Esclarecimento, não é. O anexo à resolução da ANP é um atabalhoado enlatado PAIGC de má qualidade. Pelos vistos, o presidente do órgão continua a julgar que este é uma simples extensão dos seus desejos. Não esclarece, pelo contrário, amplifica a contradição. A solução, de considerar o ano "móvel", para combater a expressão "do ano correspondente", é simplesmente patética. A imposição de tal contra-entendimento, irrelevante para o status quo, é um atestado de incompetência à própria ANP, instrumentalizada sem discussão, para cumprimento da agenda política de DSP, demitindo-se das suas funções de representação. É ridículo que a Comissão Permanente, erradamente convocada na forma regimental de Mesa, tente afirmar o seu poder legislativo através de instrumento desadequado, a resolução, quando só uma Lei votada pelo Plenário teria essa força. Mas para coisas mais importantes, claro. O líder do PAIGC esvaziou por inteiro a ANP das funções soberanas que lhe são cometidas pelo artigo 2º da Constituição, reduzindo-a a caixa de ressonância da propaganda ressabiada dos novos combatentes da liberdade da Pátria. É caso para dizer "Pior a emenda que o soneto".
sábado, 8 de fevereiro de 2025
quinta-feira, 6 de fevereiro de 2025
Revelação
José Manuel Correia Pinto, na página 505 dos Anais do CMN, aponta "Constou com grande insistência em Bissau, e isso posso testemunhar pessoalmente, que Alpoim Calvão entrou na Guiné, por Bissau, entre o Natal de 1972 e a passagem do ano, e que se deslocou a Pirada, tendo-se perdido o seu rasto a partir daí, tanto mais que não haveria registos do seu regresso a Lisboa por Bissalanca."
Atendendo ao reconhecimento pelo próprio de ter "inferido" das ordens trocadas o objectivo de “capturar e eventualmente assassinar Amílcar Cabral” na operação Mar Verde, nota-se que confunde propositadamente o objectivo Sekou Touré com o de Amílcar Cabral; a própria forma da expressão e ordem de apresentação, diz tudo àcerca das intenções desde cedo alimentadas pelo autor.
As ordens de Spínola distinguiam Sekou Touré, para matar, de Amílcar, para capturar VIVO. No desaguisado que se seguiu no Estado Maior, com o General a acusar o Comandante de ter concebido o ataque político como um golpe de mão, essa razão pode também ter pesado: Amílcar Cabral para nada servia morto ao General Spínola. A abordagem não fôra a melhor.
Segundo o Director da PIDE, o assassinato teria sido uma "bavure", estando previsto "apenas" capturá-lo. Ora se havia alguém que não alimentava ilusões, era o próprio Alpoim, ao profetizar, antes da passagem do ano, que "Com um pouco de sorte, em finais de Janeiro (Amílcar) estará morto". Na sua biografia autorizada, não é feita referência a essa passagem clandestina por Bissau.
Já agora, Alpoim foi a Pirada visitar Mário Soares, cuja filha estava em Londres em apoio à missão de intoxicar Sekou Touré com as negociações Amílcar / Senghor / Spínola. Em Setembro de 1974, quando deveria ser o homem mais odiado (promotor da operação Mar Verde), entra no Palácio Presidencial para resgatar do fuzilamento esse agente duplo, debaixo das barbas de Luís Cabral.
quarta-feira, 5 de fevereiro de 2025
Mais África que toda a África
Segundo o Capitão-de-Mar-e-Guerra Mário Alvarenga Rua, na página 288 dos Anais do Clube Militar Naval recentemente publicados (e que são um verdadeiro documento histórico), esta era uma descrição popular da Guiné, no Portugal dos finais dos anos 60.
