quarta-feira, 22 de julho de 2015

Comentários soltos

Fernando Teles deve ter informações fidedignas de que JES já não voltará ao país. De outra forma não ousaria desafiá-lo, como o fez no jornal Expansão, querendo «ensinar o Padre Nosso ao Cura» (para evitar a fúria do patrão e lhe ocultar que se está obviamente a posicionar para a era pós-JES, até inventa que está amuado com a Bodiva). Para quem se gabava da proximidade aos círculos do poder (e ainda há pouco, apesar de todos os sinais, insistia em papaguear a retórica rasca do regime), é de estranhar que só agora se lembre de «reinventar a roda». Todas estas dicas inteligentes, porque não as deu a quem de direito, no seu devido tempo, quando estava de barriga cheia? Isto de fazer «prognósticos» depois do jogo acabado é demasiado fácil... Não se nota nada que os ratos começam a abandonar o barco.

Entretanto, segundo artigo do Jornal de Angola (como têm a conta em atraso a SAPO injectou-lhes boa dose de publicidade)  a Sonangol lançou para cima da mesa «metade» das reservas de petróleo do país, a serem licitadas ao desbarato em pleno descalabro do sector. Resta saber se o regime angolano ainda tem legitimidade para proceder a esse «desconto», sabendo que ninguém acredita já que JES consiga baixar o custo de produção para metade, pelo menos para o país não estar a perder dinheiro (e a dar prioridade nas importações a «materiais para a indústria petrolífera», que neste momento quer apenas dizer fuga e lavagem de capitais, em detrimento, por exemplo, de tractores agrícolas, já de si limitados por regras sumptuárias que proíbem a importação de máquinas com mais de cinco anos). O «modelo» JES só funciona com vacas bem gordas. Ninguém quer comprar os teus blocos, ó Belzedú! Nem dados. Não é apenas por não valerem «nada», neste momento. É sobretudo por estar toda a gente farta de «esquebras» e de arrogância.

«Isto está bom... bástico. Não tarda faz bum.»

Obrigado «bolo fofo»!

PS Talvez agora se possa aferir da inteligência dos timorenses, ao criarem o Fundo Soberano e estipularem que apenas poderiam levantar uma parte dos rendimentos em juros. Não ficavam assim dependentes do petróleo (e não andam a sustentar burros a pão-de-ló, como os angolanos, que até mete dó). Não foi como JES que, mesmo em tempo de vacas gordas continuou a endividar-se... a contar com o ovo no cu da galinha. E até mesmo se poderá entender a firmeza de Xanana, ao expulsar os juristas portugueses que estavam armados em DDT (Donos Disto Tudo) em Timor, enquanto faziam vista grossa ao que se passava em Luanda, mil vezes pior. É compreensível a irritação, quando o parceiro tem dois pesos e duas medidas.

sexta-feira, 17 de julho de 2015

GOLPE DE mESTrADO

Infelizmente para Angola, os revus não deram um Golpe de Estado, avançando com o seu Governo de Salvação Nacional. Não deram um Golpe de Estado, mas deram um golpe de mestre, sinalizando o estatuto da sua luta. Como diria Mandela: primeiro proíbem-te; depois batem-te; em seguida prendem-te; depois ganhas. Enfim, apenas para lembrar que a média de habilitações literárias dos presos políticos é o MESTRADO (e não são diplomas comprados). Saudações muito especiais a Sua Excelência Professor Doutor Domingos da Cruz.

De pés dados

A CPLP continua a ser uma instituição vazia e sem alma. Cada um voltado para o seu umbigo. No encontro de PGRs, realizado em Cabo Verde, a portuguesa recusou-se a comentar casos em Portugal (quanto mais noutros países, credo!). Ou seja, o angolano está envolvido numa desavergonhada sujeição ao poder «zecutivo» (apesar do seu arrogante e mal educado desmentido culminando num antológico «aquilo que dizem as outras pessoas não tem grande importância para nós», ver DW), em flagrante violação dos mais básicos acordos e convenções internacionais assinados pela RPA, bem como dos trâmites processuais de acusação, reduzindo-se a validar prisões políticas reconhecidamente a mando do presidente... e toda a gente assobia para o lado, como se de nada fosse? São uma comunidade de quê? O tema era a independência face ao poder político...

Mas, se o urgente e humanitário caso angolano não mereceu nota tuga, já o mesmo se não passou em relação à Guiné-Bissau, relativamente à qual, numa reacção paternalista muito típica das actuais autoridades portuguesas (e nun contexto de clara ingerência), já sobressai a única nota crítica específica emanada pela judiciosa e douta PGR tuga, lembrando, como não poderia deixar de ser, a «fragilidade» do Estado - ver notícia da Lus@ - e a necessidade de reforço do papel do PGR. Cereja em cimo do bolo são as conclusões do encontro, nas quais os PGRs reivindicam o curioso tratamento de «autoridades centrais».

PGRs guineense e angolano de pés dados? instrumentalizados pelos respectivos Presidentes? (e mobilizados contra as inventonas, um prendendo jovens outro insistindo na fama de caça-Ministros)? A CPLP tresanda cada vez mais a ópera bufa.

Entretanto, o Presidente do Sindicato do MP, na ausência do Procurador, numa reacção tão espontânea quanto extemporânea, cai no ridículo, virando-se o feitiço contra o feiticeiro: a sua última insinuação, claramente intencional e direccionada, apenas vem dar razão às queixas que DSP tem feito de ser alvo de perseguição. Quanto à chantagem, sobre a pessoa de um Primeiro-Ministro, é algo mais grave do que simples declarações infelizes e irresponsáveis: achincalha a Justiça e dá a entender que há muita roupa suja para lavar por «fora». Se o MP tem alguma coisa contra o Primeiro-Ministro em relação à sua actuação neste Governo, era por aí que deviam começar e não por histórias mais antigas, pouco pedagógicas mas demasiado vulgares.

quinta-feira, 16 de julho de 2015

Hoje, no Público

É notícia a suspensão de um Juiz português por atitudes pouco dignas. Não deverão os Juízes estar sujeitos ao escrutínio dos seus actos? Garantir a independência do poder judicial implica ficar sujeito à prepotência e arrogância de péssimos exemplos?

Para além da «sua consciência», como prescreve a lei guineense, não deverão os Juízes ser igualmente obrigados a julgar em nome da consciência colectiva e responsabilizarem-se pela exemplaridade de conduta? Será a «intocabilidade» a melhor opção?

Quem julga os Juízes?
Remeter para o além não é solução!

Paulo Filipe para Ministro da Agricultura!

