A Bola publica hoje um artigo dedicado a Mandela, no qual De Klerk, a «cara metade» de Madiba no Nobel de 1993, realça o seu importante legado: uma transição pacífica, que sobreviverá ao seu funeral.
O desapego ao poder pessoal, foi decerto um factor importante nessa herança. Quem o abandona em vida, conserva-o no além: quem a ele se agarra nesta vida, será abatido por Deus e condenado pelos homens.
segunda-feira, 17 de junho de 2013
Herança de Paz
domingo, 16 de junho de 2013
Chantagem humanitária
De Luanda, um artigo de Martinho Junior sobre a Guiné-Bissau.
«Os países da CPLP que deveriam incrementar a ajuda directa ao povo da Guiné Bissau contrabalançando o esfriamento político, foram incapazes de o fazer.»
A (não) ajuda, que deveria ser orientada para fins humanitários, tem sido utilizada como instrumento de pressão, ao serviço de interesses ainda por esclarecer.
O autor defende uma ideia interessante, aliás consagrada na doutrina católica do «direito à revolta». São Tomás de Aquino estabeleceu que, quando o poder soberano é manifestamente iníquo e mantém a sociedade numa violência intolerável, os súbditos têm o direito (e mesmo o dever) de revolta e de procurar uma outra organização da vida social; direito esse que recomendava limitar pela prudência, ou seja, nunca se deveria arriscar a cair numa situação ainda pior que aquela que se pretende combater. Seria como saltar do caldeirão para ir cair no lume (uma boa achega às teorias brasileiras, forjadas na Líbia, depois infelizmente confirmadas); a emenda não deve ser pior que o soneto.
Neste ponto em particular, discordo do autor, julgo que a situação seria hoje muito pior, se as coisas tivessem seguido o curso «normal», ou seja, sem o contra-golpe de 12 de Abril.
sábado, 15 de junho de 2013
Africa Monitor 655
Prognóstico datado de 17 de Abril de 2012:
Guiné-Bissau: Golpe de Estado tendencialmente em refluxo
Está em acentuação uma tendência capaz de fazer fracassar o golpe de Estado de 12 de Abril – desfecho configurado numa não materialização dos seus “objectivos” e regresso à ordem política anteriormente vigente: reposição em funções do PR interino, Raimundo Pereira, e do Governo; reatamento do processo eleitoral interrompido. Para que o golpe gradualmente não tenha tido condições suficientes para se impor concorreram as múltiplas reacções internacionais (organizações e governos), consonantes no seu pendor de condenação/admoestação, bem como o isolamento interno dos autores do golpe (...)
Delfim reforça papel do Presidente
Num entendimento do papel presidencial «à francesa», o Ministro dos Negócios Estrangeiros deslocou-se à Presidência, para acertar as agulhas da sua postura. Tal como o Didinho chamou a atenção, o discurso inicial precisava de ser corrigido, senão poderia ser lido como uma «submissão»: na altura, propôs condimentar a «não confrontação» com uma pitada de afirmação!.
À saída da Presidência, a necessária correcção, diplomaticamente e por outras palavras: «abrir portas e não fechar portas, mas significa também criar opções e não reduzi-las» (diga-se que a imagem escolhida, para a não confrontação, foi literalmente feliz): assim está melhor, senhor Ministro, deverá sempre cuidar de ampliar a margem de manobra, aumentar os graus de liberdade.
O Senhor Presidente está de parabéns, pela actuação informada, empenhada e em tempo útil. Julgo que está a dar ao mundo um exemplo não só de boa governança como de verdadeira democracia, ouvindo as vozes relevantes que se vão levantando e dando o seu contributo para o reforço da dignidade nacional, tão duramente afectada no decurso dos últimos tempos. Ver comunicado.
quinta-feira, 13 de junho de 2013
Uma no cravo outra na ferradura
Omitindo o facto de que a Guiné-Bissau continua suspensa dessa organização, a CPLP publicou um comunicado no qual afirma ter tomado conhecimento, com satisfação, da formação de um governo inclusivo, de forma a voltar ao «concerto das nações»; talvez fosse por aí que deviam começar, preocuparem-se em rectificar a extemporânea atitude de exclusão, no mínimo incoerente (para não lhe chamar estúpida), por parte de uma comunidade linguística de ordem cultural.
Mas o que mais choca é o padrão de má fé que parece sempre subjacente ao discurso de Portugal e da CPLP: embora tenham finalmente tido de engolir a realidade que se recusavam a admitir, acrescentam sempre uma nota, para salvar as aparências e a honra da «donzela». Na recente declaração conjunta Portugal-Brasil, foi a parte «inventada» da subordinação dos militares ao poder político; desta vez falam de «respeito pelos direitos humanos, incluindo a possibilidade de regresso dos cidadãos no exílio». Tinha de ser.
