terça-feira, 10 de janeiro de 2023

A propósito de falácias

Em comunicado, refere-se que «o Presidente da ANP foi mandatado para proceder à auscultação dos Partidos Políticos com Assento Parlamentar para encontrar consenso sobre a situação de caducidade e vacatura dos membros do Secretariado Executivo da CNE». 

Ora, segundo o comunicado do grupo parlamentar a que visa responder, a reunião realizada a 24 de Maio do ano passado pela Comissão Permanente, deliberara mandatá-lo, no contexto da dissolução da ANP, para encetar um debate, com vista a encontrar uma solução para essa questão; e posteriormente, a 13 de Outubro, a mesma Comissão Permanente convidara os partidos a apresentar a sua posição para a resolução da situação. 

A ANP serve para decidir, não para procurar consensos impossíveis. Subtil e subrepticiamente, transmuta-se a busca de entendimento em busca de consenso, emprestando-lhe um cunho de unanimidade. Se os parlamentos só decidissem por unanimidade, nunca decidiriam absolutamente nada!

Parece ter razão o PAIGC quando acusa o presidente da ANP de ter impedido, ilegalmente, a Comissão Permanente de tomar uma decisão sobre a matéria admitida, apesar de no respectivo comunicado se enrolar em extensas e desnecessárias divagações em torno da representatividade, em vez de o fundamentar regimentalmente.

Ora reza o artigo 24.º, no seu ponto 1 que "Compete ao Presidente da Assembleia Nacional Popular:" alínea i) "Submeter a discussão e votação a matéria admitida e anunciar o resultado da votação"; a conjugar com o artigo 110.°, que trata do encerramento de debate, estipulando no ponto 3 que "Cabe ao Presidente da Assembleia declarar encerrado o debate e anunciar que se vai imediatamente passar a votação". 

Ou seja: não é admissível debater uma questão exigindo decisão sem que haja votação, nem o presidente tem poder para isso, o mais que pode fazer, à luz do regimento, segundo o artigo 85.°, que versa sobre os seus poderes, é propor ao Plenário, segundo o ponto e) "A suspensão do debate de uma determinada matéria" pressupondo-se obviamente, de qualquer forma, a respectiva votação. 

O comunicado estatui finalmente que "O Presidente da ANP entende ainda que, nos termos do artigo 95.º da Constituição da República da Guiné-Bissau, com a dissolução da ANP nunca se pode convocar a sessão do Plenário." Atendendo a que a letra aparenta dizer exactamente o contrário, seria necessária argumentação bastante consistente e convincente para fundamentar a asserção. Perante a ausência desta, torna-se obviamente um entendimento altamente questionável.

Prevalecendo pois um diferendo quanto ao entendimento e interpretação das normas jurídicas, há que procurar uma solução, para evitar os becos sem saída, no espírito, aliás, que tem presidido a todo este imbróglio. 

Assim sendo, o presidente não pode de forma alguma pretender impor o seu entendimento particular, atendendo a que, segundo o artigo 30.º do Regimento, no seu ponto 1, "Compete à Mesa:" alínea m) "Decidir as questões de interpretação e integração de lacunas do Regimento" conjugado com o artigo 158.°, que estipula que "Compete ao Plenário, a requerimento da Mesa, interpretar o presente Regimento".

Impõe-se portanto, das duas uma: ou à Mesa decidir; ou a convocação da Comissão Permanente para deliberar sobre o assunto e avaliar se, como este pretende, "o Presidente da ANP agiu no cumprimento das suas competências constitucionais e regimentais", conforme conclusão apresentada no seu comunicado.

Ou se, pelo contrário, o mesmo exorbitou das suas funções, dando razão àqueles que o consideram como um usurpador relapso.


PS Faria ainda sentido, no actual contexto, invocar o espírito do regulador expresso na alínea d) do ponto 2 do artigo 68.º do Regimento, quando prevê a possibilidade de a já referida Mesa ou qualquer um dos Grupos Parlamentares interessados requerer um debate visando a "prorrogação de prazos legais prestes a findarem", atribuindo-lhe a urgência que o caso justifica. 

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