A não perder : a entrevista sobre a identidade partilhada entre o homem e a terra. O Paulo que se ponha a pau, pois ultrapassou claramente os limites da inteligência tolerada, tornando-se portanto pessoa não grata. Poderá ser encarcerado sem dó, para prevenir a aliança do campesinato com o proletariado revu. Ainda há quem tema pelo futuro sem José Eduardo dos Santos, o engenheiro da estupidez! Correndo o risco de ser acusado de tentativa de Golpe de Estado pelo regime de(com)posto... aponto mais uma sombra para o Governo (e)iminente de Salvação Nacional.

Homenagem a Piçarra

Domingos da Cruz não se esqueceu de enumerar uma ferramenta para derrubar o ditador: o humor. Uma homenagem a Piçarra, pela sua elevada consistência, sentido de actualidade e capacidade de intervenção. Bravo, mano!


quarta-feira, 15 de julho de 2015

Em maré de contas

Os jornalistas da Lusa estão de parabéns, pelo inteligente realce dado na sua notícia aos sinais sibilinos de descontrolo das contas públicas angolanas, na apresentação do relatório de 2014 do Banco Nacional de Angola. O stress é notório em «é possível que as taxas de juro venham a sofrer pressões altistas» ou «existe a possibilidade de os investidores exigirem prémios de risco mais elevados». Já bem adentrados no segundo semestre, não é difícil, para os analistas do BNA, armarem-se em adivinhos. Eu diria mais: há uma «forte» possibilidade de que esses efeitos, depois de tanta contenção, se venham a revelar «abruptamente».

As contas da Sonangol

O relatório de contas de 2014 da Sonangol (não se deixar desmoralizar pelo «Março 2014» que é uma «gaffe» útil, o documento acaba de ser publicado). Há certas coisas no mínimo curiosas, como o facto de o custo das matérias-primas, subsidiárias e de consumo, ter mais que triplicado em relação ao ano de 2013, ou os rendimentos de participações financeiras que desapareceram (reaparecendo como reposição de provisões?)... Mas não é isso que nos ocupa. A Sonangol declara, no último ponto do documento: «A Sonangol EP assume-se como o garante de um financiamento externo da República de Angola junto de instituições financeiras internacionais num montante de 4500 milhões de dólares. Estas garantias são efectivadas pela consignação de carregamentos/vendas de petróleo bruto, conforme as cláusulas contratuais.»

Consultando as condições associadas, descobre-se que o total perfaz 5500 milhões de dólares e não os referidos 4500. «Pequena» incongruência de mil milhões de dólares que escapou aos analistas internos. 3500 milhões pelo Standard Chartered Bank e 2000 milhões, concedidos pelo China Development Bank. Destinando-se a um rolamento da dívida, o facto é que houve um acréscimo de 300 000 milhões de kwanzas no endividamento não corrente, digamos 3000 milhões de dólares.

Dada a notória descapitalização da empresa perante o cenário de um nivelamento por baixo da cotação do petróleo, a banca internacional exigiu, para além da consignação das receitas do petróleo, o respeito por alguns rácios financeiros, nomeadamente (ver página 110): que a situação líquida da empresa não baixe dos 1,2 biliões de kwanzas (aproximadamente o nível a 31 de Dezembro); o rácio EBITDA / Dívida líquida não deverá ser inferior a 0,5 (o famoso «63%»); o rácio EBITDA / Serviço da dívida não deverá ser inferior a 1,3; etc.

Apresento uma pequena tabela resumida, associando grosseiramente a cotação do petróleo ao lucro da Sonangol, em milhares de milhões de kwanzas («esquecer» o câmbio e não pensar que o facto de inscrever mais kwanzas por dólar vai mudar alguma coisa, pois será preciso reembolsar em dólares).


O modelo foi ajustado para justificar a quebra do lucro, de cerca de 300 000 milhões em 2013, para 139 000 milhões em 2014. Só se pode justificar tal quebra (considerando grosso modo o volume de produção inalterado) calculando o custo de produção a cerca de $85 por barril. Ou seja, a $70 o barril (pela estrutura de custos de 2014), a Sonangol perde tanto por mês quanto ganhava em 2013. Projectando tal chave para o primeiro semestre de 2015 (e a situação piorou, nestes últimos quinze dias), rapidamente se chega à conclusão de que em meio ano a Sonangol já perdeu mais do que ganhou ao longo de todo o ano de 2013. Ou seja: a situação líquida da empresa está, findos estes primeiros seis meses do ano, a 3/4 das recentes exigências dos credores; os rácios não só desceram do estipulado, como passaram rapidamente pelo zero e são agora negativos.

KO técnico é pouco. Morte súbita parece mais adequado.

segunda-feira, 13 de julho de 2015

Pior a Emenda que o Soneto

O senhor Francisco de Lemos José Maria, Presidente-Director-Geral da SONANGOL, apercebendo-se do erro incorrido na formulação, quis obviar ao seu acto falhado. Só que voltou a enganar-se. Corrigiu as letras, de inferior para superior a 63%, entre a primeira e a segunda versão da entrevista. No entanto, a primeira, «inferior a 63%» estava numericamente correcta, pois o valor aproximado às milésimas é 62,698, o que não correspondia à encomenda de JES era a perspectiva da aproximação às unidades; agora, que corrigiu o texto, sem, no entanto, corrigir o número (que teria de baixar para 62%), está formalmente errado, pois 62,7% não é «superior a 63%». Pior a emenda que o soneto. Se este senhor se enrola tanto com uma simples percentagem, como pode estar à frente de uma petrolífera?

Em vez de pretender ironizar, e uma vez que apresenta dados da produção para Junho de 2015, porque  apresenta as contas «financeiras» à data de 31 de Dezembro do ano passado e não do Primeiro Semestre deste ano? Duvido que a decisão irracional e anti-económica de continuar a produzir tenha origem no senhor PDG, que parecia bem mais simpático e competente, quando desabafava relativamente ao «modelo empresarial». Aqui há gato. Gato escondido com o rabo de fora.

Tapar o sol com a peneira

Depois de enfiar o barrete do Expresso, a SONANGOL publica um frágil comunicado, mais confirmando que desmentindo a situação de falência.

Atabalhoadamente redigido, foge-lhe a boca para a verdade quando, tratando de solvabilidade, onde queria dizer «superior a 62%», diz «inferior a 63%». Efectivamente! Acertou! Muito inferior. Não basta saber fazer aproximações às unidades, tem de estudar a forma como o diz. Estas gaffes imperdoáveis não escapam aos analistas financeiros internacionais. Compelido a desempenhar o papel de papagaio de José Eduardo dos Santos, o administrador mete os pés pelas mãos: a sua especialidade são os petróleos, não a contra-informação. Assim se podem compreender este género de actos falhados: os gestores estão baralhados.