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Vaca gorda
Agora que a ANP parece ter acordado, bem tardiamente, para a vida, assumindo publicamente a imaterialização do espaço e a legitimidade da reunião virtual (decerto em Regulamento a aprovar), para além de evitar partes gagas como "os (membros) da Comissão Permanente", o Presidente da Mesa deve ser consistente e respeitar o disposto no Regimento, cujo artigo invocado se encontra articulado em ordem à Mesa e não à Comissão Permanente (a qual está fora do prazo de validade, tanto tempo passado a evitar convocá-la para não reconhecer a dissolução e para além disso faz lembrar o precedente de usurpação Cassamá, que entretanto fez escola junto de titulares de órgãos colegiais), conforme dá a entender a Convocatória apressadamente publicitada. Por uma questão de coerência e legitimidade, assumida a possibilidade de reunião virtual e ser esta extensível ao Plenário, realmente soberano como órgão colegial, deveria igualmente respeitar procedimentos e prazos estabelecidos no mesmo Regimento para a sua convocação. A dissolução não era inexistente? O carácter público e a retransmissão em directo já estão devidamente acautelados na legislação. Contudo, a proposta de ordem do dia, a qual parece pouco ambiciosa ou mesmo irrelevante, atendendo às funções de órgão legislativo e fiscalizador, talvez possa vir a ser alterada pela Comissão Permanente ou mesmo pelo Plenário, que é soberano.
terça-feira, 4 de fevereiro de 2025
Preterição desculpante
Houve preterição de formalidades essenciais na investidura do Presidente da República? Onde está o auto assinado pelos dois? O Supremo descolegializado está a tomar conhecimento? Não deveria deduzir algo? Anular o mandato a posteriori, é pura e simplemente surreal. Se não havia mandato, o que é que o actual titular do mandato andou a fazer, do dia 27 de Fevereiro ao dia 3 de Setembro de 2020? A fundamentação passou a ser uma colectânea de palpites esparsos, com terríveis saltos no escuro. Num excesso de zelo perfeitamente injustificável perante a legitimidade formal da marcação das eleições para fins de Outubro a fins de Novembro, consagrada pelo ponto 2 do artigo 3º da Lei Eleitoral e abençoada a anteriori por constitucionalista português (altamente volátil, mas enfim), estranha-se a iniciativa para tal desnecessário esclarecimento ou aclaração, que expuseram o subscritor, na veste de Tribunal Constitucional, à prática, condenada pelo ordenamento jurídico guineense, de actos inúteis. Mas pior que a inutilidade e a articulação ambígua (nº 2 de que artigo da CRGB? do 2º de certeza que não é) é a cominação "legal" sobre um órgão de soberania, neste caso, ameaça à Presidência da República, colocando-se num plano de superioridade institucional, atitude perfeitamente injustificada e ilegítima (pelo menos na ausência de legítimo Plenário).
"Cargo que deve exercer até à tomada de posse do novo Presidente eleito, nos termos do Nº 2, in fine, a fortiori, da Constituição da República, sob cominação legal (...)"
segunda-feira, 3 de fevereiro de 2025
Questão de subsistência
Se o deputado remanesce à própria dissolução (seja esta existente ou não), ao abrigo do ponto 2 do artigo 94.º da Constituição (ainda supostamente em pé, apesar da violação colectiva), com respaldo no ponto 1 do artigo 7.º do Regimento da ANP, o qual, em vez de fixar a duração do mandato dos deputados (a Constituição não o fixa explicitamente tal como é feito para presidente em cinco anos, mas fá-lo implicitamente no artigo 79.º pela fixação da duração da legislatura em quatro anos), prefere estendê-la explicitamente à primeira reunião da nova legislatura, princípio extensível à Mesa pelo artigo 35.º; ou seja, trata-se de um princípio implícito, comum a organizações, associações, sindicatos, cuja expressão mais simples é: "os titulares mantêm-se nos cargos até à tomada de posse dos seus sucessores". Contudo, eis que reentra em cena o titular do órgão supremo legislativo e fiscalizador, armado com o seu vaccuumficador, para contra-aterrorizar o verdadeiro detentor da soberania. Alguém me disse que as munições estão chochas e as tropas desmoralizadas, mas se calhar não é verdade.