Parece-me que, ao contrário do que trataram de promover contra os promotores do contra-golpe, que estão proibidos de se deslocar aos vossos países, nunca foi vedado a ninguém o retorno à Guiné-Bissau (o que seria decerto inconstitucional, tratando-se de um cidadão nacional); talvez um cidadão em particular, tenha sido momentaneamente desaconselhado a voltar, por preocupações com a sua própria segurança. Mas foi desaconselhado e não proibido. Tanto não estava impedido de o fazer, que chegou a ser intimado a comparecer em Tribunal, tendo o próprio considerado inoportuna tal deslocação (encontrando-se portanto actualmente na situação de desobediência civil).
Desafia-se a CPLP a esclarecer quais são esses casos de «cidadãos no exílio» impedidos de regressar ao país. Houve realmente uma proibição em relação a certas pessoas, mas foi ao contrário, era de deixar o país, não de entrar. Uma organização internacional deveria ser mais cuidadosa, no tipo de comunicados que emite. Por que razão generalizar ao plural, se estão a falar do caso singular que todos conhecemos? Mas já perguntaram ao referido cidadão «no exílio» (primeiro fartaram-se de espernear para o arrancarem ao seu país natal e agora queixam-se?) se tem condições psicológicas para enfrentar um retorno (ao país, não ao seu estatuto anterior)?
Se não tem coragem para se apresentar em Bissau, pode sempre marcar o Congresso do PAIGC para Lisboa, fretando um charter numa operadora aérea low cost: se o profeta não vai à montanha, que venha a montanha até ao profeta. A CPLP deveria rever as suas apostas. E se estão realmente preocupados com os Direitos Humanos, porque não debruçarem-se sobre a situação angolana, onde ainda há poucos dias foram enviados 25 polícias de choque, apenas para maltratarem, na sua própria casa, à frente da mãe e do irmão, um jovem músico cujo único crime foi ter participado numa manifestação pacífica. Não justificaria um comunicado de preocupação?
Nem um nem outro
Ponha-lhes uma cruz no sítio certo!
Agradeço ao movimento cívico de jovens «nimPAIGCnimPRS» o envio por email da sua Nota Informativa Nº1, entretanto publicada pelo Progresso Nacional.
A ideia é castigar eleitoralmente esses dois partidos que se julgam indispensáveis, que bi-polarizaram a ANP e se constituíram responsáveis pela cultura de prepotência, hipocrisia, condescendência com a impunidade e incompetência, a qual deu origem à falência do «modelo» político, à perda de legitimidade dos órgãos de soberania e à necessidade de arbitragem das Forças Armadas.
Porque haveriam os guineenses de colocar todos os seus ovos no mesmo cesto? (sobretudo sabendo que está roto)... Um dos problemas apontados por Peter Thompson no seu recente relatório de «reconciliação», é precisamente a mentalidade prevalecente de «o vencedor fica com tudo» (faz gato sapato com todos e tende a perpetuar-se nessa condição).
Uma ANP dispersa teria a vantagem de obrigar a um verdadeiro debate e reflexão, a um governo «inclusivo», mais transparente e acessível à cidadania activa. A não «apropriação» do Estado por partidos «vencedores» (sem verdadeiros projectos ou ideias consistentes) teria um efeito moralizador sobre as perversas intenções e expectativas dos seus militantes.
Os jovens do nPnP, que já tinham dado sinal da sua iniciativa há uns tempos, decidiram-se agora a organizar a promoção da sua ideia junto do eleitorado, tendo definido como alvos prioritários a juventude (mais virada para o futuro), os líderes da sociedade civil (que influenciam o voto) e as mulheres, pois poderão ser sensibilizadas para combater a cultura da «pseudo»-virilidade, apontada como fonte dos males do país.
Se considero que esta visão da matchundadi é compreensível, da parte dos jovens, por ser associada à mentalidade arrogante e totalitária dos políticos, parece-me, no entanto, redutora. Esses são os defeitos que se lhe podem apontar; no entanto, já ouvi o mesmo conceito sendo referido com respeito, num sentido positivo, de entendimento entre os mais velhos. Mas como o meu crioulo é incipiente, admito que possa estar enganado.
Um verdadeiro matchu garandi, incorpora também uma certa componente «feminina». É não apenas destrutivo (às vezes também é necessário) mas também criativo e protector. É um pilar do clã, mantém o respeito pela tradição e pela terra, «amamenta» as crianças com o seu «leite» (tão necessário aos filhos como o materno). Hoje, que o feminismo está na moda, é preciso defender também a masculinidade, no que tem de fecundo.