«Os sinais são animadores»... precisamente na semana em que o rebentamento da bolha chinesa roubou $10 à cotação do petróleo? Ok. Fica-se a conhecer o calibre do bicho, até onde está disposto a ir o Pinóquio. JES esconde assim que está a abusar da paciência dos seus subcontratados, para tentar arranjar divisas frescas. Já enrolado numa espiral de dívida e empenhamentos, tenta cobrir a careca vendendo petróleo abaixo do preço de custo. Ou seja, produzir 11,8% (fazendo muitos esforços na comparação) mais petróleo é mau, quando se opera abaixo do preço de custo. Quanto mais se produz, mais dinheiro se perde. Quanto à referência sibilina ao OGE, com a afirmação espampanante de que o «preço médio de exportação realizado pela Sonangol está 35% acima do preço de referência de programação para o ano de 2015» tem a ver com a farsa que representaram os pressupostos estúpidos já aqui denunciados dessa rectificação [de que uma quebra de 50% no preço do petróleo se traduziria numa quebra semelhante nas Receitas do Estado (como se não devessem ser considerados custos de produção)]: a fixação por baixo da fasquia dos $40 conseguiu assim passar por uma medida de prudência na altura e produzir hoje afirmações idiotas como esta.

O «jornal português» que revela «insuficiente análise e conhecimento» reagiu pouco depois, com um artigo. No entanto, permitam-me que ajude à festa, que os senhores jornalistas são um pouco acríticos para o meu gosto, quando lhes dão palha a comer. Para quem queira puxar simplesmente de um lápis, as contas são simples: em 2013 produzia-se menos petróleo, mas os lucros cifraram-se em cerca de 3 mil milhões de dólares. A conjuntura apenas começou a mudar em Setembro do ano passado, e só a partir de 11/11 o petróleo baixou dos $75. Embora o impacto se reduza a menos de dois meses, foi o suficiente para provocar o descalabro dos lucros da empresa, que perderam 77% em 2014, para pouco mais de 700 milhões de dólares. Ora (mesmo após 9 meses de conjuntura favorável) se dois meses abaixo dos $75 deram origem a uma quebra de lucros de 2,3 mil milhões, imagine-se o que está a acontecer nas contas deste ano. Rapidamente se chega à conclusão que a Sonangol já está falida: cada dia que passa aumenta a sua imensa e estúpida bolha deficitária e ineficiente, que quando estourar vai doer em muitas carteiras estrangeiras.

Talvez os stakeholders devam tirar ilacções do caso: não se deve apostar em cultivar a arrogância e a estupidez.

domingo, 28 de junho de 2015

José Eduardo dos Santos gozado na África do Sul

O maior think tank sul africano, o diário Daily Maverick 

[segundo Gill Moodie «toughtful news and analysis website quickly picked up an audience and became a fixture in our media landscape» ou, segundo Herman Manson "in terms of insight into what's happening at grassroots and political intelligence, they have emerged as a clear front-runner"]


goza com o Presidente angolano, intitulando a sua análise «O clube de leitura que aterrorizou o regime angolano». Face à gravidade das acusações do PGR, o jornalista Simon Allison questiona-se se os activistas foram apanhados a distribuir armas à população? A resposta é de que «foi muito mais grave, foram apanhados a ler, a discutir, a pensarem por eles próprios!». Crime capital para um regime em estado terminal... «A recente vaga de prisões é uma clara indicação do nervosismo do regime em face da crise e da exposição da suas fragilidades internas. (...) haverá um momento em que o regime entrará em colapso, e esse momento pode estar iminente».

Ler também a crónica de José Eduardo Agualusa, sobre o mesmo assunto.

Autoridades angolanas acusam George Soros de conspiração

Espero ser detido, mas por favor, telefonem-me, antes de me virem prender.