Sede Vacante
Em caso de vacatura no Vaticano, a sede fica vacante até à reunião do Plenário com capacidade eleitoral. Apesar do mutismo a que a ANP se remeteu, tanto Plenário como Comissão Permanente, o titular remanescente do órgão em vias de extinção, vem pessoal e pouco institucionalmente colocar-se à disposição da nação que já lhe disse que não... ainda para mais quem criou o problema e não o soube resolver? decerto esqueceu que, na boa tradição guineense, lembrada por Serifo Nhamadjo, o "presidente" de transição (sim, pois trata-se de um golpe) não tem capacidade eleitoral passiva para as presidenciais seguintes: terá de ficar pouco activamente a ver passar as caravanas; o que é pouco consistente com todo o seu percurso anterior. O lema parece ter passado a ser "se não os podes vencer, faz pior do que eles"!
A vaca turra
Os turras tinham uma bela manada de vacas na bolanha. Todas gordas e bem nutridas. Todas? Bem... nem todas. Havia uma pobre, coitada, enfezada e subnutrida, quase esquelética. Certo dia, o chefe dos turras decidiu-se a dedicar uma vaca em sacrifício às suas aspirações políticas. Contudo, oferecer a pior vaca é pior ofensa que roubar uma vaca. Tanta vaca, pouca vaca. Muita parra...
domingo, 2 de fevereiro de 2025
30 de Fevereiro (+ ou - 10%)
Há uns meses, quando o PAIGC esboçou a intenção de vir a usar o dia 27 de Fevereiro como abcesso de fixação (esquecendo com demasiada facilidade a palhaçada que montaram a 29 desse ano bissexto), este blog dedicou-se à arqueologia legislativa. Ler aqui I e II
quinta-feira, 30 de janeiro de 2025
51 de Janeiro
A 29 de Janeiro de 1973, Titina jantou na base de Sara (onde andava entusiasmada a treinar as suas milicianas) com o Comandante Lúcio Soares e a esposa, Flora Gomes (que por lá andava a documentar as eleições para a ANP), o jornalista (e/ou espião) russo Oleg Ignatiev... estava de partida para assistir ao funeral de Amílcar. Estranhara quando recebera a "nomeação", pois primeiro falara-se na convocação de uma reunião para decidir quem iria a Conacri representar a Frente Norte. Ana Maria Gomes Soares, sua companheira de quarto, ofereceu-se para a acompanhar. Mas a meio do caminho, Titina dispensou-a, apesar dos seus protestos, invocando que já era tarde, obrigando-a a voltar para trás.
segunda-feira, 20 de janeiro de 2025
50 de Janeiro
Vinte de Janeiro mais trinta de Janeiro fazem parte da mesma purga, com mão do PAIGC e dedo tuga.
quarta-feira, 15 de janeiro de 2025
Estalou o verniz
Macron, que no 80º aniversário do desembarque na costa setentrional francesa provocara Sonko contrariando a política francesa seguida até aí e reconhecendo Casamança, perdeu a cabeça perante a resposta de Sonko aos seus abusos paternalistas e ofendeu em bloco todos os senegaleses (e demais africanos, por extensão), deixando cair as máscaras e mostrando a sua verdadeira face. É o refluxo generalizado! Até o burkinabé, ao comando da zona onde os franceses antigamente íam apanhar marfim, está assustado e foi a correr à mátria pedir desculpa.
segunda-feira, 16 de dezembro de 2024
Parabéns a'O Democrata
O Democrata está de parabéns pelas suas opções históricas, no sentido de garantir a sua independência de terceiros, por mais generosos que sejam, como a Google. Há uma década houve uma grande discussão, na blogoesfera, sobre o papel dos blogues e sites. Até aí, só o mano Didinho pagava um site para garantir acesso a tal liberdade.
BLOGSTOP
A operadora ORANGE, fornecedora de acesso internet na Guiné-Bissau, está com um problema "técnico" selectivo, filtrando o domínio da Google dedicado aos blogues. Apenas o que acaba em blogspot.com. Tudo o resto funciona normalmente... (claro que mudando de localização se resolve o problema, mas a maior parte das pessoas não está para esse trabalho).
