Ao mesmo tempo apela para que todos aqueles que estejam a viver, tenham vivido ou venham a viver situações similares que façam recurso à cidadania e utilizem todos os mecanismos de reclamação e de denúncia.
Ainda agradece a onda de solidariedade que se criou em torno do seu assunto que decerto ajudou a solucionar desta vez a sua situação e ao debate que se desenrolou em torno do direito dos cidadãos poderem fazer uso do seu dinheiro em divisas sem qualquer impedimento dos bancos comerciais ou de qualquer outra instituição. Ao fim de certa de 48 horas, a sua carta de reclamações postada no facebook contava com 800 likes, 674 partilhas e cerca de 300 comentários o que demonstra bem como este assunto toca e afecta a tantos cidadãos.
Abaixo podem acompanhar a carta que dirigiu hoje ao Governador do Banco Nacional de Angola.
LOBITO, 09 de Abril de 2015
C/c: Banco MILLENNIUM - L O B I T O
Ao Exmo. Sr. Governador do Banco Nacional de Angola (BNA) LUANDA
ASSUNTO: CARTA ABERTA DE RECLAMAÇÃO E SOLICITAÇÃO DE ESCLARECIMENTOS
Excelência
É com enorme preocupação que a si me dirijo para apresentar os factos que adiante descrevo e solicitar esclarecimentos e intervenção por parte do BNA.
Eu chamo-me Maria Odete Ribeiro Martins Patrocínio, de 86 anos de idade, natural de Lisboa, residente em Angola, nesta cidade do Lobito desde 1957, com o Cartão de Estrangeiro Residente vitalício com o número R003335/00323602 e com a minha conta bancária em Euros no banco MILLENNIUM Angola, no Lobito.
Foi com enorme insatisfação que a 1 de Abril de 2015 me foi impedido fazer o levantamento do montante de 300 Euros (TREZENTOS EUROS) da minha conta naquela agência bancária.
De acordo às informações prestadas pelas funcionárias que atenderam, devia-se ao facto de haver poucas divisas no país e que os valores recebidos por transferência só poderiam ser levantados em moeda nacional, o Kwanza.
Foi solicitada a apresentação do documento que emite tal orientação às referidas funcionárias que apenas conseguiram balbuciar que eram ordens, mas que iriam contactar Luanda. Nesse mesmo dia deixou-se preenchido o boletim de levantamento aguardando a resposta de Luanda.
A 6 de Abril de 2015, o funcionário que atendeu, disse ter falado telefonicamente com a gerente que pedia para continuar a aguardar pela resposta de Luanda, mas também aconselhou a fazer uma carta de reclamação, que o fiz através de uma Carta Aberta de Reclamação datada de 7 de Abril de 2015.
Ainda a 7 de Abril de 2015, depois de se ter feito a entrega da referida carta na agência bancária, permiti a sua ampla divulgação nas redes sociais que em pouco mais de 24 horas teve mais de 750 likes, de 630 partilhas e de 230 comentários.
Na manhã de 8 de Abril de 2015 recebemos um telefonema do banco a solicitar que nos dirigíssemos ao mesmo para conversarmos sobre o assunto. Questionou-se se a deslocação ao banco seria para conversar-se sobre o assunto ou para se efectuar o levantamento do montante solicitado e foi respondido que seria para as duas questões.
No banco foi-nos prestado um atendimento personalizado onde foi mais uma vez tentado explicar as razões da decisão de não permitir o levantamento em divisas nas contas que recepcionam esses valores por transferência bancária. Por tal razão voltaram a insistir que fizéssemos o levantamento em moeda nacional, Kwanza, que prontamente rejeitámos. Voltou-se a exigir o documento que emana tal directiva, o que não foi satisfeito comprometendo-se tão brevemente poderem disponibilizar o mesmo já que aguardariam de Luanda.
Perante a nossa insistência de que não aceitaríamos receber o valor solicitado em equivalência em Kwanzas ao câmbio do dia, do banco, foi-nos então dito que iriam permitir o levantamento dos 300 Euros. No entanto, fomos alertados que poderíamos não voltar a ter a mesma sorte em situações futuras já que tudo dependeria da disponibilidade em divisas.
Foi-nos dito que as divisas que possuem são destinadas às pessoas que têm as suas contas em divisas mas com depósitos locais e não resultantes de transferências e para outros casos especiais como por exemplo alguém que precise de viajar, etc.