Lobito, 27 de Junho de 2015

Ao Exmo. Sr. Procurador-Geral da República José Maria de Sousa

Cordiais saudações. Chamo-me José António Martins Patrocínio, filho de António José Ferreira Patrocínio e de Maria Odete Ribeiro Martins Patrocínio, nascido aos 26 de Dezembro de 1962 na cidade do Lobito onde actualmente resido. É com alguma animação, estupefacção, desassossego e questionamento, que tenho vindo a acompanhar toda esta novela de detenção de 15 cidadãos em Luanda, onde o protagonista principal é sua excelência, Sr. Procurador da República. De acordo com aquilo a que nos é permitido ter acesso, principalmente pelas redes sociais, mas também pelos órgãos de comunicação social públicos, onde o contraditório não é permitido, o Exmo. Sr. Procurador-geral da República declarou "que no dia 20 do mês corrente foram detidos 13 jovens, na sequência do cumprimento de um mandato de revistas, busca e apreensões que o Serviço de Investigação Criminal (SIC) realizava no bairro da Vila Alice, distrito urbano do Rangel. Adiantou que no dia 21 foi detido um outro elemento, quando pretendia passar a fronteira da Santa Clara para a Namíbia e, na terça-feira, as autoridades policiais detiveram mais um jovem oficial da Força Aérea Nacional que também estava envolvido no grupo de elementos detidos no primeiro dia."[1] Adiantou ainda, o Exmo. Procurador, que "tudo começou com uma denúncia junto da Polícia Nacional que deu origem a que o SIC se pusesse em campo para constatar a veracidade dos factos que eram denunciados"[2]. De acordo ainda com a ANGOP, em função disto “o Ministério Público deu luz verde para que fossem realizadas determinadas diligências e assim se confirmou que os jovens reunidos estavam a praticar actos preparatórios que poderiam levar a destituição do Governo legitimamente constituído, a partir das eleições de 2012”.[3] Declarou também "que os jovens estavam a preparar-se para uma acção de insurreição e desobediência colectiva que visava a deposição do Governo e a destituição do Presidente da República. Por isso esses actos constituem crimes contra a segurança do Estado, mais propriamente o crime de rebelião. Com efeito, os órgãos competentes do Estado têm que tomar as medidas necessárias para evitar o pior”.[4] Já a 25 de Junho de 2015, a Assembleia Nacional informa que o Exmo. Sr. Procurador esteve naquele órgão de soberania para se reunir com os grupos parlamentares, conjuntamente com o Ministro do Interior, Director dos Serviços de Investigação Criminal e o Comissário Chefe, Eugénio Pedro Alexandre, onde "esclareceram que os 15 jovens foram detidos sob acusação de tentativa de insurreição e atentado contra a segurança pública".[5] De acordo com a Rede Angola, "o procurador não precisou que questões e actos são esses: 'Não posso dizer que actos são esses e eu próprio não tenho domínio dos factos, além de que o processo está em segredo de justiça'. O procurador afirmou ainda que os tais actos e questões não especificados 'constituem crime contra a Segurança de Estado, mais precisamente crime de Rebelião, eles reuniram-se para preparar uma acção de insurreição, de desobediência colectiva, deposição do governo e destituição do Presidente da República', implicando que a reunião do grupo 'constitui uma tentativa de golpe de Estado'."[6] "Questionado sobre se os presos políticos estavam a trabalhar sozinhos 'ou se havia alguém por trás', o procurador disse também não estar ciente dos factos. 'Sei tanto quanto o jornalista'."[7] Algumas fontes apontam que o comunicado da PGR[8] acrescenta ainda que durante as buscas e revistas, foram apreendidos na posse dos detidos, computadores portáteis, pen drives, telemóveis, entre outros objetos "com conteúdo suspeito"[9]. "De realçar que entre os documentos apreendidos consta a composição de todos os Órgãos do Estado que seriam criados pelos insurrectos, desde o Presidente e o Vice-Presidente da República, o Presidente da Assembleia Nacional, os Tribunais Constitucional, Supremo, de Contas e Supremo Militar, entre outras instituições do Estado e os governos provinciais", lê-se no comunicado.[10] A nota refere ainda que os "insurrectos" pretendiam denominar os novos órgãos do Estado por "Governo de Salvação Nacional", tendo já a indicação dos nomes de futuros titulares dos cargos públicos, constando igualmente os nomes de alguns cidadãos ora detidos.[11] Os ditos "insurrectos" foram, então detidos em datas e locais diferentes. Alguns deles foram também obrigados a acompanhar os ditos "agentes da autoridade" até às suas residências onde foram apreendidos desmedidamente bens sem qualquer documento que legitimasse tal busca e tal apreensão de bens.[12] Há também informações que um deles, o autor do livro "180 Técnicas para derrubar um ditador" tenha sido vítima de agressões físicas. Por outro lado, as famílias queixam-se de serem impedidas de ter contacto com os detidos e "questionam a lucidez do Presidente angolano".[13] Já um dos advogados, Walter Tondela, na base das acusações, crime de rebelião e de atentado contra o presidente da República, tipificados na lei de crimes contra a segurança de Estado (artigos 21 e 23) considera que na base do artigo 28 da mesma lei, os arguidos poderiam ter liberdade provisória depois de terem sido ouvidos, mas, a Procuradoria decidiu pela manutenção da retenção prisional.[14] Por força de tal acção avançada por decisão do Exmo. Sr. Procurador, várias organizações nacionais e internacionais, como pessoas singulares[15] já se posicionaram exigindo a libertação imediata dos detidos, tais como o GAPPA[16], AJPD[17], OSISA[18], Amnistia Internacional[19], William Nicholas Gomes (defensor de direitos humanos e jornalista do Ghana)[20], Reginaldo Silva (jornalista)[21] e a Universidade Federal da Paraíba (Brasil)[22] que solicita o acompanhamento do caso pelo seu governo. Por último, foi divulgado pela ANGOP, (não preciso lembrar-lhe que é um órgão público de comunicação suportado com os nossos recursos para nos informar com verdade e isenção) baseando-se no que designou ser fonte segura (esperamos que não seja tão segura como as vossas fontes para ter dado a "luz verde" neste caso) de que  "um indivíduo de nacionalidade angolana, acusado pela justiça de crimes de rebelião, Dionísio Gonçalves (Carbono), pediu asilo na Embaixada dos Estados Unidos da América em Luanda."[23] Este órgão de informação público avançou ainda mais: as suspeitas do envolvimento de Dionísio Gonçalves nos planos de desestabilização em Angola assentam em provas concludentes, recolhidas pelas autoridades de investigação.Segundo essas provas, na sua residência estava a ser montada uma estação de televisão “online”, financiada pela Fundação Open Society, uma organização não-governamental internacional, dirigida pelo especulador financeiro George Soros, que promove a desestabilização de regimes democráticos. A estação de televisão iria servir para apoiar os planos de rebelião e desestabilização em Angola. A residência de Dionísio Gonçalves foi alvo de buscas do Serviço de Investigação Criminal e no local foram encontradas provas muito fortes do envolvimento de “Carbono” na actividade criminosa. A Procuradoria-Geral da República denunciou, sexta-feira, em Luanda, um pormenorizado plano de rebelião, que estava a ser preparado por um grupo de 15 indivíduos de nacionalidade angolana, para a deposição dos órgãos do Estado estabelecidos em Angola. O grupo, pertencente a um auto-proclamado “Movimento Revolucionário de Angola”, foi posto pelos órgãos judiciários em prisão preventiva, depois de ouvidos em interrogatório perante os seus advogados. Depois disto, só me cabe a mim enquanto cidadão, enquanto implicado nesta novela, estabelecer com o excelentíssimo Sr. Procurador-geral da República, alguns pontos importantes, antes de lhe fazer o meu pedido pessoal de quando me mandar deter, me telefonar com antecedência. Reconheço, em si e neste acaso, uma capacidade enorme de reacção imediata e de iniciativa tendo tão pronto dado as devidas orientações para que a novela se pusesse em acção. A dita "luz verde". Algo que, infelizmente, mas já habituado, não vejo em outros assuntos de interesse público e do Estado angolano. Não vi essa perspicácia, aliás importante, em casos como do nosso concidadão Bento Cangamba (denúncia mais que pública), nem dos milhões do BESA e nem sequer do caso "Monte do Sumi", apenas para ficar por aqui. Todos nos lembramos de como muitos dos actuais arguidos da sua "luz verde" foram violentamente agredidos em tempos idos, por diferentes vezes, quer por agentes da polícia como por elementos à civil que até tiveram espaço de antena, na nossa televisão pública, que todos pagamos, para se gabarem das suas atrocidades, fazerem arrogantes ameaças e assumirem os seus actos. O exmo. Sr. Procurador decerto que não está esquecido da falta de "luz verde" da sua parte para que hoje todos, incluindo eu, possam saber se sobre aquela tragédia tenha continuado algum processo. O quanto sei, foram feitas as denúncias, havia (e há-as) as provas, mas ainda não vi o Exmo. Sr. Procurador pavonear-se nem na imprensa nem na Assembleia Nacional a prestar os devidos esclarecimentos sobre os mesmos casos. Não vi, qualquer iniciativa de garantia de protecção, perante as denúncias de perseguição e ameaça apresentadas pela associação SOS Habitat, como da OMUNGA. Possivelmente devem também ser organizações envolvidas com estes "insurrectos" para darem "golpes de estado". Por outro lado me surpreende essa "luz verde" quando, de acordo com o que circula, nem o senhor sabe o que estes cidadãos realmente estariam para aprontar, nem quem os apoiava. Mas a ANGOP tem mais informações que o Exmo. Sr., o que me preocupa. Nem ainda temos conhecimento sobre o autor da dita denúncia junto da polícia. Será que nos pode dizer o nome e apresentar-nos a prova da referida denúncia? Para que não possa dizer que não tem a perspicácia em dar a devida "luz verde" para a devida intervenção dos SIC, aviso-o de que a informação prestada pela ANGOP sobre o pedido de asilo na embaixada dos Estados Unidos em Angola por parte do cidadão Dionísio Gonçalves (Carbono) pode não corresponder à verdade pelo que lhe peço que dê urgentemente a sua "luz verde" para que investiguem este facto. Por último e, afinal a razão desta minha carta aberta, tem a ver com a lista para o possível "Governo de Salvação em caso de crise política", uma das inúmeras provas que o Exmo. Sr. Procurador se tenha baseado para dar a sua tão iluminística "luz verde". De acordo a uma presumível lista, eu apareço apontado para o cargo de Ministro da Reinserção Social (veja lá bem meu caro Exmo. Sr. Procurador). Assim sendo, e preocupado com a sua "luz verde" só lhe quero lembrar que tenho uma mãezinha de oitenta e tal anos, pelo que preciso da sua colaboração para que eu a possa preparar psicológicamente para a iluminação da sua "luz verde" para a minha detenção, neste processo, é claro. Pelo que lhe exponho, peço que quando der a "luz verde" para a minha detenção, ou seja, a detenção do presumível Ministro da Reintegração Social do Governo de Salvação em caso de crise política, liguem-me para os terminais 913 641 941 ou 925 690 207 (facilito os contactos para que o SINSE não perca tempo a procurá-los) para que eu possa estar preparado com banhinho tomado, unhas dos pés arranjadas e a família por perto para umas selfies pró facebook e uns jornalistazitos para umas show entrevistinhas. Aproveito para informar que já tenho todo o material preparado para que o venham buscar, como o laptop, a memória externa (menos a câmara fotográfica e aquele telefone que os fardados e com AKM levaram há uns meses atrás da minha casa). Sei que deve estar muito ocupado a acompanhar a sua "luz verde" neste caso e por isso só tenho que agradecer o precioso tempo que o Exmo. Sr. procurador dispensou a este cidadão, ou melhor, Ministro da Reinserção Social do Governo de Salvação em caso de crise. Cordialmente,
José Patrocínio