Os 35 anos do CCF
domingo, 10 de novembro de 2024
Elogio do radicalismo
Cabral, que em diversas ocasiões alertou para a falta de ideologia, nomeadamente de muitos movimentos e líderes africanos do seu tempo, antecipou esse déficit (ou mesmo falência) à escala global, criticando amorfos, indecisos, indiferentes… Uma autêntica política deve colher o melhor de cada extremo; não há que procurar virtude pelo meio. Este olhar parece hoje de paz, num mundo cada vez mais intolerante e fisgado em identidades assassinas. Cabral fazia a ponte com todos, chineses, russos, cubanos, jugoslavos, suecos, italianos. Cabral era guineense, cabo-verdiano, angolano, moçambicano, católico e profundamente português.
"Não, isso não, isso é extremismo ao contrário. O que eu disse primeiro chama-se desvio para a esquerda e o que eu disse agora é desvio para a direita. Isso não quer dizer que o meio é melhor. Há muita gente que julga que o que está no meio é que é bom, mas não é verdade: a coisa boa está em saber juntar dum lado e doutro para andar em frente. Juntar dum lado e doutro, procurar o caminho justo, numa terra, não é ficar no meio, no meio não se pode fazer nada."
Há que lutar contra essa ideia, que nos tentam impingir, de que ser radical é mau.
Meio século perdido, Cabral lanta di tchon i na pidi iu iagu.
quarta-feira, 6 de novembro de 2024
Direitos de Autor
Apesar do muito escândalo provocado pela flagrante e continuada usurpação do plenário de órgão colegial pela sua presidência, parece oportuno lembrar que tal está longe de ser um precedente, devendo os direitos ser pagos a Cassamá, ao serviço do PAIGC. A única inovação prende-se com o aspecto formal: apesar da hipocrisia, Ciprias pelo menos conhecia o regimento e cuidava minimamente das aparências; já o novo candidato, talvez deva registar nova patente, extensão para incluir a arbitrariedade dos trâmites processuais não regulamentares.
quarta-feira, 16 de outubro de 2024
A perniciosa dimensão simbólica da persistência no sub-desenvolvimento
Ou o ciclo vicioso das narrativas pós-coloniais, identitariamente estigmatizantes e tendentes a retroalimentar a dependência.
The Self-Deception Trap, de Carlos Lopes, em conversa com Divine Fuh, na escola Nelson Mandela, da Universidade do Cabo.
quarta-feira, 25 de setembro de 2024
CRIMInoso
A preguiçosa RFI, à falta de novo material para assinalar o centenário do nascimento de Cabral, republica em formato "podcast" trabalho feito para o cinquentenário da sua morte, há um ano e meio.
A abordagem jornalística é fakeciosa e denota uma insustentável superficialidade da investigação do par de jornalistas luso-francês: apesar de citarem Oramas, pelos vistos não o leram na totalidade...
Misturam factos posteriores ao assassinato de Cabral, em conexão com os serviços secretos franceses, para reciclarem petas do envolvimento da PIDE/DGS, ou até de Marcelino da Mata.
Ora o artigo do mesmo autor, publicado uma semana depois do assassinato, está claramente melhor, para o que se sabia à época, do que aquele que escolheram para peça-chave, dois anos depois!
A tese é a da participação dos mesmos personagens envolvidos no assassinato de Humberto Delgado e da sua secretária, em Vilanueva del Fresno, sete anos antes. Só desinformação!
Marcelino da Mata estaria à espera com num barco de guerra português? Brincadeira! As lanchas do PAIGC foram trazidas de volta por duas lanchas da Marinha de Sekou Touré? Mentira!
(basta ler o embaixador Oramas, para ficar a saber como foi uma unidade da Marinha soviética que procedeu ao aprisionamento das lanchas da Marinha do PAIGC comandadas por Cani)
O Bruno Crimi fizera turismo político em terras africanas, contudo em 1973 ainda achava que era um jornalista. Em 1975, era já um "jornalista de intervenção", um autêntico activista.
