A atitude do governo e diplomacia de Portugal em relação à Guiné-Bissau, atingiu ontem um pico de ligeireza e má fé. Numa cimeira da União Africana, amesquinharam a CEDEAO chamando-lhes «um grupo de países das imediações», propondo alargar a ECOMIB à CPLP (falam despudoradamente de uma posição da CPLP que se desconhece onde e quando foi assumida e sem sequer referir a própria organização anfitriã, a UA). Trata-se de uma tentativa tardia e desinformada para converter a maior derrota da sua política externa dos últimos anos em algo parecido com uma desforra: qualquer pequena «capitalização» lhes serviria de compensação para a grande carga de esforços ingratos que despenderam ao longo de dois anos, tentando obstruir o processo de transição.
Agora que a transição chegou ao fim, é urgente uma clarificação por parte dos novos órgãos de soberania recém-empossados, em defesa da soberania nacional e desmarcando-se destas tentativas, por parte deste «eixo do mal», para se assumirem como patronos das suas candidaturas às eleições guineenses, transformando-os em simples «peões» (como já lhes chamaram) de estratégias que nem sequer podem ser consideradas neo-colonialistas, pela sua inconsistência ao serviço de meia dúzia de interesses mesquinhos, sem sequer uma visão clara subjacente. Mesmo que tenham recebido apoios de certos países para a sua eleição, estão agora revestidos de uma nova dignidade e não devem cuspir no prato que lhes entregaram, sob pena de macularem desde já a sua legitimidade... e sustentabilidade.
A Guiné-Bissau está acima de qualquer compromisso que tenham assumido, deverão doravante evitar alinhar com estas estratégias... Correndo o risco de me repetir, quem quer ser governante de um país militarmente ocupado? O país que «aceitaram» e receberam, depois de terem concorrido às eleições é um país na sua integridade, esperando-se que a força que veio para garantir o processo de transição retorne a casa com o sentimento do dever cumprido e não que seja reforçada por mais forças, criando um foco de instabilidade e de desinteligências entre várias organizações, em prejuízo da soberania e do povo da Guiné-Bissau. Pensar pelas próprias cabeças, andar pelos próprios pés... Qualquer outra via estarão definitivamente a conspurcar o nome de Amílcar Cabral, que usaram na campanha.
A África que querem impor em Malabo, com a ajuda de meia dúzia de governantes corruptos, desenraizados, provincianos e sem identidade do governo português (os quais de forma alguma se pode pensar que representam Portugal, o seu povo ou aspirações reais), é a África dos ditadores, um modelo de estabilidade política musculada para exploração dos recursos naturais a favor de uma pequena «elite» de beneficiados e em detrimento do desenvolvimento real da população. A CPLP, que poderia estar na linha da frente na reinvenção de novos modelos económicos glocais, está transformada num joguete local, entregue a palhaços mandatados por José Eduardo dos Santos, numa agonia sem fim à vista, que tem sido, aliás, muito criticada por Xanana Gusmão, nas suas alocuções sobre o assunto.
Quanto ao Ministro da Defesa de Cabo Verde, que acompanhava o Presidente deste país na tomada de posse do novo Presidente eleito, alinhou pelo mesmo diapasão, deixando a claro a existência deste «eixo do mal», a concertação entre estes três países para uma «intervenção militar», apoiando-se agora nas novas autoridades eleitas, mas sem paciência para esperarem que sejam elas a solicitar o seu apoio. E o apoio que pretendem prestar vai sempre dar ao mesmo: a reforma da defesa, que pretendem insistente e forçosamente apoiar com soldados seus e com dinheiro angolano. No entanto, as suas declarações caem mal, porque, como nos têm habituado os dirigentes cabo verdeanos, são pautadas pelo seu complexo de «superioridade» em relação à Guiné-Bissau: insinuar que as Forças Armadas guineenses não são credíveis é uma brincadeira! São tão credíveis que dissuadiram Portugal de se intrometer, há dois anos... então o senhor ministro quer mandar homens que nunca ouviram um tiro ensinar aos guineenses a arte da guerra? Logo os cabo verdeanos, cuja independência mal desejada foi obtida à boleia dos combatentes guineenses? (exceptuo algumas honrosas e dignas excepções, como Osvaldo Lopes da Silva)
sexta-feira, 27 de junho de 2014
sábado, 21 de junho de 2014
Felicidades aos novos órgãos de soberania
Magnífica mensagem de esperança do doutor Julião Soares Sousa, investigador e catedrático da Universidade de Coimbra, que tive a honra de conhecer há cerca de um ano, por ocasião do debate em torno dos quarenta anos da retirada de Guiledje.
«Espera-se que Domingos Simões Pereira e José Mário Vaz possam cumprir com as expectativas que os eleitores depositaram neles.»
Esperança que encara como um bom sinal «o facto de hoje os filhos da Guiné estarem a arregimentar-se e a organizar-se para colocar o país na senda do progresso. Isso é sinal de que se pode fazer mais e melhor e de que há uma margem de manobra para mudar o status quo que chegou a ser, numa determinada fase da nossa história recente, de desesperança.»