Atendendo ao pedido de sugestões para iniciativas a realizar no âmbito do movimento, julgo que um primeiro passo para o cumprimento dos seus objectivos, deveria ser realizar um pequeno inquérito ou sondagem informal, junto da opinião pública, para ter uma ideia das intenções de voto actuais (pois pode ser muito diferente já da «representatividade» exclusiva que esses partidos invocam possuir).
quarta-feira, 12 de junho de 2013
Tomar a nuvem por Juno
Ou os desejos por realidade.
Segundo a Lusa, na declaração conjunta luso-brasileira sobre a Guiné-Bissau, os dois países congratulam-se pela formação de um novo governo, cujos objectivos seriam «a promoção de eleições e a subordinação dos militares ao poder civil». Se o Presidente da República da Guiné-Bissau, no discurso de tomada de posse do novo governo, se referiu ao objectivo de realização de eleições como ponto substancial (para não dizer quase único), em lado algum anotámos que o segundo «objectivo» alguma vez tivesse sido formulado, fosse por políticos, governantes envolvidos, ou sequer, comunicação social guineense.
Pelo contrário, o governo inclusivo, inclui (passe a redundância) os militares (aliás, mantém) em pastas relevantes. O que está realmente em jogo, é, de certa forma, precisamente o inverso, ou seja, a subordinação do poder político ao poder militar. Como última instituição forte na Guiné (desde antes da independência, aliás), é também a única que pode servir de fiel da balança, prevenindo os abusos de toda a ordem, que os políticos vêm cometendo em prejuízo do país. Como já foi sugerido, eleições não bastam... tudo acabará por voltar à vaca fria; a transição deve abranger um pacto de regime pós-eleições.
É um novo design de país, que promova a almejada estabilidade, baseado numas forças armadas coesas e galvanizadas no seu papel de garante da soberania, empenhada e despudoradamente assumindo a inadiável tarefa da reconstrução nacional. São indispensáveis novas regras do jogo, uma original e impoluta ordem constitucional. As novas eleições só deveriam ser promovidas já nesse quadro. Os trabalhos constituintes deveriam ter em conta todos os vícios apontados ao sistema governativo (e respectiva psicologia), e muito material foi escrito sobre esse assunto ao longo deste último ano.
O primeiro acto eleitoral de transição, deveria ser referendar a nova constituição, resultante de discussão pública (e «inclusiva», já agora) e a supervisionar por um jurista nomeado pelos militares, garantindo a defesa dos seus pontos de vista (para evitar futuros desaguisados). Ir a correr fazer eleições, para voltar a incorrer nos mesmos erros do passado? Seria dar o gesto de 12 de Abril do ano passado por inconsequente; seria trair as esperanças de muitos guineenses, que viram nesse acontecimento uma oportunidade para resolver, não de forma conjuntural, mas essencialmente estrutural, a crise política-social-económica-identitária do país.
Facilmente se reconhece, na «nota de satisfação» emanada das Necessidades, o pragmatismo que faltou a Portugal há um ano atrás, quando deu um tiro no próprio pé, hipotecando a sua boa estrela na Guiné. Quererá isto dizer que abandona a até agora inegociável tese da reposição do status quo ex ante (reconhecendo por essa via, as suas responsabilidades por todo o mal que daí adveio aos guineenses), como parece pensar o Didinho? A ser esse o caso, terá Angola força suficiente para manter a suspensão da Guiné-Bissau na CPLP? Reconhecido o erro, um pedido de desculpas poderia ajudar a regularizar as relações afectadas...
terça-feira, 11 de junho de 2013
Longa vida, Madiba
O Primeiro-Ministro cabo-verdeano cometeu uma monumental e macabra gaffe.
Quando escolhi Mandela, para acompanhar Amílcar Cabral e representar o continente africano na exposição «aerobiografo» que realizei no Xantarim, com 16 personalidades famosas do século XX, escolhi-o essencialmente pela sua humildade e a célebre afirmação, de que o seu exemplo era insignificante face à grandeza de Amílcar Cabral.
Julgo que consegui captar, no graffiti, o seu inesquecível sorriso.
Parece sintomático que José Eduardo dos Santos, na sua recente entrevista à SIC, tenha cruzado o Atlântico, em busca de uma referência política... Já agora, talvez Pinochet tivesse sido uma escolha mais ajustada aos seus métodos, pois os deputados angolanos estão comprados à partida... É claro que Mandela não podia servir para referência, pois, como Senghor, abandonou o poder pelo seu próprio pé. O «regime» sobreviverá ao seu funeral, graças ao exemplo de desprendimento.
Quem quiser comprar a tela, visite a minha loja. São 10 euros com portes incluídos (correio registado 13 euros), para qualquer ponto do globo. Pode ser paga por cartão de crédito, Paypal, Skrill, ou por transferência bancária (Multibanco ou IBAN).
domingo, 9 de junho de 2013
Guerra em Angola
Um dos tabus impostos à entrevista da SIC:
José Eduardo dos Santos declara o «Estado de Sítio», para se defender de meia-dúzia de «perigosos» desafectos ao seu regime. Bastões, cães, helicóptero e cavalaria para reprimir uma manifestação pacífica e autorizada.