Depois da revolta bancária de sucesso, da Senhora Dona Maria Odete Patrocínio, coroada por uma Carta Aberta ao Governador do Banco Nacional de Angola, eis a raiva com a actual situação, exposta pelo filho.

quarta-feira, 24 de junho de 2015

PGR angolano em pleno delírio

Especialmente «bem» instruído, o PGR vem confirmar a prisão dos jovens activistas, através de declarações à Rádio Nacional de Angola, os quais estariam em «actos preparatórios» para... ora esta declaração é incoerente com o próprio pretexto de «flagrante delito». Na estupidez e arrogância típica do regime, pretendem fazer o mesmo que fizeram em Cabinda, onde prenderam «preventivamente» por suposta «intenção» de manifestar (que nem sequer é um crime, mas um direito constitucional). O pau mandado passa claramente das marcas quando pretende associar às detenções dos revús a prisão de um «oficial da Força Aérea», que obviamente nada tem a ver senão com a própria tese do «Golpe de Estado» inventado. O senhor Procurador perdeu inteiramente a noção da dignidade e o sentido do ridículo...

Golpe de Estado

Segundo declarações à DW do sociólogo angolano Manuel dos Santos, o verdadeiro Golpe de Estado é a falência da Sonangol, que José Eduardo dos Santos quer ocultar sob a capa de ameaças de «intentonas» que não passam de «inventonas». Era inevitável, com a Arábia Saudita disposta a manter a cotação do petróleo abaixo do custo de produção da petrolífera angolana, para garantir a competitividade face às novas tecnologias. Segundo artigo do Expresso, o  Presidente da Sonangol admitiu que o «modelo operacional» da companhia «fracassou e está falido». Não se pode ser mais claro: quando se rouba e promove a estupidez, que esperar? Confessa Francisco Lemos que se deixou de aprender, que a única coisa que sabem fazer é subcontratar (obter chorudas comissões). Ou seja, não estamos perante governantes, mas simples gatunos de estrada.

Mãe de Mbanza

«Não teima... então você é um presidente, um governante da sociedade, vai ter medo de criança que está estudando simplesmente livro? (...) Mbanza não tem arma. Golpe de Estado começa com Generais!» DW

terça-feira, 23 de junho de 2015

Emiliano Katumbela

«Se não os soltarem [os activistas detidos] vamos empregar as ferramentas que aprendemos [para derrubar a ditadura]» Os próprios detidos previram esta possibilidade, considerando-a mais uma ferramenta para o derrube do ditador, no contexto de uma irreversível erosão do regime, por falência técnica.

Infla(matório)

Quem leia o relatório desta semana do Banco de Angola, poderá ficar, à primeira vista (realce a negrito), equivocado quanto à colocação de obrigações do tesouro, que teria sido de 3,3 mil em 7,2 mil milhões. No entanto, quem faça as contas, rapidamente perceberá que se trata de mais um erro num relatório destes, sendo a colocação de apenas um milésimo desse valor; ou seja, a absorção desses títulos continua tendencialmente nula (< 0,5%), tal como, aliás, a credibilidade do Banco de Angola, ou do Instituto Nacional de Estatística, que assume uma inflacção homóloga de 1%, durante o mês de Maio (com aumentos drásticos de gasolina e de transportes, que induziram o aumento de muitos bens de primeira necessidade, como a água em tambor). O politicamente correcto do ditador pelos vistos induz a cegueira total nos funcionários, caindo em pleno ridículo.

domingo, 21 de junho de 2015

Os medos de José Eduardo dos Santos

As peças de acusação contra os activistas angolanos presos durante este fim-de-semana, vão essencialmente consistir na apresentação de dois livros em preparação cujo tema é precisamente a queda da ditadura de José Eduardo dos Santos: um de Nuno Dala «O pensamento político dos jovens revús» e outro de Domingos da Cruz, «Ferramentas para destruir o ditador e evitar nova ditadura». Tenho a honra de ter sido convidado para participar em ambos, respectivamente com um posfácio e com um comentário crítico. Por isso, à medida dos meus fracos recursos, aviso já: prender os autores não vai parar a sua divulgação; tenho ambos os originais em meu poder e, caso mais ninguém mais qualificado o faça e os seus autores continuarem presos, arranjarei maneira de os dar ao prelo e disponibilizar a baixo preço. Com uma censura prévia destas, o sucesso está garantido. Quanto à acusação de «Golpe de Estado», se fizerem um esforço para ler, descobrirão que se defende precisamente o contrário e se faz a apologia da não violência. Defendem os seus autores que não basta mudar de ditador, tratando-se de algo muito mais profundo, que radica numa profunda mudança de atitudes e de mentalidades: numa luta pela dignidade humana, restituir às pessoas um efectivo controlo da governação e uma autêntica soberania sobre os seus destinos.

Liberdade imediata para Nuno Dala e Domingos da Cruz!

