de exercício do mandato do seu antecessor, o que faz prever um calendário para as eleições presidenciais no prazo do respectivo mandato. Esta cláusula, no entanto, está em contradição com o Artigo 3, que estipula que as eleições presidenciais e legislativas devem ser realizadas no ano correspondente ao termo da legislatura e do mandato presidencial, entre 23 de Outubro e 25 de Novembro.»

Esclarecido o assunto das presidenciais, tratemos agora das legistativas.

Interessante, é que as observações da Missão da UE deram aso a que se preparasse, nesse mesmo ano de 2009, uma proposta de alteração da Lei Eleitoral 



(não sabemos de quem era a iniciativa, nem se chegou sequer a ser apresentada, discutida ou votada) a qual acrescentava ao artigo 3º um terceiro ponto, cuja redacção era a seguinte:

«Em caso da morte, renúncia e incapacidade do Presidente da República ou da dissolução da ANP, as eleições devem ter lugar no prazo máximo de 90 dias.»

Ora esta alteração só se justificaria (e teria sido muito útil para evitar a actual confusão) em relação às legislativas, já que em relação às presidenciais introduziria nova incongruência com o estipulado no ponto 3 do artigo 71º da Constituição, o qual aponta 60 dias em vez desses 90, prevalecendo obviamente por ser de ordem superior. Conforme assinalámos no artigo anterior, a Constituição guineense, cópia adulterada (por alguns vendilhões constitucionalistas ao estilo Jorge Bacelar Gouveia) da portuguesa, omite o prazo para as legislativas: uma grave lacuna, num apagão que se suspeita intencional.

Mas chegando finalmente onde queremos...

Portanto, a Lei Magna prevê um prazo para marcação das eleições presidenciais, caso por alguma razão o Presidente em exercício não conclua o seu mandato, mas o mesmo não acontece para a Assembleia Nacional Popular, que não possui nenhuma disposição semelhante para o caso de dissolução antes do fim da Legislatura.

Contudo, quem leia agências noticiosas estatais como a VOA, a DW ou a LUSA, consome fakes, já que estas não se dão ao trabalho de verificar aquilo que afirmam. Há bastantes casos em que reproduzem apenas falsidades entre aspas, mas vamos cingir-nos àqueles em que as afirmações são da sua lavra.

A VOA chega a fazer título do boato, ou a apresentá-lo como conclusão (e ainda é descaradamente plagiada pela e-Global, se não foi o inverso que se passou). A DW repassa acriticamente a LUSA, que inventa não um prazo, mas que o acto de dissolução da Assembleia deve ser acompanhado de marcação da data das eleições.

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