A Lusa agora «factura» serviços de propaganda ao regime angolano. No entanto, o simples facto de publicar um artigo como este, é altamente revelador. Gato escondido com rabo de fora... Não é muito difícil de adivinhar a razão pela qual as autoridades monetárias angolanas fizeram a encomenda: julgarão que a procura «extraordinária» de dólares é «psicológica»?
Mas é preciso dissecar o documento, para compreender bem o que está em causa e desmascarar a incompetência (para não falar em corrupção - no mínimo moral) que, com origem no campo político, contaminou o meio jornalístico luso. Os «jornalistas» da Lusa não só papam o «panorama» estabelecido pelo Banco de Angola, sem fazer perguntas, como estudaram muito bem as palavras, em ordem a um efeito emocional pretendendo minimizar o assunto.
Para todos os efeitos, estamos perante uma descarada tentativa para manipular o leitor: vamos apenas assinalar alguns pormenores «estranhos» que poderão dar que pensar.
1) O título: escolhido para atrair os «profetas da desgraça» (para retomar uma expressão cara a Cavaco Silva, quando era Primeiro-Ministro - pensando retrospectivamente, os Bandarras sempre tinham razão, atendendo à situação calamitosa em que se encontra Portugal). Pelos vistos, surtiu efeito, uma vez que Club-K e o Angola24Horas publicaram... Como prevalece a constatação de que as coisas estão mal, pretende despertar no leitor uma motivação quase mórbida: «deixa lá tentar avaliar em que medida isto está realmente mau»...
2) Claro que, logo em seguida, essa ideia (antes que se instale) é virulentamente combatida... Pode suspirar de alívio: afinal a «descida», que tornava o título tão apelativo, é de menos de 2%... No entanto, os dados apresentados referem-se à comparação de Dezembro com Janeiro (nunca sendo muito claro se a 1 ou a 31, mas enfim), ou seja, antes de a crise «estalar». Para além disso, a Lusa deveria explicar qual o valor acrescentado do artigo, uma vez que, para além da moldura de propaganda rasca, com que o revestiram, é um simples copy/paste deste outro artigo, de há um mês atrás.
3) Mais engraçado é que há dados que permitiriam actualizar o panorama apresentado, estão publicamente disponíveis para os dois meses seguintes aos apresentados, constando de relatórios publicados semanalmente, tendo-lhes a própria Lusa dedicado há pouco tempo um artigo. Porque não completar a série estatística, emprestando outra frescura ao assunto? Coisa que não passou pela cabeça dos jornalistas... Mas não é de estranhar, pois se receberam, decerto que não foi para pensar...
4) Há tiques soviéticos que não escapam a um leitor minimamente atento: «as reservas angolanas de ouro, que em dezembro subiram para quase 79,291 mil milhões de Kwanzas». Se eu tiver 79 ovelhas, posso dizer que «tenho quase 80». Agora dizer que subiram para «quase 79,291»? Sim, sim, ó melga! Por que razão tudo é apresentado em dólares e convertido (à taxa do dia) em euros, excepto precisamente o ouro, cuja cotação é convertida em Kwanzas (ainda para mais, recuando aos dados de Dezembro)? É apenas para parecer mais (porque o Kwanza desvalorizou)... repare-se que os «efeitos» funcionam todos no mesmo sentido «adjectivante», tendencioso e anti-jornalístico (quanto ao ouro, diga-se que, ao actual ritmo de execução das reservas, de 300 milhões por semana, duraria pouco mais de 15 dias).
5) Apesar da opacidade que o regime alimenta quanto à composição das suas RIL, vem agora o Banco de Angola revelar (naquilo que se pode considerar como a única novidade propriamente dita em todo o artigo) que estas incluem, para além de disponibilidades (efeitos facilmente negociáveis, como o dólar, o euro ou o ouro), outros tais como «obrigações de curto prazo» e «aplicações sobre não residentes». O Banco de Angola, ao não publicitar em que proporções se repartem as reservas (excepto o ouro, calculado com grande precisão mas à cotação do dia - embora não se saiba de qual dia - seria mais científico que dissessem o peso, depois quem quisesse fazia depois as suas contas, à cotação do momento), pode contribuir para alimentar fundadas especulações quanto à liquidez dessas reservas, que escondem nos seus meandros realidades bem diferentes.
6) Finalmente, para quê tantas subtilezas? Qual o intuito deste peça propagandística, indigna de uma agência noticiosa estatal? Esconder o óbvio, ou seja que Angola se encontra num grave aperto financeiro e à beira de uma crise monetária? Numa circunstância similar de quebra na cotação do petróleo (para um nível inferior aos 65 dólares, tido como o custo de produção angolano) em 2009, Angola foi obrigada a pedir a ajuda do FMI, quase mil e quatrocentos milhões de dólares: ao ritmo semanal actual, essa ajuda duraria apenas para aguentar as coisas mais um mês...
Há 14 minutos
1 comentário:
Ainda a composição das RIL. As «nuances» permitem perceber duas coisas:
1) o conceito de «disponibilidades» está muito bem explicitado nas várias alíneas do ponto 1 do artigo 39º da Lei do Banco Nacional de Angola, incluindo obrigações até seis meses e mesmo acções ou seja, «aplicações sobre não residentes»; bastará ler a fluídez da formulação «títulos representativos da participação, efectuada nos termos do artigo 49° no capital de instituições estrangeiras ou internacionais, com atribuições monetárias e cambiais» A última parte da frase aplica-se a que sujeito? aos títulos ou às instituições? Mas que quererá dizer então, nesse contexto, «curto prazo»? Obrigações a mais de 6 meses e menos de um ano? Ou é uma forma de expressão vulgar, apenas para dizer que não estão disponíveis «assim muito depressa»?
2) O BNA é blindado e «à prova de bala», tendo a sua Lei de Base alocado inúmeras facilidades e «competências» monetárias, inclusive a de se garantir a si próprio, por transferência do Ministério das Finanças de títulos da dívida pública (ponto 3 do Artigo 5º). Para «onde» tem ido o excedente de TT não colocados?
Enviar um comentário