Uma cambada de burros corruptos a humilhar intelectuais que representam um futuro positivo para Angola? Abaixo o apartheid da inteligência. O mundo está de pernas para o ar, dando razão à ilustração do livro de Domingos! E o ditador deixou cair a máscara...

Preto burro

O discurso simplista que nos «relata» as mazelas de cinco séculos de colonialismo, não deve enclausurar-nos as vistas para o processo (inacabado) de reconstrução de uma identidade africana, face aos resquícios mentais do sistema colonial, que continuam pesando sobre os povos do continente, despudoradamente alimentados por várias ex-potências coloniais, como forma de manter a sua influência, impedindo assim uma afirmação positiva do seu próprio caminho para o desenvolvimento. Tentarei apresentar-vos uma leitura actual do trabalho de Luís Cunha, cujo título «A imagem do negro na banda desenhada do Estado Novo» deu origem, na semana passada, a um interessante artigo no Observador. Um alerta para os cuidados a ter com a reprodução inconsciente e desinformada de estereótipos...

Portugal teve um colonialismo tardio, com uma duração inferior a um século: ao tráfico efectuado em fortalezas, no qual a soberania territorial não ia além do alcance de um tiro de canhão, não se pode fazer corresponder este conceito. Só por pressão da Alemanha recém unificada e pretendendo ao império ultramarino, Portugal foi obrigado a ocupar o sertão, cujas campanhas de «pacificação» se estenderam pelo princípio do Século XX. Salazar reinventou depois o Império, baseado numa visão paternalista, cujo «particularismo» escondia mal um profundo racismo, bem patente nas políticas de aculturação e «assimilação» levadas a cabo. A abordagem, que Adriano Moreira ainda tentou mitigar apostando numa intelectualidade africana, acabaria inevitavelmente mal, prolongando-se por uma guerra colonial ingrata, de mais de uma dúzia de anos, culminando na queda do regime e numa brusca e desastrosa «descolonização».

Desde muito cedo que o sistema colonial usou, na sua narrativa, a imagem do preto (por exemplo em bilhetes-postais ou na Exposição do Mundo Português de 1940), mas este era desprovido de voz (não nos referimos apenas a limitações tecnológicas, como no cinema), eventualmente, associado ao som do batuque, e apresentado como dócil figurante. Os movimentos de libertação denunciavam a «coisificação» de que o indígena era alvo e conduziram uma guerrilha militar que não souberam transformar em luta política, de transformação, de dignificação, de empoderamento do homem e da mulher africana. Num continente martirizado, pseudo-elites constituídas em cleptocracias, apoiadas pelos regimes ocidentais, prolongam uma agonia cujas feridas cada vez mais infectadas e expostas, estão à vista de toda a gente, com assassinatos xenófobos, boat-people apinhados, terroristas convertidos em Estados...


É legítimo questionar até que ponto não estamos perante uma profunda crise identitária. Não deveríamos antes encarar a descolonização como um processo que continua em andamento? Esse parece ser o tema central do escritor angolano José Eduardo Agualusa, ou, em relação a Moçambique, o que levou Cabaço a concluir que «as políticas socialistas não foram capazes de romper radicalmente com a “sociedade colonial” nem tampouco consolidar a tal “identidade nacional”». Do lado de cá, a descolonização mental implica lutar contra o preconceito que alimentamos contra a nossa própria História, cheia de pequenas histórias. Na primeira década do século XVI, um príncipe do Congo veio para estudar em Coimbra, onde se diplomou com distinção, chegando a Cardeal, em Roma! Já no século XIX, poderíamos igualmente lembrar Honório Barreto, guineense, mais patriota que muitos portugueses indígenas, que chegou a Governador da Guiné, despoletando o espanto e criando incrédulos pela Europa fora (um «preto» a dirigir uma administração colonial?).

Aqui na minha cidade, em Santarém, muita gente que já levei a visitar a Igreja do Hospital, fica surpreendida por saber que quem ali está enterrada, em lugar de destaque, na Capela Mor, é uma «preta», uma riquíssima «dona di tchom» de Cabo Verde e da Guiné, a qual, sem filhos, foi livre para dispor do seu património e patrocinar a construção da igreja, em meados do século XVII (convive curiosamente com Pedro Escuro, mas isso é outra história, bem mais antiga). E que dizer do Marquês de Sá da Bandeira, defendendo a abolição imediata do tráfico de escravos, nas primeiras décadas do Século XIX «é positivo que os habitantes portugueses das províncias da África, da Ásia e da Oceânia, sem diferença de raça, de cor ou de religião, têm direitos iguais àqueles de que gozamos nós portugueses da Europa»? Desde muito cedo, no Império, se manifestou uma alternativa «estratégica» (aliás duramente perseguida por D. Manuel, que chegou a mandar matar «colonos» portugueses desobedientes), na Guiné consistiu nos «lançados», aqueles que se escapavam ao regime, obrigações e modo de vida colonial, para se misturarem na vida local, acabando por se miscigenar. Outro bom exemplo foi Pero da Covilhã, o erudito espião ao serviço de Dom João Segundo, que face às notícias da morte do seu príncipe e Senhor, se deixou ficar pela Etiópia, como conselheiro real, criando numerosa descendência de vários casamentos. Ou outro homem de mão de Dom João Segundo, Afonso de Albuquerque, o artífice do Império asiático, incentivava os seus soldados a criarem raízes.

Nem devemos pretender padronizar demais as narrativas oficiais, que foram marcando (mas também sendo condicionadas) as épocas e os momentos, emprestando-lhes um cunho hegemónico que não tiveram, pois sempre existiram vozes discordantes, cujo bom senso se fazia ouvir, muitas vezes a contra-corrente. Um inquérito racista cujo objectivo consistia essencialmente em provar que os «pretos» tinham a idade mental das crianças, desenvolvido para o Congresso Nacional de Antropologia Colonial de 1934, desenvolvido junto de missionários, oficiais do exército, médicos, funcionários e outras profissões, no qual se inquiriam várias qualidades como aptidão para o trabalho, impulsividade, moralidade, sugestibilidade, auto-controle, capacidade de decisão, previdência, tenacidade, inteligência global e educabilidade, obteve apenas 27 respostas... deveras interessante é que alguns dos inquiridos defenderam que os brancos metropolitanos eram inferiores aos chinas e aos pretos da Guiné! Não podemos pois compactuar com discursos simplistas e redutores. Talvez devamos antes encarar com esperança os sinais dos tempos: nomeadamente as novas narrativas de resistência e de afirmação identitária, das quais o rap angolano, como agente de comunicação de uma revolução inadiável das mentalidades, é um bom exemplo, ao mesmo título que o Movimento Revu (revolucionário); ou ao novo impulso que as novas tecnologias e o acesso às redes sociais virtuais, vieram trazer à liberdade de expressão e de associação, criando um novo espaço de intervenção política, cuja acção informada, coerente, sustentável e, essencialmente, participada e partilhada na internet, tende a assumir um papel cada vez mais relevante, magnificando uma nova dimensão de activismo para uma cidadania global.