Cada dia que Emiliano Catumbela passa sob ignóbeis e infames acusações, cada bastonada, acumulam ao passivo de José Eduardo dos Santos, na sua Guerra contra os rappers. O rap pode cantar-se baixinho. Yô.
eh, Emiliano, aguenta
ca tu bela luta
Emiliano, aguenta, hé
ca tombas o regime
Viva Zapata!
Ver notícia.
sábado, 8 de junho de 2013
Mau princípio
Talvez se tenha partido de um princípio errado, ou seja, a manutenção do Primeiro-Ministro. Este já apresentou contas do «seu» ano de governação? Mesmo considerando a seu favor todas as dificuldades de ordem externa que enfrentou, que resultados tem para apresentar, que avanços encarnou no sentido dos objectivos anunciados?
É impossível reduzir um programa de transição a um ponto único consubstanciado na realização de eleições. Isso seria uma tra(ns)ição ao espírito da iniciativa de 12 de Abril do ano passado. O simples retrocesso, a reprodução do passado, o retorno a uma «ordem» prostituída, não são soluções de transição. É preciso um modelo.
As virtudes da concórdia não devem limitar o poder de decisão. Sua Excelência o Presidente da República ouviu muita gente, agradeceu o contributo de inúmeros conselheiros, mas diluiu a sua responsabilidade numa «solução» sem saída. Terá discernimento para corrigir o tiro em tempo útil? No actual contexto, Vossa Excelência é de difícil substituição.
Dejà vu
Ao olhar para a composição do novo governo, fica-se com a lamentável sensação de que se voltou à «vaca fria». Malam Mané expressou-o bem na página do Doka (citada na DC):
«Grande parte dos ministros agora nomeados já estiveram no governo em outras oportunidades e nada fizeram que fosse digno de referência. A prova disso é que o País continua como está! E cada vez pior!… Por que razão essa mesma gente é sempre chamada para governar o país, mesmo sem nunca terem dado provas de competência e saber fazer??? Será mesmo que a Guiné-Bissau não tem mesmo alternativas em termos de recursos humanos???… Será que o interesse dessa gente é servir a Guiné-Bissau ou se servirem da Guiné-Bissau???… Delfim, Ocante, Soares Sambu, Daniel, e outros, o que vocês têm de útil e de novo para oferecer ao País???…»
Os guineenses estão mais exigentes, querem o seu problema definitivamente resolvido, querem um pacto de regime claro, estão decididos a aproveitar o actual momento para uma mudança efectiva e não se contentarão com a farsa do costume, esperam uma receita nova, o que não pode ser conseguido com velhos ingredientes.
Querem governantes «virgens», não só tecnicamente competentes como humanamente dignos. A única opção viável parece clara: cortar definitivamente com o passado. O desafio é de uma amplitude maior que um simples rearranjo; está em causa um novo design político, um esquema de poder que abstraia os velhos partidos e os vícios entranhados.
O erro parece estar no próprio conceito: inclusivo. Pelos vistos, rapidamente o PAIGC conseguiu desvirtuar a ideia (que consistia na qualificação e responsabilização da sociedade civil, dos líderes religiosos, das associações profissionais, das próprias Forças Armadas) para interpretar a seu favor a «inclusão» (pois estavam arredados do poder e não suportam isso).
É preciso virar o bico ao prego. O próximo Governo deverá partir do princípio da «exclusão». Consulte-se o manual recentemente publicado por Filomeno Pina: «perfil de liderança sem rabos-de-palha, sem medo, frontal e capaz de funcionar numa organização com transparência, fazendo uso constante do princípio do debate de ideias e de projectos».
É ingenuidade pensar que bastam «eleições» para resolver os problemas do país.
sexta-feira, 7 de junho de 2013
Agradar a gregos e a troianos
Num amplo exercício de «inclusividade», ao qual não foi estranha alguma preocupação de «representatividade», optou-se por manter quase inalterada a estrutura orgânica do governo e o manifestamente desproporcionado número de pastas ministeriais.
O Progresso Nacional, em artigo há pouco publicado, criticou essa superabundância de responsabilidade colectiva, muitas vezes sobrepostas. Não será esta uma herança de tempos nos quais era preciso «dividir» para que o «Rei» pudesse reinar?
Para quê um Ministro da Economia e outro das Finanças? Para quê um Ministro do Interior e outro da Administração Territorial e Poder Local? A Pesca não é um Recurso Natural? Para quê um Ministro das Infra-estruturas, outro da Energia e Indústria?