Mas não é o único bom sinal: «Até agora ninguém sabe quem vai integrar o próximo elenco governamental e pouco ou nada se sabe das diligências que estão a ser feitas a outros níveis. Isso é um bom sinal.»
Esperemos que, numa perspectiva de sustentabilidade da sua governação, acabem com as «moscas de pastelaria» do seu Partido e se façam rodear da «melhor nata», num projecto consistentemente nacional e patriótico.
«Há neste momento uma grande vontade interna para mudar as coisas. Isso era o que vinha faltando. Sempre dissemos que o primeiro passo para qualquer mudança no nosso país passaria sempre pela manifestação dessa vontade internamente. Isso está a acontecer.»
Esperemos que sim.
«Espera-se que Domingos Simões Pereira e José Mário Vaz possam cumprir com as expectativas que os eleitores depositaram neles.»
Esperança que encara como um bom sinal «o facto de hoje os filhos da Guiné estarem a arregimentar-se e a organizar-se para colocar o país na senda do progresso. Isso é sinal de que se pode fazer mais e melhor e de que há uma margem de manobra para mudar o status quo que chegou a ser, numa determinada fase da nossa história recente, de desesperança.»
Mas não é o único bom sinal: «Até agora ninguém sabe quem vai integrar o próximo elenco governamental e pouco ou nada se sabe das diligências que estão a ser feitas a outros níveis. Isso é um bom sinal.»
Esperemos que, numa perspectiva de sustentabilidade da sua governação, acabem com as «moscas de pastelaria» do seu Partido e se façam rodear da «melhor nata», num projecto consistentemente nacional e patriótico.
«Há neste momento uma grande vontade interna para mudar as coisas. Isso era o que vinha faltando. Sempre dissemos que o primeiro passo para qualquer mudança no nosso país passaria sempre pela manifestação dessa vontade internamente. Isso está a acontecer.»
Esperemos que sim.
terça-feira, 3 de junho de 2014
Presidente Barman
Segundo l'Observateur senegalês (obrigado Progresso Nacional versão papel, obrigado Bambaram di Padida versão digital) Jomav teria comprado um bar no Senegal em 2010. Embora o título da notícia se lhe refira como «ex-gerente», nada o justifica no texto, através do qual se percebe que continua a despachar os assuntos do Saf Bar (cuja fama, segundo parece, não é das melhores), nas suas passagens por Dakar.
Ora, segundo a constituição, o exercício da função de Presidente é incompatível com o desempenho de qualquer outra. Será admissível uma interpretação da lei limitada ao território nacional? Ou seja, será possível, de forma legal, ser Presidente da Guiné-Bissau e barman no Senegal? Estaria o legislador a referir-se a funções tão triviais? Ou apenas visava impedir a promiscuidade com grandes interesses económicos?
O problema está naqueles que venham a confundir ou a trocar inadvertidamente as funções... Chamarem-lhe Presidente da República no seu bar, seria errado pois estaria a usurpar as funções de Macky Sall; ou, em Bissau, poderia acontecer que algum turista senegalês, frequentador do Saf Bar, ao ver o man, julgue que há serviço de esplanada e se lhe dirija em termos pouco adequados às circunstâncias _Ei, garçon! Um shot!
PS Segundo as más línguas, a Ordem dos Barmen estaria a pensar expulsar Jomav, por incompatibilidade de funções e violação do seu código deontológico, ao envolver-se em actividades políticas. O bom barman não bebe nem faz política!
Ora, segundo a constituição, o exercício da função de Presidente é incompatível com o desempenho de qualquer outra. Será admissível uma interpretação da lei limitada ao território nacional? Ou seja, será possível, de forma legal, ser Presidente da Guiné-Bissau e barman no Senegal? Estaria o legislador a referir-se a funções tão triviais? Ou apenas visava impedir a promiscuidade com grandes interesses económicos?
O problema está naqueles que venham a confundir ou a trocar inadvertidamente as funções... Chamarem-lhe Presidente da República no seu bar, seria errado pois estaria a usurpar as funções de Macky Sall; ou, em Bissau, poderia acontecer que algum turista senegalês, frequentador do Saf Bar, ao ver o man, julgue que há serviço de esplanada e se lhe dirija em termos pouco adequados às circunstâncias _Ei, garçon! Um shot!
PS Segundo as más línguas, a Ordem dos Barmen estaria a pensar expulsar Jomav, por incompatibilidade de funções e violação do seu código deontológico, ao envolver-se em actividades políticas. O bom barman não bebe nem faz política!
segunda-feira, 2 de junho de 2014
Casa assombrada II
No mesmo registo, um tanto onírico, que inspirou Filomeno Pina, recordo-me de uma bela expressão que uma vez ouvi e que se aplica com toda a propriedade:
Omi garandi pidin iagu di bibi kuma i misti sai na prison di tchon.
Omi garandi pidin iagu di bibi kuma i misti sai na prison di tchon.
Recordação da noite fatídica, versão dos delegados do FMI que deveriam encontrar-se com o Presidente NV nesse dia... Ao título «O Presidente e o General» poderíamos hoje acrescentar «...e o futuro Presidente», que estava de malas aviadas... para a Presidência.