Face à auto-exclusão dos maiores partidos em relação ao processo, depois de terem assinado e validado o Pacto de Transição, envolvendo pequenos partidos e sociedade civil, parece perfilar-se a hipótese de um governo de iniciativa presidencial de raiz, atendendo à patente inclinação do presidente para uma composição em termos exclusivamente técnicos.
As virtudes esperadas em relação a essa opção não cabem em cinco meses. Um bom «tecnocrata» precisa de algum tempo para se inteirar da situação, para gizar um plano, para recensear e «apalpar» os recursos disponíveis, para inventar novos recursos, para mobilizar as pessoas para os objectivos definidos. Diz o ditado que Roma e Pavia não se fizeram num dia.
Um «bom» tecnocrata não aceita um desafio limitado e com probabilidades nulas de sucesso. Se, mais que uma saída conjuntural para o actual impasse, se procuram realmente soluções duradouras, aproveitando decididamente o actual momento que para esse efeito pode revelar-se propício, há que encontrar novas fórmulas de decisão nos instrumentos em vigor.
Admitida a sobreposição à constituição do Pacto de Transição, não se compreende que os dois maiores partidos continuem a insistir em «puxar a brasa à sua sardinha». Tratando-se, como insistentemente propagam, de um pretenso governo «inclusivo», torna-se suspeita a sua atitude. Mas acaba por ser útil, evidenciando a necessidade de uma clarificação.
Os dois maiores partidos, agora unidos numa frente comum contra a vontade popular, pretendem bloquear as reformas que há muito a Guiné necessita desesperadamente, pois uma tal decisão afecta os interesses e expectativas interesseiras e «culturais» dos seus filiados, utilizando para isso uma maioria totalitária na ANP, baseada num mandato que já expirou há muito.
Há que quebrar esse vínculo dissonante e corruptor, abstraindo o Governo da influência decisória dos partidos, noutras esferas que não a simples fiscalização. Um Pacto de Regime poderia consistir num contrato desse género: os Partidos seriam reservatórios de «mão-de-obra» política, mas a escolha seria efectuada autónoma e independentemente pelos técnicos do Governo.
O prazo estipulado para um roteiro de transição sério, deveria incluir uma fase de diagnóstico, seguida de outra de projecto, finalizando numa implementação continuada e consistente. Um governo que não esteja dependente dos Partidos, com legitimidade técnica, sob a protecção de umas Forças Armadas garantindo a defesa da soberania nacional, representaria uma garantia de estabilidade.
Caso a ANP não concorde com a solução avançada pelo Presidente, no sentido de resolver a actual situação de «calamidade política» (que, segundo a alínea primeira do artigo 31 da Constituição, poderá até ditar a sua dissolução), poderá sempre, utilizando as suas prerrogativas constitucionais, sujeitar a referendo a proposta em causa, apelando à sua rejeição nas urnas.
Há 3 minutos
6 comentários:
De que vontade popular se refere o Sr.?
Sabia a V. Excia. que a vontade popular dos Guineenses é representada pelos dois partidos que o Sr. referiu?
Esse mandato terminou e a vontade popular evolui. Quer saber? Pergunte hoje, em Bissau, à primeira pessoa que encontrar na rua. À ANP, se tiver uma reacção idêntica à sua, resta-lhe a democrática opção de uma consulta a essa vontade. Não estamos a falar de eleições, mas da opinião em relação a uma alteração maior do quadro institucional, quebrando com o ritmo e a rotina habituais de «apropriação» do Estado, cujos resultados, nas últimas quatro décadas, estão à vista de toda a gente. Talvez a opinião pública esteja hoje melhor informada quanto ao que está em jogo. E a vontade popular, como institui a Constituição, pode ser expressa directamente, com precedência sobre a «legitimidade» dos órgãos de soberania. A vontade popular não se faz representar, exerce-se. Já a única coisa que esses deputados representam, é a caducidade de todo um sistema de validação da hipocrisia para inglês ver, associado à desgraça do chão e das gentes.
Não so falo da ANP, a vontade popular dos Guineenses todos nos sabemos qual é. Um governo formado por PAIGC, PRS e restantes partidos com assento parlamentar não com pequenos partidos sem expressão nenhuma, sem sede e muitas das vezes so tem uma pessoa ou o marido e a mulher.
Que se faça um referendo hoje vais ficar surpreso com a opinião porque vejo que não muito conhecedor da realidade Guineense.
Um forte abraco
Talvez seja melhor não responder, para não «espantar» a caça. É um bom desafio para a ANP, esse teste à vontade popular. Perguntar-se-ia portanto: Concorda com um governo de tecnocratas por um período de cinco anos? E o povo responderia em massa, na sua opinião, que não. Só vendo os resultados do referendo.
Façam eleições hoje,amanhã ou quando quiserem que o paigc e o prs sairão sempre como partidos mais votados. Faço das palavras do F.P. as minhas: o seu caso é do foro patológico, tendendo a agravar-se com o tempo e com o afastamento em relação à realidade.
Estou a ver que concordamos numa coisa: Viva o referendo!
Concordo que o caso da Guiné é do foro patológico; esta é uma bela ocasião para um tratamento de choque; não é patologia sonhar... não será essa a maior herança de Amílcar Cabral? e a realidade tem-se vindo a aproximar de uma solução, devido ao grande cansaço das pessoas em relação ao «cancro» político. O momento é de esperança, uma oportunidade para uma mudança radical em relação aos vícios que teimam em manter os guineenses reféns de uma realidade traumatizante. O palco político guineense necessita de ser purgado do PAIGC e dos seus «satélites», que tão profundamente o inquinaram.
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