Quero fazer um elogio a Sonia Rolley, corajosa jornalista francesa da RFI, que acompanhou os protestos no Burundi, contra o terceiro mandato de Nkurunziza. Esses protestos foram curiosamente decididos a 25 de Abril, mantendo-se ininterruptamente até hoje. A Sonia foi afastada do cenário, decerto por superiores hierárquicos temendo pela sua vida (lembre-se que a RFI perdeu dois repórteres no Mali há bem pouco tempo), mas continua a acompanhar a situação pelo Twitter. Publicou agora um resumo áudio de seis minutos (em francês), o qual recomendo vivamente, com os momentos mais emocionantes dessa revolução popular em curso, até à «inventona» que serviu para queimar os verdadeiros patriotas no exército e a sua empatia com o povo.
Neste pequeno mas emocionante resumo, destaco o relevo dado ao papel das mulheres, a partir do 3'48''. Transcrevo o discurso galvanizador e cheio de firmeza, deixando transparecer a sua fúria e raiva, discurso verdadeiramente político (do qual o Presidente seria inteiramente incapaz pois enquanto mandava matar o povo na rua,
fazia-se fotografar a jogar futebol, inteiramente
equipado, para transmitir a ideia de tranquilidade) de uma anciã: «Queremos a Paz, o respeito pela Constituição e pelos Acordos de Arusha, que nos concederam a paz que tanto desejámos, depois de tanto sangue derramado e que continua a ser derramado». Uns dias depois, uma jovem manifestava a sua indignação pela actuação da Polícia, massacrando a jacto de água, gazeando a lacrimogéneo e assustando as mulheres com balas reais: «É uma vergonha! Viemos até aqui marchando pacificamente, somos mulheres "armadas" com lenços brancos. Há apenas mulheres e raparigas em toda esta multidão. Viemos exprimir pacificamente a nossa recusa do terceiro mandato, que está a violentar o nosso país»
Quando os homens tentam fazer a junção com as mulheres, no centro de Bujumbura, a notícia cai como uma bomba: o ex-chefe da secreta de Nkurunziza declara um «Golpe de Estado», aos microfones de uma rádio privada. A «inventona», oportunamente encenada para silenciar as rádios privadas, criou uma dinâmica revolucionária que assustou os próprios mandantes. O entusiasmo popular era contagiante: cantava-se o hino e os alegres slogans inventados na hora fazem lembrar o 25 de Abril. Para terminar, a Sónia escolheu as declarações de um manifestante empolgado, que traduziam perfeitamente o sentimento do povo: «Este é um dia inesquecível, que vai entrar para a história! É a primeira vez que o povo decide uma coisa e essa coisa se realiza. Foi o povo que disse não! Estamos fartos desse gajo!» Imagine-se que, a 25 de Abril, a Cavalaria 7 tinha obedecido à ordem de fogo? Solidariedade com o Burundi, onde o povo não larga a rua, apesar da repressão e das provocações e assassinatos evidentemente promovidos pelo odiado ditador.
Entretanto, no Rwanda, a máscara do Presidente parece ter caído: já tinha aqui realçado o seu papel dúbio na crise do vizinho, ao deixar Nkurunziza utilizar o seu território para chegar ao Burundi. Ontem, silenciou definitivamente a Rádio BBC. A oposição tenta prevenir o mais que óbvio aproveitamento político que este se prepara para fazer, baseado no precedente do seu parceiro: pretendem inviabilizar qualquer alteração constitucional que tolere o terceiro mandato de mais um candidato a usurpador. Os ditadores parecem estar a apoiar, de todas as formas, sob a vergonhosa passividade da comunidade internacional, o «abcesso de fixação» no Burundi, tentando evitar o efeito de contágio. No entanto, nesta era de novas tecnologias e internet, as pessoas já não dependem apenas dos mass media, facilmente manipuláveis ou silenciáveis. O povo rwandês, calejado pelo genocídio, saberá satisfazer o pedido formulado onomasticamente pelo ditador: Kagame! Ok, seja feita a sua vontade.
Há 2 horas
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