José Eduardo dos Santos aposta na perpetuação do preto burro! Todos os que ousarem pensar vão presos por «Golpe de Estado»! Libertem Luaty Beirão e Nito Alves!

Paranóia terminal

Num verdadeiro tiro no pé, o regime angolano prendeu ontem em casa (no caso de Luaty Beirão, algemado e maltratado à frente da filha pequena) uma série de 13 activistas, apreendendo igualmente todo o seu material informático e de telecomunicações, invocando como pretexto um «Golpe de Estado» em preparação (como se isso fosse possível, em Angola). Libertem já Luaty Beirão, Nito Alves, Mavungo, Kalupeteca e todos os outros pacifistas presos! Prisão imediata de José Eduardo dos Santos e seus esbirros, por atentado à segurança do Estado de Direito. O pobre (literalmente, agora) ditador agonizante quer castigar os vivos? Veremos o que fará Portugal, perante esta enormidade (sabendo que JES nunca mais lhes pagará um centésimo de yuan)... Continuarão os jornalistas a calar a cada vez maior e imparável oposição ao regime sanguinário e torcionário?

sábado, 20 de junho de 2015

O ladrão, o corrupto e o inimigo

Torna-se cada vez mais necessário construir uma consciência colectiva do perfil político dos nossos líderes. É urgente uma reflexão sobre quem nos deve governar. Basta de pessoas com mau carácter que nos são impostas para mandar, impostores com modos negativos, agir tendencioso, corruptos, sob influências ocultas dos lobbies. O Povo paga caro por incompetência de lideres com fraco perfil para governar, centrados no umbigo, megalómanos, gente fria, arrogante, complexada, amantes do «quero, posso e mando», ditando as regras de cima para baixo: em vez de servirem o Povo, servem-se!

Será falta de uma cultura de liderança capaz? O Guineense é capaz, se escolhermos os líderes por Meritocracia, perfil de liderança positiva!

“quem te avisa, teu amigo é” - o ladrão, corrupto ou inimigo, não pode levar a mal, este aviso.

Por Filomeno Pina | filompina@hotmail.com

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terça-feira, 16 de junho de 2015

Em plena crise institucional

A pedido, em relação ao artigo anterior, clarifico a posição da falta de legitimidade da Presidência da República e do Presidente da Assembleia, em caso de queda do Governo: o povo guineense votou no projecto do Engenheiro (está visto que se enganou, mas isso é outra questão) Domingos Simões Pereira. Ninguém votou expressamente em Jomav ou Cassamá. Por isso, esta «constelação» triangular, caso se desfaça, deverá automaticamente devolver a soberania ao povo, permitindo a discussão de novas propostas, mais rigorosas e consistentes, apostadas num verdadeiro combate à impunidade, como todos defendem.

Afirmou Jomav acerca do pronunciamento de Luanda «Não é aceitável! [Cassamá]! (...) não fui eleito por voto universal, livre e secreto dos guineenses para ser conivente com situações como estas. É chegado o momento de definirmos o tipo de instituições e modelo de sociedade que queremos para nós e para os nossos filhos! Não me consigo conformar com a degradação e cada vez mais acentuada inversão de valores que reina na nossa praça.» Mas voltando ao tema da confiança, oiça-se o mesmo Jomav «A confiança dos cidadãos nas Instituições da República e nos titulares dos Órgãos de Soberania depende da eficácia e discrição da actuação do servidor público. Essa actuação deve ser pautada pela apresentação de resultados concretos aos cidadãos, pela contenção e por um enorme sentido de Estado».

A única saída parece ser uma alternativa concertada, um sapo que todos possam engolir.

Não cortar a árvore pela raiz

O Gabinete do Primeiro-Ministro, de forma um tanto ou quanto obtusa e narcisista, propõe um exercício de confiança à sociedade, sugerindo a imagem de uma árvore. A raiz dessa árvore, segundo o método exposto, seria a confiança entre as instituições de soberania; o tronco a confiança na Justiça e Segurança (polícia e forças armadas); os galhos seriam os meios de comunicação social, o poder tradicional e as crenças culturais, que alimentariam a confiança das folhas, neste caso, os cidadãos e as cidadãs.

A imagem parece aliciante, no entanto, não se percebe muito bem o estilo paternalista e autista do discurso. Qual a intenção do Senhor Primeiro-Ministro com esta iniciativa de «governança»? Se fizermos uma abordagem botton-up (a árvore cresce de baixo para cima, portanto corresponde àquilo que entendemos por top-down), poderemos perceber facilmente que aquilo que encrava, neste momento, na Guiné-Bissau, é a «confiança entre as instutuições de soberania», sem a qual a árvore não pode «funcionar».

Ora essa parte é da responsabilidade solidária do Senhor Primeiro, juntamente com os Presidentes da República e da Assembleia. Pretenderá o senhor Primeiro-Ministro maquilhar a realidade, que está aos olhos de toda a gente? Esconder que perdeu completamente a autoridade e não tem vocação para governar? Como pode alguém confiar num Estado que expropria madeira e areia, sem qualquer enquadramento legal, deixando apodrecer a situação, envolvendo países estrangeiros?

Ou cujas providências cautelares não são cumpridas? Onde, apesar de ameaças de auditorias, nada foi feito para apurar as contas que eram legitimamente exigidas numa Câmara de Comércio, permitindo uma tomada de posse ilegítima? Como falar depois levianamente de impunidade, se é o próprio a incentivá-la? Reunir um Conselho de Ministros com um Secretário de Estado em prisão preventiva? Com outro Secretário de Estado que «negoceia» com mafiosos, candidatos a «Companhias Aéreas» de bandeira?

Vossa Excelência deveria mudar de espelho, pois aquele que tem usado está decerto viciado, revelando a sua incomparável beleza mas ocultando lamentavelmente as suas imperfeições. Do «triunvirato» que as eleições legaram ao país, o maior responsável nominal é Vossa Excelência, que escolheu (erradamente) o cargo e os candidatos aos dois outros. Considerando-se o melhor (a falta de humildade talvez não lhe permita reconhecer-se como «o menos mau»), deverá fazer o esforço de aguentar.

Ou seja, não permitir que, depois de fazerem o seu enterro, o PAIGC volte às disputas intestinas e sem futuro. Não será decerto fingindo que nada se passa que atingirá esse objectivo. Para colocar um fim a este status quo da indecisão e da incerteza, que em muito está a prejudicar o país, é necessário que retome as rédeas do Partido, do Governo e do Estado. Quanto à legitimidade dos dois outros órgãos de soberania, neste contexto, é pura e simplesmente nula, em caso de queda de Vossa Excelência.