PS Uma vez que acham por bem confirmar le mensonge de Bruno Crimi sur l'assassinat d'Amilcar Cabral, cujo "relato, que a RFI pôde confirmar tendo acesso a novas fontes" o qual "diz ter conseguido ter acesso, depois da Revolução dos Cravos de Abril de 1974, a documentos guardados zelosamente nos arquivos da PIDE-DGS, na rua António Maria Cardoso, na capital", seria bom que avançassem, sob pena de serem legitimamente apodados de mentirosos, com pelo menos uma pequena amostra desses "soi disant" documentos, já que todos os investigadores que se debruçaram sobre o tal arquivo nada encontraram nesse sentido.
domingo, 22 de setembro de 2024
Cartaz III
Estreou em Bissau, o filme de Sofia da Palma Rodrigues, “Por ti, Portugal, eu juro”, o qual se debruça sobre o caso dos Comandos africanos, soldados que combateram nas fileiras do exército português durante a guerra do Ultramar. A Sofia e a sua equipa estão de parabéns por terem ousado violar o tabu e abordar esse tema fracturante, de ambos os lados da antiga trincheira. Entretanto, meio século passou sobre os acontecimentos, os arquivos militares foram desclassificados… Desde 2017, a Sofia recolheu testemunhos que se perderiam para sempre de outra forma: entre os sete protagonistas escolhidos para apresentar (o projecto tem bastante mais material recolhido), apenas três continuam em vida. Pena é que tenha sido o Centro Cultural francês a acolher a iniciativa, indício conclusivo da atitude comprometida do Estado português nesta questão.
A verdade liberta. Se o making of, só por si, já evidencia o efeito catárquico a título individual (um dos protagonistas assume ser a primeira vez que aceita falar, longo silêncio, lágrimas), o impacto colectivo, memorando a tragédia e o sofrimento destes homens para a história, é já um resultado maior. Um pouco como aconteceu com Joaquim Furtado, cuja série sobre a guerra colonial enterrou definitivamente esse manto de silêncio com que envergonhadamente se acolheram aqueles que, do lado português, foram obrigados a combater numa guerra que muitos consideravam injusta. O blog Tabanca Grande, no qual desde 2005 se recolhem testemunhos de ex-combatentes, é outro exemplo.
A Sofia conseguiu fazer-se ouvidos e penetrar a fundo no trauma, nas várias estratégias de sobrevivência face à perseguição implacável de que foram vítimas, à dor de ver os camaradas caírem uns após os outros, ao sentimento de abandono por parte de Portugal. Sobressai uma narrativa de compulsividade no recrutamento, a qual se equipara à obrigatoriedade do serviço militar para os jovens portugueses. De ambos os lados, irmanados por não terem ido à guerra por sua vontade, mas por força das circunstâncias.
A Sofia admitiu, todavia, uma excepção. Um tabu remanescente, perante a violação assumida? A polémica que se seguiu ao falecimento de Marcelino da Mata, durante o COVID, veio demonstrar que, se o tabu da guerra colonial está definitivamente enterrado na sociedade portuguesa, o tema continua fracturante. Podem compreender-se as razões da Sofia, para não perder o foco na humanidade da tragédia e evitar que esse pendão canibalizasse o fio à meada. Contudo, e por isso mesmo, esta atitude pode ser sintomática de uma negação primordial, ou seja, da dignidade do juramento “ideológico” de Marcelino da Mata por Portugal. Há precedentes históricos, como Honório Barreto, para além de devidamente representado no seu filme.
A Sofia, que trabalha no projecto Divergente, discrimina entre jornalista e activista, considerando-se na primeira categoria. Obviamente que este é sempre um equilíbrio difícil; acrescente-se que nem sempre foi assim, lá vai o tempo em que ser jornalista de intervenção estava na moda. A esse título, a Sofia deverá refrear afirmações como “a africanização da guerra foi criminosa”. No contexto em que foi proferida, e em especial em relação ao General Spínola, pode mesmo induzir em erro: basta consultar o quadro de efectivos não metropolitanos para constatar que o número de recrutados localmente não subiu significativamente com a chegada de Spínola em 1968, nunca ultrapassando um quarto dos efectivos totais. A africanização da guerra já existia e nunca atingiu a dimensão que um espectador desinformado pode entender por essa afirmação.