Num suposto Governo de Gestão, será difícil financiar, no curto prazo, qualquer iniciativa desses «pomposos» Ministérios, ou fazer passar decisões estruturantes. Lá diz o ditado: «Em casa onde não há pão, todos ralham e ninguém tem razão»...
Outra crítica veio do Didinho. Esqueceram-se de gregas e troianas... As mulheres guineenses, mais habituadas à economia doméstica e suas dificuldades, mais sensíveis aos problemas do dia a dia, poderiam ter trazido um toque de bom senso, com uma pitada de paz.
Parto difícil
Correspondendo aos desejos da Comunidade Internacional, tomará hoje posse um novo Governo de transição. Espera-se que a mesma Comunidade Internacional levante as pressões que têm asfixiado o país e trazido inúmeros prejuízos à economia, e cumpra, em tempo útil, as muitas promessas que tem feito, no sentido de dar a este novo Governo condições para cumprir o seu programa mínimo num ambiente de estabilidade diplomática e financeira.
Há que não trair as expectativas, investir já na «prevenção», evitando ter de gastar depois muito mais para apagar o «incêndio». A «Comunidade Internacional» (o que quer que isso seja) tem falado muito, por vários porta-vozes (alguns de duvidosa filiação)... Chegou o momento da verdade, a bola está essencialmente desse lado; depois de tanta penalização e tantos esforços de «moralização» democrática, os guineenses estão agora atentos à sua prestação.
Estará essa Comunidade Internacional disposta a investir um mínimo para favorecer os ideais que defende tão veementemente? Estará disposta a fazê-lo por generosidade e confiança na capacidade dos guineenses como os mais habilitados para resolverem os seus próprios problemas, sem chantagens nem ingerências, intenções ocultas, ou agendas estranhas? Virar-se-ia assim uma página na história da Guiné-Bissau. De outra forma apenas estarão a contribuir para a confusão.
Se não forem dados claros sinais de apoio e de suporte ao novo governo, não terão depois qualquer legitimidade, para se pronunciarem sequer, se os guineenses decidirem tomar definitivamente o seu destino nas próprias mãos, seja lá como entenderem fazê-lo. Chegou a hora de ficar a conhecer os verdadeiros amigos, distinguindo-os dos «fala-barato»: passado o «impasse» e depois de todo o esforço feito na constituição deste Governo, seria bastante ingrato não ver disso sinais claros.
Sobreviverá, a criança?
O livro como arma
O novo livro de Abdulai Silá «Dois tiros e uma gargalhada», lançado em Bissau no fim do mês passado, teve direito a destaque na DW.
O autor trabalhou com Paulo Freire, aquando da sua passagem por Bissau para um projecto de alfabetização de adultos. Paulo Freire que defendia, na esteira de Cabral, uma libertação essencialmente mental, na práxis do dia a dia; um dos maiores obstáculos com que se deparou foi precisamente a decisão do Partido e de Mário Cabral, quanto à língua oficial; talvez por isso tenha desafiado os jovens guineenses a escreverem em crioulo, construindo uma literatura e uma identidade nova...
Na entrevista concedida à DW, Abdulai diz que o objectivo (muito actual) deste livro é por as pessoas a pensar nas «formas de acesso ao poder, e no modo como esse poder tem sido usado (...) A Guiné-Bissau tem vivido de transição em transição e acaba sempre por não ser transição nenhuma». Numa outra entrevista, afirma «Aconteceu tanta coisa, tão nociva quanto ininteligível, assistiu-se ao desmoronar de tantos sonhos “legítimos”, assistiu-se a um desfasamento cada dia maior entre o discurso político e a prática diária, o cidadão comum sente grande desilusão e frustração. Para alcançarmos os objectivos colectivos que almejamos como nação, temos que proceder a mudanças, sobretudo a nível cultural, (...) é preciso lembrar, ir buscar na nossa História os ingredientes, os valores morais, a motivação.»
quarta-feira, 5 de junho de 2013
Situação prenhe
«Estamos num período muito delicado, o momento que atravessamos é como se fosse de uma mulher grávida, prestes a dar luz: precisa de ser acarinhada não só pelo marido, como por toda a vizinhança.»
in Doka
Cadelas apressadas...
... dão à luz cachorros cegos.
Estranha-se, da parte dos partidos políticos com representação parlamentar, a pressa na constituição e a vontade de presença num Governo de reduzido âmbito temporal, sem que, no entanto, promovam a reflexão relativamente às perspectivas e expectativas quanto a esse governo, ou a discussão de como implementar um «programa» mínimo, ou as previsíveis dificuldades de articulação entre elementos de origens tão díspares...
Esses partidos parecem dispostos apenas a regatear a sua «representatividade» até à exaustão. De resto são só «facilidades». Soa a desgoverno. Haja alguém que se preocupe com a consistência e sustentabilidade de curto prazo.