Um pouco de consistência, por favor.

quarta-feira, 10 de junho de 2015

Repressão brutal no Burundi

As armas estão a crepitar desde o princípio desta noite, nos quarteirões centrais de Bujumbura. A polícia procede a detenções em massa, desconhecendo-se o paradeiro de muitos presos. Seis centenas de universitários, temendo pela vida, procuraram refúgio na Embaixada americana, que se recusam a abandonar.

Após uma breve trégua durante o fim-de-semana, a população continua a manifestar nas ruas a sua oposição ao terceiro mandato de Nkurunziza, repudiando o mediador proposto pela ONU, por descarada parcialidade. Segundo a sociedade civil, com Nkurunziza, não haverá eleições; segundo Nkurunziza, sem ele, não haverá eleições. Que pensar?

O Presidente Zuma, recordando o exemplo de Madiba, já avisou, na perspectiva da realização da 25ª Cimeira ordinária da União Africana, que começa amanhã na África do Sul, que o principal tema que estará em cima da mesa será um interdito sobre os terceiros mandatos e a eternização no poder.

O que vem reduzir ainda mais a margem de manobra, não só de Nkurunziza e Kagame, como de outros ditadores, autênticas lapas agarradas ao poder. Fazendo as contas a quatro anos por mandato, José Eduardo dos Santos estaria já no décimo!

terça-feira, 9 de junho de 2015

Angola - o novo Narco-Estado

A «branca» sul-americana encontrou um novo destino do outro lado do Atlântico: Luanda. Não apenas como placa giratória do tráfico, mas como mercado de consumo.

O Club-K noticia hoje que a Procuradoria chamou os jornalistas do jornal «O Crime», cuja primeira edição, de Outubro do ano passado, revelava a extensão da implicação de altas figuras do regime no negócio (embora sem citar nomes), no sentido de denunciarem as suas fontes (ninguém explica ao Senhor Procurador que o maior Direito que assiste a um jornalista é o de proteger as suas fontes?)

Sentindo-se ofendido por a sua foto fazer manchete (as fotos apenas pretendiam chamar a atenção para os responsáveis, não implicando obviamente uma acusação, pelo menos directa), o Ministro do Interior enfiou a carapuça e terá accionado o processo, pretendendo envolver igualmente o Chefe de Estado Maior das Forças Armadas, com o objectivo de diluir a sua própria responsabilidade (o General Nunda poderá sempre, por sua vez, sentindo-se lesado, processar o Ministro do Interior, por abuso de identidade).

Mas façamos um breve resumo de como o regime angolano, graças às suas relações privilegiadas com Portugal e com o Brasil, se tornou, nos últimos três anos, no maior Narco-Estado africano, traficando (e consumindo) quantidades industriais de cocaína, numa triangulação cujas tímidas denúncias que vão corajosamente sendo feitas aqui e ali, de um e de outro lado do Atlântico, não passam da ponta do iceberg. O primeiro sinal veio com a prisão (a pretexto ridículo - e não relacionado, claro) do comandante provincial da Polícia de Luanda e mais duas dezenas dos seus homens, no início de 2012, o qual, embora mais tarde tenha optado por um prudente silêncio, colocou na altura a boca no trombone e denunciou que «a minha travessia do deserto e a dos meus homens começou quando desmantelámos os cartéis da droga no Aeroporto Internacional 4 de Fevereiro e no Porto comercial de Luanda» e insinuando ainda uma total má fé «foram pura e simplesmente retirados de cena, surgindo um órgão sem competência: (...) a introdução de outros órgãos no processo, que interferiram e desviaram o curso dos acontecimentos, prendendo inocentes e mantendo os criminosos fora do circuito e dos acontecimentos que se encontravam claramente inseridos no processo pendente». 

Aparentemente, o comandante Quim Ribeiro meteu-se com gente graúda, continuando hoje a expiar o seu «crime» nas prisões do regime (enquanto, cúmulo da hipocrisia, o Ministro do Interior ainda há pouco tempo visitava Moscovo para uma Conferência Anti-Drogas)... No contexto de um interminável e completamente descabido processo ao encontro de profissionais com décadas de serviço, suas esposas dirigiram-se em princípios de Dezembro do ano passado à redacção do Club-K, acusando a PGR, em entrevista concedida no local, de forjar provas e de tentarem coagir os subordinados de Quim Ribeiro a prestarem falsas declarações contra o seu antigo superior (que estes terão dignamente declinado, por respeito), e pessoalmente o próprio Procurador de ter interesses empresariais no ramo! Ameaçando mesmo «Mas ainda que matem o meu marido, nós temos tudo bem guardado e se acontecer alguma coisa com ele os nomes irão parar até́ às instâncias internacionais de combate ao narcotráfico. Algumas destas pessoas não satisfeitas com o que já́ fizeram, continuam a perseguir‐nos. Mas estas pessoas que se lembrem do que aconteceu aos narcotraficantes da Guiné‐Bissau, onde foram mesmo lhes buscar para serem presos e julgados nos Estados Unidos da América.» A esposa de outro dos réus revelou, na mesma ocasião, em artigo publicado mais tarde, como a Procuradoria chamara o seu marido para lhe «fazer uma proposta suja de suborno»!

Mas não foi apenas o PGR a ser acusado. O agora muito «ofendido» Ministro do Interior, pela mesma altura deslocou-se pessoalmente ao estabelecimento prisional onde Quim Ribeiro se encontrava detido, numa clara tentativa de aliciamento. Falhados os seus intentos, ainda tentou instrumentalizar amigos chegados do visado (que o haviam abandonado com a sua queda em desgraça) para o mesmo fim, tendo o ex-Comandante recusado recebê-los, segundo reporta outro artigo do Club-K. Entretanto, o negócio continua de vento em popa, tal como o champanhe, não conhecendo os efeitos da crise. Ainda há pouco menos de três meses, o segundo Comandante da Polícia Nacional, Paulo de Almeida, dava conta das suas preocupações em entrevista à Rádio Nacional (que eu difundi aqui) «Não digo só placa giratória, mas também, já um país de consumo, e há sinais graves de ostentação de riqueza proveniente de droga», reportando-se a pequenas apreensões (marginais, pois o grosso passa por outro lado), apontando o exemplo insignificante de um nigeriano, simples «mula», apanhado com 70 cápsulas... A questão enunciada pela mulher de Quim Ribeiro faz todo o sentido: isso é tapar o sol com a peneira, qualquer criança de rua o sabe, pois «desde que o meu marido foi preso, nunca mais se apreendeu droga no aeroporto ou se apreendem são quantidades irrisórias. Será́ que deixaram de meter droga em Angola ou agora essa entrada de droga está protegida pela polícia?».

Zé Eduardo dos Santos = Ditador Nojento = Assassino = Corrupto = Narco-Traficante