O convidado para se sentar ao lado da Sofia durante o debate que se seguiu à sessão de cinema, utilizou igualmente a palavra criminoso, referindo-se ao General Spínola, um militar honrado e respeitado. Esforçou-se por tentar branquear o papel do PAIGC no massacre destes homens, lembrando que os pós-guerra trazem sempre uma caça às bruxas, fornecendo para exemplo as mulheres francesas colaboracionistas durante a ocupação nazi, a quem foi rapado o cabelo, com a “libertação”. A negação parece um péssimo sintoma, atendendo aos objectivos da iniciativa. Portugal reconheceu a independência da Guiné há cinquenta anos: a guerra deveria ter acabado, mas parece haver quem continue a alimentar ódios não só básicos, como verdadeiramente criminosos, nem que por omissão, tentando justificar o injustificável: não se arrependem e voltariam a fazer o mesmo? Obsoleto! Parece que os complexos que assassinaram Cabral continuam vivos!
Guerra é guerra. Se houve um teatro onde a guerra foi mais “humana”, foi na Guiné, com o General Spínola: por exemplo, acaba com a PIDE em Bissau, chegou a querer prender o seu Director, declarando que preferia não ter informações a que estas fossem extraídas por métodos desumanos. Criminosos foram aqueles que mataram Cabral, os mesmos que, já em tempo de paz, enganaram os comandos, primeiro para os desarmar, para depois mais facilmente os martirizar.
Obrigado, Sofia, foi comovente constatar como conseguiu devolver a identidade a estes homens. Talvez não seja o reconhecimento que pretendiam, mas é algo, já. E muito importante.
domingo, 15 de setembro de 2024
Recomendação aos viajantes
A notícia que dá por certa a chegada de autoridades estrangeiras para o controle de mercadoria apreendida no aeroporto certamente não passa de boato (ou fake, para quem prefira anglicismos), pois não é do conhecimento público qualquer convite oficial nesse sentido. No improvável e impensável caso de tal voluntarismo e intempestividade unilateral encontrarem algum tipo de suporte na realidade e apesar de o Almir Bubo estar engaiolado, recomenda-se aos destacados e esforçados agentes para preferirem andar de chinelos (ou eventualmente descalços, se preferirem um contacto mais íntimo com a terra), em vez de pisarem o chão com botas de marca. Já agora: no direito local, de inspiração portuguesa, a armadilha não é punível.
PS Pelo atrás exposto se infere igualmente que devem ao Senhor Almirante uma indemnização pelo seu sequestro, prisão e julgamento ilegal.
sábado, 14 de setembro de 2024
terça-feira, 3 de setembro de 2024
Cartaz II
Ao contrário dos outros membros de expressão portuguesa da CPLP, em que o momento da independência é um só, coincindindo obviamente com o reconhecimento por Portugal, a Guiné é um caso à parte, pois estava diante na luta. A auto-proclamação só encontra paralelo com o caso do Grito do Ipiranga, independência do Brasil (as independências sul-americanas precederam em cento e cinquenta anos as africanas). Faz todo o sentido comemorar o último acto do cumprimento cabal do Programa Mínimo.
domingo, 1 de setembro de 2024
domingo, 25 de agosto de 2024
Solidariedade inter-partidária
De Timor chega um grande exemplo de como, acima das rivalidades históricas e partidárias, deve estar a justiça e a solidariedade. Perante aquilo que lhe pareceu um injustificado ataque pessoal como resposta a uma posição política, o actual Primeiro-Ministro saiu em defesa do ex-Primeiro-Ministro. Apesar de circunscrito a questões externas, é claramente um bom sinal: possa a Guiné-Bissau servir, nem que como contra-exemplo, para a construção de consensos em torno do interesse nacional, opondo-se à extrema volatilidade e sectarismo de certo tipo de políticos. Construam-se pontes em vez de muros.