Vira o disco e toca o mesmo
O mais recente título da Voz da América relativo à Guiné-Bissau afixa o alarmista título de «Crise instala-se de novo no país», consistindo numa entrevista a Rui Landim. Não se percebe como, estando tudo «na mesma, como a lesma», é possível afirmar que a crise «voltou de novo», sobretudo baseados num discurso do entrevistado decalcado de outra entrevista à Voz de Angola, com quase dois meses! Qual é a novidade?
O pseudo-analista não tem publicado muitas análises, o seu trabalho ultimamente tem-se reduzido a repetir a mesma cassete, cuja único conteúdo é «entregar o país à ONU»: atitude não só anti-constitucional, como anti-patriótica. Conteúdo esse já ultrapassado há muito; essa possibilidade só existiu mesmo na cabeça de algumas mentes toldadas pela frustração em relação à situação; neste momento, a «ideia» representa pouco mais que uma chalaça de mau gosto.
terça-feira, 4 de junho de 2013
Confissões de um ex-agente da DEA
Fernando Simões, um ex-agente da CIA e da DEA, escandalizado com as hipócritas declarações de Mário Soares, acusando o PSD de estar a «atraiçoar a herança de Sá Carneiro», decidiu-se agora, passados os 25 anos contratuais da cláusula de «silêncio» a que estava obrigado, a publicar, no Scribd, um documento que já tinha escrito há dois anos, com as suas confissões. Transcreve-se apenas a parte do resumo (a versão integral pode ser adquirida) relativo à DEA, onde esclarece o «âmbito» de actuação e os métodos empregues por essa agência norte-americana.
A minha colaboração com a DEA, iniciou-se em 1981, através de Richard Lee Armitage. Em 1980, Richard Armitage viria também a estar comigo e com o Henry Kissinger em Paris, Richard Lee Armitage era membro do CFR (Council for Foreign Affairs and Relations) e da Organização e Cooperação para a Segurança da Europa (OSCE), criada pela CIA, Richard Armitage era também membro, na altura, do Grupo Carlyle, do qual o CEO era Frank Carlucci. O Grupo Carlyle dedica-se à construção civil, imobiliário e é um dos maiores grupos de tráfico de armas no Mundo, junto com o Grupo Haliburton, chefiado por Richard "Dick" Cheney. O Grupo Carlyle pertence a vários investidores privados dos EUA, por regra do Partido Republicano. Este grupo promove nomeadamente vendas de armas, petróleo e cimento para países como o Iraque, Afeganistão e agora para os países da primavera árabe. A lavagem do dinheiro do tráfico de armas e da droga, era feita, na altura, pelo Banco BCCI, ligado à CIA e à NSA - National Security Agency. O BCCI foi fundado em 1972 e fechado no princípio dos anos 90, devido aos diversos escândalos em que esteve envolvido. Oliver North pertencia ao Conselho Nacional de Segurança, às ordens de William Walker, ex-embaixador dos EUA em El Salvador. Oliver North seguiu e segue sempre as ordens da CIA, dependente de William Casey. Oliver North está hoje retirado da CIA, e é CEO de vários grupos privados americanos, tal como Frank Carlucci. Da DEA conheci Celerino Castilho, Mike Levine, Anabelle Grimm e Brad Ayers, tendo trabalhado para a DEA entre 1975 até 1989. Da CIA trabalhei também com Tosh Plumbey, Ralph Megehee - tenente coronel da NSA, actualmente reformado. Da CIA trabalhei ainda com Bo Gritz e Tatum. Estes dois agentes tinham a sua base de operações em El Salvador (onde eu também estive durante os anos 80, durante o tráfico Irão - Contras), desenvolvendo nomeadamente actividades com tráfico de armas. Uma das suas operações consistiu no transporte de armas dos EUA para El-Salvador, que eram depois transportadas para o Irão e a Nicarágua. Os aviões, normalmente panamianos e colombianos regressavam depois para os EUA com droga, nomeadamente cocaína, proveniente de países como a Colômbia, Bolívia e El Salvador, que serviam para financiar a compra de armas. Esta actividade desenvolveu-se essencialmente desde os finais dos anos 70 até 1988. A cocaína vinha nomeadamente da Ilha Normans Cay, nas Bahamas, de que era proprietário Carlos Lheder Rivas. Carlos Rivas era um dos chefes do Cartel de Medellin, trabalhando para este cartel e para ele próprio. Carlos Rivas era, neste contexto um personagem importante, sendo o braço direito de Roberto Vesco, que trabalhava para a CIA e para a NSA. Roberto Vesco era proprietário de Bancos nas Bahamas, nomeadamente o Columbus Trust. Carlos Rivas fazia toda a logística de Roberto Vesco e forneciam armas a troco de cocaína, nomeadamente ao movimento de guerrilha Colombiano