Lembrámos que a referida conta bancária foi aberta naqueles balcões com depósito em moeda Euros e que a mesma tanto pode servir para receber depósitos directos como provenientes de transferências do exterior do país.
Por último, insistiram para que abríssemos uma conta em kwanzas e assim todas as transferências recepcionadas seriam imediatamente cambiadas em Kwanzas. Imediatamente negámos tal proposta.
Disseram-nos ainda que estavam a ver a possibilidade do Director Comercial daquele banco vir de Luanda ao Lobito para ter um encontro connosco e poder-nos então esclarecer melhor a situação. Agradecemos de imediato essa disponibilidade e ficamos a aguardar que o banco nos contacte para tal encontro.
Tomando em conta que:
• Cabe ao Estado angolano garantir o respeito e a protecção da vida, da dignidade e da propriedade de todos os cidadãos que vivem no espaço territorial de Angola;
• Não ter ficado claro se na realidade existe ou não formalmente uma directriz que sustente o impedimento de se fazer o levantamento em divisas e obrigue que seja feito em moeda local ao câmbio do banco, do dia, e tão pouco quem a emana;
• É nítido haver um enorme poder discricionário por parte do banco para decidir sobre quem pode ou não pode usufruir das divisas;
• Avalia-se que pela enorme partilha e discussão do assunto nas redes sociais, a mesma questão tem vindo a ser prática em diferentes bancos comerciais, afectando e indignando um elevado número de cidadãos;
• É visível, pelas mesmas razões apontadas no parágrafo anterior, que a maioria dos afectados por este tipo de actitudes não tem exercido cabalmente o seu direito, aceitando o facto sem ver mecanismos reais de reclamação;
• Os posicionamentos públicos do BNA contrariam realmente as actitudes dos bancos comerciais aqui descritas;
Solicito do BNA o seguinte:
1. Que seja advertido ao banco MILLENNIUM Angola para que nunca mais me impeça de fazer a movimentação dos valores da minha conta em Euros que já há alguns anos possuo naquele banco.
2. Que tome as medidas cautelares para impedir a continuidade destas práticas através de documento com poder jurídico que formalize os direitos dos cidadãos e as responsabilidades dos bancos comerciais quanto ao acesso e movimentação de divisas pelos cidadãos, através dos referidos bancos;.
3. Que os bancos comerciais sejam obrigados a fixar tais orientações em local visível de todas as suas agências;
4. Que sejam realmente tomadas medidas responsabilizadoras contra os bancos que violem tais princípios, normas e procedimentos;
Antes de terminar quero informar que permitirei a máxima divulgação desta carta e que a mesma sirva para provocar o debate e estimular as vítimas de actos idênticos a reclamarem publicamente para que possamos todos contribuir para a construção duma Nação angolana onde reine a justiça e a paz social.
Sem mais de momento e sabendo da atenção que o Exmo. Sr. Governador dará ao assunto aqui transcrito e o seu devido encaminhamento, aceite as minhas humildes saudações.
_________________
Encontre aqui toda a documentação do processo:
https://www.flickr.com/…/quintasded…/sets/72157651396792067/
P.S. Apenas para acrescentar alguma fundamentação legal, veja-se a nota de imprensa do Banco Nacional de Angola (que aparentemente caiu em saco roto, ou seja, não passava de «contra-informação»), já aqui citado há dois meses; bem como a resposta às FAQ do seu site:
É possível efectuar depósitos e levantamentos em contas denominadas em moeda estrangeira, nos bancos comerciais?
Sim. Os residentes cambiais podem efectuar depósitos e levantamentos de numerário nas suas contas denominadas em moeda estrangeira. No entanto, os bancos comerciais podem criar contas para depósitos e/ou levantamentos e outras que aceitam unicamente transacções escriturais.
Já quanto ao Banco Millenium, compare-se a postura, agora aparentemente mais humilde, com as arrogantes declarações de há três semanas atrás (às quais nunca reagiram, como fizeram agora de forma tão célere), aliás aqui denunciadas, nas quais uma gerente da instituição bancária afirmava à boca cheia, precisamente sobre esta matéria, que os clientes poderiam «ir queixar-se a quem quisessem». É a hipocrisia institucionalizada, bem representativa da fase terminal em que se encontra o regime.
Não perder, finalmente, o contra-ataque civíco, conduzido sob o patrocínio da Senhora Dona Maria Odete.
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