Domingos da Cruz,
que cunhou a expressão dos três éRRes, em termos de Direito:
1) o direito à RAIVA perante o mal
2) o direito à REVOLTA quando este persiste
3) o direito à REVOLUÇÃO quando o mesmo se eterniza
Perseguido pelo regime desde 2008, pela publicação de vários livros (proibidos mas muito apetecidos) contestando a situação, viria a ser despedido das suas funções docentes, bem como processado pela Procuradoria Geral, por «incitação à desobediência colectiva e à violência». Várias vezes adiado, o caso foi finalmente a julgamento há cerca de um ano... Pouco antes da leitura da sentença, Domingos gozava o prato...
Questionado pela DW (faço alguns extractos) sobre o fundamento legal da acusação:
«_Sem lei não há crime. Não faz sentido absolutamente nenhum tal acusação, na medida em que o crime de incitação à desobediência colectiva e à violência não existe no ordenamento jurídico angolano.
DW África: Mas então o que é que vai fazer ao tribunal?
_Como deve calcular, vou ao tribunal para responder a "nada", do ponto de vista metafísico, porque efectivamente não existe crime nenhum. Para além disso, a tal lei foi revogada sendo substituída por uma outra que é a Lei dos Crimes Contra a Segurança do Estado. Surpreende-me o facto de, mesmo que tenha cometido algum excesso, investido dessa "autoridade" de jornalista e cidadão, uma opinião se transformou em crime.
DW África: Entende que o regime do Presidente Eduardo dos Santos teme uma espécie de Primavera Árabe em Angola?
_Mas muitas vezes as pessoas querem apoiar em espírito e alma e, contudo, não podem fazer muita coisa porque estamos sob escuta, nos telemóveis, nos "emails", na rede social Facebook. Tudo isso leva a que as pessoas se retraiam muito na manifestação das suas posições.
DW África: Acobardando-se?
_Claro, mas respeitamos essas pessoas porque esta é a realidade que vivemos em Angola
DW África: Face ao que acaba de dizer, pode concluir-se que os jornalistas praticam auto-censura, em termos de produção de ideias e de pensamento?
_Com certeza, absolutamente. Isto é um efeito sobre o qual, inclusive, muitos jornalistas em debates ou em diálogos mais ou menos privados dizem, por exemplo: ”sobre isso, eu queria pronunciar-me mas não posso fazê-lo". Trata-se de um exercício de terror, encontramo-nos num ambiente de catástrofe, do ponto de vista das liberdades para o exercício do jornalismo.
DW África: Nos últimos tempos, tem sido exercida uma grande pressão sobre ativistas e jornalistas em Angola. As manifestação de jovens contra o o governo angolano são frequentes e normalmente reprimidas. Será que o regime de Luanda teme alguma situação de difícil controlo?
_De acordo com a nova conjuntura, do ponto de vista geopolítico internacional, parece-me que o regime entende que a qualquer altura pode despoletar uma situação complicada. Tem-se dito que Angola é uma espécie de barril de pólvora e falta-nos só identificar onde está o fósforo para que tal barril possa eclodir.»
Numa entrevista à Por dentro de África:
«Pelo que sei sobre este grupo de delinquentes sob a capa de governantes, temem todo tipo de ideias autênticas. São absolutamente alérgicos ao pensamento, à cultura, à ciência, à racionalidade, à crítica, à deliberação pública, ao esclarecimento. Para mim, enquanto tal grupo detiver o poder, Angola continuará um país atrasado, de idiotas, sem bens sociais mínimos para viver, alto índice de corrupção, um país que envergonha os seus filhos que se pautam por uma vida ética! (serão estes a minoria?)
Angola é quase um romance ficcional no plano político, jurídico e noutras esferas. A acusação que pesa sobre mim baseia-se numa lei revogada em 2010: só num regime autoritário tal idiotice pode suceder. Aprofunda-se uma imagem caricatural do regime, tanto interna quanto externamente… Quando o ridículo chega a este ponto máximo é sinal que tal protagonista terá uma tragédia catastrofista. Talvez seja o fim dessa era que se aproxima!»
O juiz mandou finalmente arquivar o processo, face à inconsistência legal das acusações.
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