M19. Roberto Vesco está hoje refugiado em Cuba. O dinheiro das operações de armas e de droga são lavadas no Banco BCCI e noutros bancos, com o nome de código "Amadeus". Há no entanto contas activas nas Bahamas e em Norman's Cay, nas Ilhas Jersey, que gerem contas bancárias, nomeadamente para o tráfico de armas para os “Contras” da Nicarágua, e para o Irão. Como acima referi, muito desse dinheiro foi para bancos americanos e franceses, o que em parte explicará porquê é que Manuel Noriega foi condenado a 60 anos de prisão, tendo primeiro estado preso nos EUA, depois em França, e actualmente no Panamá. Foi preso porque era conveniente que estivesse calado, não referindo nomeadamente que partilhava com a CIA o dinheiro proveniente da venda de armas e da venda de drogas. Noriega movimentava contas bancárias em mais de 120 bancos, com conhecimento da CIA. Noriega fazia também parte da operação Black Eagle, dedicada ao tráfico de armas e de droga, que em 1982 se transformou numa empresa chamada Enterprise, com a colaboração de Oliver North e de Donald Gregg da CIA. Em face do grau de informações e de conhecimento que tinha, é fácil de perceber porque se verificou o derrube e a prisão de Noriega. Devo dizer que estou pessoalmente admirado que não o tenham até agora “suicidado", pois deve ter muitos documentos ainda guardados. Noriega tinha a intenção de contar tudo o que sabia sobre este tráfico, nomeadamente sobre os serviços prestados à CIA e a Bush Pai, tendo por isso sido preso. Washington e a CIA são assim veículos importantes do tráfico de armas e de droga, utilizando nomeadamente os pontos de apoio de South Flórida e do Panamá. No início dos anos 80 conheci um traficante do cartel de Cali, de nome Ramon Milian Rodriguez, que depois mais tarde perante uma comissão do Senado Americano, falou do tráfico de armas e de droga, do branqueamento de dinheiro, bem como das cumplicidades de Oliver North neste tráfico às ordens de Bush Pai e do Donald Gregg. Muito do dinheiro gerado nessas vendas foi para bancos americanos e franceses. Este dinheiro servia também para compras de propriedades imobiliárias. Por estar ligado a estas operações, Noriega foi preso pelos EUA. Foi numa operação de droga que realizei na Colômbia e nas Bahamas, em 1984, onde se deu a prisão de Carlos Lheder Rivas, do Cartel de Medellin, em que eu não concordei com os agentes da DEA da estação de Miami, pois eles queriam ficar com 10 milhões de dólares e com o avião "lear-jet" provenientes do tráfico de droga. Não concordando, participei desses agentes ao chefe da estação da DEA de Miami. Este chefe mandou-lhes então levantar um inquérito, tendo sido presos pela própria DEA. A partir de aí a minha vida tornou-se num verdadeiro inferno, nomeadamente com a realização de armadilhas, e detenções, tendo acabado por sair da CIA em 1989, a conselho de Frank Carlucci. O principal culpado da minha saida da CIA e da DEA foi John C. Lawn, director da estação da DEA e amigo de Noriega e de outros traficantes. John Lawn encobriu, ou tentou encobrir, todos os agentes da DEA que denunciei aquando da prisão de Carlos Rivas. Após a minha saida da CIA, Frank Carlucci continuou contudo a ajudar-me com dinheiro, com conselhos e com apoio logístico, sempre que eu precisei até 1994.
segunda-feira, 3 de junho de 2013
on-line!
Quando já todos estavam preocupados com o «desaparecimento» dos intelectuais balantas, passadas umas horas da sua indisponibilidade, eis que dão sinal de vida. Chegou a temer-se o pior, denúncias, censura, etc. Mas não, foi apenas um pequeno problema técnico, já tudo voltou à normalidade.
Perda de confiança no PM
Nesta notícia da PNN, escamoteou-se um elemento essencial para a análise da situação: que o Primeiro-Ministro de Transição foi indicado pelo próprio PRS, partido no qual milita Rui Barros. Ou militava? Uma vez indigitados para certas funções, os elementos dos partidos não deveriam ser «desligados» da disciplina partidária, para poderem atender em primeira mão aos superiores interesses do Estado, e não ficarem reféns da «politiquice» conjuntural?
Calendário de transição
Face à auto-exclusão dos maiores partidos em relação ao processo, depois de terem assinado e validado o Pacto de Transição, envolvendo pequenos partidos e sociedade civil, parece perfilar-se a hipótese de um governo de iniciativa presidencial de raiz, atendendo à patente inclinação do presidente para uma composição em termos exclusivamente técnicos.
As virtudes esperadas em relação a essa opção não cabem em cinco meses. Um bom «tecnocrata» precisa de algum tempo para se inteirar da situação, para gizar um plano, para recensear e «apalpar» os recursos disponíveis, para inventar novos recursos, para mobilizar as pessoas para os objectivos definidos. Diz o ditado que Roma e Pavia não se fizeram num dia.
Um «bom» tecnocrata não aceita um desafio limitado e com probabilidades nulas de sucesso. Se, mais que uma saída conjuntural para o actual impasse, se procuram realmente soluções duradouras, aproveitando decididamente o actual momento que para esse efeito pode revelar-se propício, há que encontrar novas fórmulas de decisão nos instrumentos em vigor.
Admitida a sobreposição à constituição do Pacto de Transição, não se compreende que os dois maiores partidos continuem a insistir em «puxar a brasa à sua sardinha». Tratando-se, como insistentemente propagam, de um pretenso governo «inclusivo», torna-se suspeita a sua atitude. Mas acaba por ser útil, evidenciando a necessidade de uma clarificação.
Os dois maiores partidos, agora unidos numa frente comum contra a vontade popular, pretendem bloquear as reformas que há muito a Guiné necessita desesperadamente, pois uma tal decisão afecta os interesses e expectativas interesseiras e «culturais» dos seus filiados, utilizando para isso uma maioria totalitária na ANP, baseada num mandato que já expirou há muito.
Há que quebrar esse vínculo dissonante e corruptor, abstraindo o Governo da influência decisória dos partidos, noutras esferas que não a simples fiscalização. Um Pacto de Regime poderia consistir num contrato desse género: os Partidos seriam reservatórios de «mão-de-obra» política, mas a escolha seria efectuada autónoma e independentemente pelos técnicos do Governo.
O prazo estipulado para um roteiro de transição sério, deveria incluir uma fase de diagnóstico, seguida de outra de projecto, finalizando numa implementação continuada e consistente. Um governo que não esteja dependente dos Partidos, com legitimidade técnica, sob a protecção de umas Forças Armadas garantindo a defesa da soberania nacional, representaria uma garantia de estabilidade.
Caso a ANP não concorde com a solução avançada pelo Presidente, no sentido de resolver a actual situação de «calamidade política» (que, segundo a alínea primeira do artigo 31 da Constituição, poderá até ditar a sua dissolução), poderá sempre, utilizando as suas prerrogativas constitucionais, sujeitar a referendo a proposta em causa, apelando à sua rejeição nas urnas.
O indesejado
Com uma certa dose de fina ironia, Filomeno Pina acaba de traçar o perfil do «candidato natural» (CN) às próximas eleições presidenciais.
Numa análise de extrema sensibilidade psicológica, subtilmente detalhada, vem chamar a atenção para um ponto importante: o esquecimento a que parece «votado» o CN, como actor no palco ao qual pretendia subir. Simples apagamento ou desaparecimento puro e simples da cena?
Com Filomeno como psicólogo, quase que é possível sentir a dor, a frustração a arder no estômago do psicopata, face à erosão da sua «construção». Aparentemente incapaz de um gesto de grandeza, adjuvado por elementar bom senso, que seria desistir da sua ficção...
O especialista clínico põe o dedo na ferida, lembra ao nevrótico e impaciente paciente a realidade, da qual parece estar cada vez mais alheado, mas pressente que o caso é do foro patológico, tendendo a agravar-se com o tempo e com o afastamento em relação à realidade.
Excluído de qualquer cenário, o amor próprio do doente arrisca-se a ceder; a sua personalidade a abrir falência. A cair no fundo da sua auto-estima. De «bestial» a besta. Depois de se imaginar vencedor e aclamado, acaba indesejado e pior: esquecido!
Parece natural que ninguém sinta a falta do CN. No Partido do qual continua presidente, tornou-se um peso morto, bloqueando todas as saídas, para além da sua própria. Que poderia hoje oferecer aos guineenses, com todo o passivo de favores que acumulou na tentativa de asfixiar o país?
Compare-se com a atitude digna de Luís Cabral, que, arredado do poder, nunca tentou prejudicar o seu país, nem sequer se exilou em Cabo Verde. «Retornados» na política guineense, dão mau resultado, como ficou suficientemente (senão demasiado) claro com Nino Vieira...
sexta-feira, 31 de maio de 2013
Aliança post mortem
O PRS acaba de se juntar ao PAIGC no «Titanic» da reposição da ordem constitucional, através de uma nota de imprensa. Esta «aliança» forçada, para tentar conter a tendência que tem vindo a ganhar força e que hoje parece inevitável, apenas demonstra como os dirigentes desses partidos se sentem fragilizados (evitei dizer «culpados»).
O PRS, numa incompreensível opção estratégica, em vez de tentar «cavalgar» a onda, prefere assinar a sua certidão de óbito. Clarificação importante, mas já pouco relevante para travar aquele que parece o inelutável curso dos acontecimentos.